O país, com toda razão, reage com desgosto e indignação à corrupção e ao desvio de recursos públicos. Não há regime político digno deste nome que possa resistir a tal erosão dos valores, sobretudo de parte de uma certa elite política e de empresários inescrupulosos.
Os fatos cotidianamente estampados mostram o quanto o bem comum é criminosamente apropriado por poucos.
Alguns o fazem por ideologia, locupletando-se partidariamente, como se assim uma sociedade “melhor” pudesse ser conquistada. Evidentemente, o “melhor” para eles não corresponde minimamente ao que é o bem do país como um todo. Alguns outros o fazem para maximizar os seus ganhos, em um procedimento que nega a concorrência e as leis de mercado. Adoram o Estado por se apropriarem privadamente do que é o fruto do trabalho de todos.
Para uns e outros a economia de mercado, o direito de propriedade e o estado democrático de direito só possuem valor enquanto respondam aos seus respectivos interesses. Uns vilipendiam o “liberalismo” por ser “conservador” e de “direita”, outros por não corresponder à sua peculiar e distorcida visão da concorrência e do mercado. Uns podem ser denominados de esquerdistas, outros de capitalistas de compadrio.
Há uma mistura particularmente insalubre, onde as distinções entre direita e esquerda, conservadores e progressistas, se esvaem como areia dentre os dedos das mãos. Bem sabemos que essas distinções, se é que ainda possuem alguma validade, são manipuladas ao sabor das circunstâncias e das conveniências. Denominar os condenados pelo mensalão, por infrações e crimes julgados pelo Supremo como “guerreiros do povo brasileiro” é uma destas aberrações ideológicas.
O “Petrolão” se situa na esteira do “mensalão”. O assalto aos cofres da maior estatal brasileira é uma amostra de o quanto a impunidade vinha tomando conta do país, como se a condenação do mensalão tivesse sido apenas um ponto fora da curva.
Agora, com grandes empreiteiros no xilindró e políticos prestes a serem julgados pelo STF, com outros indo, por perda de mandato, para a Primeira Instância do Judiciário, vê-se que o Brasil apresenta uma tendência de punição aos que assaltam os cofres públicos.
Na tendência o “mensalão” se une ao “Petrolão”, expondo uma curva de redução da impunidade e de valorização das instituições democráticas.
Agora, com grandes empreiteiros no xilindró e políticos prestes a serem julgados pelo STF, com outros indo, por perda de mandato, para a Primeira Instância do Judiciário, vê-se que o Brasil apresenta uma tendência de punição aos que assaltam os cofres públicos.
Na tendência o “mensalão” se une ao “Petrolão”, expondo uma curva de redução da impunidade e de valorização das instituições democráticas.
Convém sempre lembrar que o Estado vive da arrecadação de impostos, ou seja, da transferência de bens privados para a esfera pública. Se essa transferência ocorre é porque ela tem como pressuposto que esses mesmos recursos serão destinados ao bem comum, na construção, por exemplo, de uma infraestrutura logística, em moradias populares, em uma saúde pública e em uma educação de qualidade e assim por diante. Em todo caso, ninguém, de sã consciência, admitiria que os impostos devessem ser destinados a projetos partidários ou para a ganância de poucos.
O país definitivamente amadureceu. Suas instituições se mostram cada vez mais consolidadas. Poderia, mesmo, ter ocorrido que, diante dos desmandos que se sucedem, parte substancial da sociedade brasileira estivesse clamando por um salvador ou, inclusive, por uma renúncia da presidente.
Nada disto está ocorrendo. Há uma espécie de “ciência cívica” aqui presente, segundo a qual as instituições devem funcionar independentemente, pois só assim o país será “salvo”, salvo da degradação moral e política.
Nada disto está ocorrendo. Há uma espécie de “ciência cívica” aqui presente, segundo a qual as instituições devem funcionar independentemente, pois só assim o país será “salvo”, salvo da degradação moral e política.
Note-se que o grande fato novo consiste na punição da corrupção, na indignação generalizada diante da impunidade reinante.
A Petrobrás de símbolo nacional tornou-se exemplo do que não pode ser, de nenhuma maneira, admitido. Quando se recorda que, na última eleição, e mesmo em anteriores, ela chegou a ser utilizada enquanto instrumento de uma disputa partidária e ideológica, como se ela estivesse sendo destinada à “privatização”, observa-se melhor o quanto essa disputa se encontrava infinitamente distante da realidade. Na verdade, ela estava sendo “privatizada”, ou melhor dito, “aparelhada” por partidos, por grandes empreiteiras e por funcionários inescrupulosos, que devem ser, evidentemente, distinguidos do corpo de funcionários, que nada tem a ver com isto. A disputa eleitoral, neste quesito, parece coisa de outro mundo, com nenhuma semelhança com este!
A Petrobrás de símbolo nacional tornou-se exemplo do que não pode ser, de nenhuma maneira, admitido. Quando se recorda que, na última eleição, e mesmo em anteriores, ela chegou a ser utilizada enquanto instrumento de uma disputa partidária e ideológica, como se ela estivesse sendo destinada à “privatização”, observa-se melhor o quanto essa disputa se encontrava infinitamente distante da realidade. Na verdade, ela estava sendo “privatizada”, ou melhor dito, “aparelhada” por partidos, por grandes empreiteiras e por funcionários inescrupulosos, que devem ser, evidentemente, distinguidos do corpo de funcionários, que nada tem a ver com isto. A disputa eleitoral, neste quesito, parece coisa de outro mundo, com nenhuma semelhança com este!
Neste sentido, o país tem tudo a regozijar-se. A corrupção só envergonha aqueles que a admitem e toleram. Os que a enfrentam devem orgulhar-se, pois somente deste enfrentamento pode sair um país melhor.
Imaginem se esse descalabro atual fosse tido por algo “natural”, algo que deveria ser simplesmente aceito, algo inelutável. Não há destino aqui, senão em um significado bem particular, o de acabar com ela através de instituições fortes. Seria, neste sentido, o destino de nossa democracia.
Imaginem se esse descalabro atual fosse tido por algo “natural”, algo que deveria ser simplesmente aceito, algo inelutável. Não há destino aqui, senão em um significado bem particular, o de acabar com ela através de instituições fortes. Seria, neste sentido, o destino de nossa democracia.
A Polícia Federal, o Ministério Público e o Judiciário estão funcionando enquanto instituições republicanas, voltadas para o bem comum. Não estão obedecendo a orientações governamentais, mas levam a cabo investigações independentes e julgamentos que estão produzindo desassossego nos que pensavam que a impunidade continuaria reinante. O próprio governo e os partidos políticos mais parecem espectadores de um espetáculo não encomendado. Mais aguardam do que participam.
Por fim, cabe ressaltar que nada disto estaria se produzindo se a sociedade brasileira não contasse com uma grande imprensa (jornais e revistas) e com meios de comunicação televisivos, radiofônicos e digitais que fazem circular, com total liberdade, a uma velocidade impressionante informações e análises que orientam os cidadãos.
Pretender calar essa imprensa e esses meios de comunicação em nome de uma pretensa “democratização dos meios de comunicação” ou de um suposto “controle social da mídia” seria nada mais do que uma forma de matar o mensageiro, como se a corrupção não devesse ser publicizada, nem, muito menos, punida.
Pretender calar essa imprensa e esses meios de comunicação em nome de uma pretensa “democratização dos meios de comunicação” ou de um suposto “controle social da mídia” seria nada mais do que uma forma de matar o mensageiro, como se a corrupção não devesse ser publicizada, nem, muito menos, punida.
Feliz Ano Novo a todos!
29 de dezembro de 2014
Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
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