Não é outra coisa senão um golpe de Estado a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil do governo de Dilma Rousseff. Esse ato foi, simultaneamente, uma declaração de guerra aos brasileiros honestos e às instituições da República e a abdicação de fato da presidente Dilma de seu cargo, entregando-o de vez a seu criador e consumando dessa maneira o tal “golpe” que o PT, Dilma e Lula tanto acusavam a oposição de tramar. Temos agora na Presidência de fato da República um tipo que não recebeu um único voto para ocupar aquela posição nas últimas eleições.
Já os mais de 54 milhões de votos que Dilma recebeu na reeleição foram rasgados com essa assombrosa decisão. Dilma tornou-se, por vontade própria, subalterna do demiurgo petista, na presunção de que este, como “primeiro-ministro” em um parlamentarismo de fancaria, terá o poder que ela não tem mais – e a capacidade que nunca teve – para reverter o colapso de seu triste governo.
Ao mesmo tempo, Dilma aceitou acoitar Lula em seu gabinete, concedendo-lhe foro especial para que o chefão tenha melhores condições de tentar se safar da Justiça – uma sacada que transforma o exercício do governo em algo próximo do mais puro e simples gangsterismo. Também se poderia dizer que o bando, que estava acéfalo, agora tem um chefe.
Investigado em diversas frentes em razão de suas relações promíscuas com o baronato do capitalismo oportunista, Lula foi pilhado vivendo à custa desses generosos patrocinadores, preocupados em lhe proporcionar o bom e o melhor – tudo como pagamento pelos lucrativos serviços que Lula lhes prestou nos governos petistas. A polícia e a Justiça entendem que o capo ainda precisa explicar melhor, sem xingar os investigadores nem debochar das instituições, como ele constituiu tão fraterna confraria – que, não por acaso, está no centro da roubalheira na Petrobrás.
Não era pequena a possibilidade de que Lula fosse preso a qualquer momento em razão dos diversos inquéritos dos quais é alvo em primeira instância. Agora, feito ministro, terá o privilégio de ter seu caso avaliado pelo Supremo Tribunal Federal, onde espera receber – e rogamos para que esteja totalmente enganado – a condescendência que certamente não teria do juiz federal Sérgio Moro.
Assim, Lula se torna o próprio exemplo de uma de suas tantas bravatas a respeito da impunidade no Brasil, na época em que ele ainda era o paladino da ética na política. Disse ele, em 1988: “No Brasil é assim: quando um pobre rouba, vai para a cadeia; mas quando um rico rouba, vira ministro”. Já se pode dizer que, para ser ministro do atual governo, a probidade é dispensável – a única exigência é que o candidato esteja sob investigação da Polícia Federal ou seja réu da Justiça. O Brasil já sente saudade do tempo em que os ministros eram escolhidos apenas como forma de barganha fisiológica.
Se a cartada de Lula será ou não bem-sucedida, só o tempo dirá, mas convém lembrar que o foro privilegiado não livrou da cadeia a quadrilha petista que atuou no mensalão. Enquanto o dia de encarar o tribunal não chega, Lula poderá exercer a Presidência de facto, sem ter recebido um único voto de um único brasileiro para isso. E não se diga, com o cinismo que é peculiar ao lulopetismo, que Lula, afinal, nunca deixou a cadeira presidencial e sempre influenciou Dilma. O que vai acontecer daqui em diante, ao menos na cabeça dos apaniguados do chefão petista, está em outro patamar: Lula vai ditar a política econômica, promovendo a “virada” tão desejada por essa caterva de irresponsáveis.
Já se espalhou que Lula pretende implementar um certo “plano de reanimação nacional”, para reverter a crise econômica. Nem é o caso de perguntar como o mago petista pretende realizar tamanho milagre, pois nada disso é se não rematada empulhação, como quase tudo o que caracteriza sua trajetória. Mas é o suficiente para animar a tigrada, com vista a 2018. O presidente da CUT, Vagner Freitas, por exemplo, já disse que Lula vai mudar “radicalmente” o governo e “dar uma guinada à esquerda”. Pobre Brasil.
Aos cidadãos brasileiros, ofendidos por essa desavergonhada demonstração de desprezo pela democracia, resta exercer nas ruas o direito de manifestação e pressionar o Congresso e o Judiciário a não permitirem que o golpe se complete. O Brasil não pode ser governado por uma quadrilha.
19 de março de 2016
Editorial O Estadão
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