Deputado federal, ministro da Justiça, das Relações Exteriores, prefeito do Distrito Federal, embaixador em Portugal, por último governador da Guanabara, Negrão de Lima trouxe de Minas Gerais múltiplas lições de competência política. Uma delas, de jamais ir para casa, à noite, sem despachar o último papel levado ao seu gabinete ou adotar a derradeira decisão inadiável. Deixava limpa a sua escrivaninha e explicava não ter certeza de que voltaria na manhã seguinte para continuar a trabalhar. Em especial quando depois de eleito governador, candidato das oposições ao regime militar e sob a má vontade dos então detentores do poder. Tentaram impedir sua posse e viu-se processado como comunista em Inquéritos Policiais Militares, livrando-se deles por sua óbvia resistência a todo tipo de radicalismos.
Era visto como adversário, até como inimigo pelos generais-presidentes, mas conseguiu conviver com todos e cumpriu os cinco anos de seu mandato. Morreu pobre.
Lembra-se a memória de um dos grandes políticos que o Brasil já teve por conta da escrivaninha vazia de todas as noites. Se não voltasse, nada ficaria devendo às suas obrigações.
ENQUANTO ISSO, MADAME HESITA…
Transplantando aqueles idos para hoje, a conclusão é de que fazem falta as lições de Negrão de Lima. Porque a prática dos governantes de agora é de não fazer hoje o que pode ser deixado para amanhã. Quantas decisões a presidente Dilma vem protelando, especialmente depois de reeleita? Da reforma do ministério, que levou quase um ano para acontecer de forma pífia, até convencer-se de que vivíamos uma crise dos diabos, Madame hesitou e ainda hesita. Precisaria virar o jogo, adotando um programa de sacrifícios e de retomada do crescimento, mas não se decide.
Deveria, mas não ousa, enquadrar as elites através do imposto sobre grandes fortunas e a taxação de heranças. Passa ao largo da necessidade de estabelecer amplo projeto de combate ao desemprego por meio de obras públicas. Deixa de elaborar mudanças essenciais no pacto federativo, como se Estados e Municípios não lhe dissessem respeito. Volta as costas para aumentar investimentos em educação e saúde públicas. Tergiversa frente à importância de reduzir juros e duplicar o salário mínimo.
Essas e quantas outras iniciativas a presidente leva para casa, todas as noites, sequer sem trazer soluções no dia seguinte? Ao retornar, encontra a mesa de trabalho sempre mais atulhada de obrigações adiadas. Deveria, ao menos, encomendar uma biografia de Negrão de Lima…
23 de novembro de 2015
Carlos Chagas
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