Clima fica ameno no país e gelado na economia; crédito livre encolhe, confiança ainda desaba
PARA QUEM GOSTA de futebol, apenas de Copa ou, no mínimo, da festa, o clima de repente pareceu mais ameno ou, pelo menos, apareceram distrações anestésicas das durezas normais da vida, que no entanto continuam as mesmas.
Ainda assim, o ar parece mais leve. Portanto, conversas sobre o estado da economia brasileira parecem sombrias como um vulto de urubu e ainda mais deslocadas do que de costume, pois ainda mais inoportunamente desagradáveis.
Não aparecem boas notícias. Embora a tendência de baixa fosse mais ou menos previsível, a queda é inesperadamente mais rápida e, pior, em parte gratuita.
Economias flutuam, têm ciclos de baixa, nos quais por vezes se purgam ou se corrigem problemas e excessos. Padecemos agora das agruras de um momento de baixa sem que estejamos ao menos corrigindo o básico, de modo que voltemos ao arroz com feijão.
O crédito que não é regulado pelo governo parara de crescer em abril. Em maio, passou a encolher, soube-se ontem, pelas estatísticas do Banco Central. Isto é, o total de dinheiro emprestado na modalidade "livre" era em maio de 2014 menor que em maio do ano passado.
O estoque de crédito, a quantidade total de dinheiro emprestada, cresce cada vez mais devagar, agora a 6% ao ano, em termos reais, apenas devido àquelas linhas em que há a mão do governo ou direcionamento legal do dinheiro. Isto é, empréstimos do BNDES, crédito imobiliário e crédito rural, além do consignado.
Ou seja, dinheiro que o governo toma emprestado e empresta para a banca estatal, que o repassa a juros subsidiados; dinheiro da caderneta de poupança, que em grande parte deve financiar imóveis; dinheiro subsidiado para a agricultura.
Em parte, portanto, o crédito ainda cresce porque o governo se endivida a juros altíssimos. Em parte, empresas mantêm empregos porque o governo se endivida, baixando impostos de modo a aumentar a rentabilidade das empresas. Como a receita do governo é insuficiente, há deficit, o governo fica no vermelho. A fim de cobrir o buraco, o governo toma dinheiro emprestado.
Além de outros equívocos de política econômica, é fácil perceber que esse esquema artificial de remendos não vai funcionar nem prestar, além de contrariar a política monetária, a do Banco Central, que eleva a taxa de juros justamente a fim de esfriar uma economia em que a inflação está além do conveniente.
O crédito dito "livre" secou; o restante, "direcionado" pelo governo, cresce de modo que não faz muito sentido.
Nas grandes metrópoles, ao menos, a massa salarial vem tendendo à estagnação. O emprego formal cresce a 60% do ritmo médio dos três primeiros anos do governo Dilma Rousseff.
A prévia do indicador de confiança do empresário industrial de junho foi ruim: caiu pelo sexto mês seguido, na pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas. Decerto a indústria é o setor mais avariado da economia. Mesmo assim. A indústria contamina, real ou "psicologicamente", os demais setores.
Vamos parando o carro quebrado, no meio da rua, mas no máximo vamos tentar consertá-lo com uma gambiarra, o que também não vai prestar.
PARA QUEM GOSTA de futebol, apenas de Copa ou, no mínimo, da festa, o clima de repente pareceu mais ameno ou, pelo menos, apareceram distrações anestésicas das durezas normais da vida, que no entanto continuam as mesmas.
Ainda assim, o ar parece mais leve. Portanto, conversas sobre o estado da economia brasileira parecem sombrias como um vulto de urubu e ainda mais deslocadas do que de costume, pois ainda mais inoportunamente desagradáveis.
Não aparecem boas notícias. Embora a tendência de baixa fosse mais ou menos previsível, a queda é inesperadamente mais rápida e, pior, em parte gratuita.
Economias flutuam, têm ciclos de baixa, nos quais por vezes se purgam ou se corrigem problemas e excessos. Padecemos agora das agruras de um momento de baixa sem que estejamos ao menos corrigindo o básico, de modo que voltemos ao arroz com feijão.
O crédito que não é regulado pelo governo parara de crescer em abril. Em maio, passou a encolher, soube-se ontem, pelas estatísticas do Banco Central. Isto é, o total de dinheiro emprestado na modalidade "livre" era em maio de 2014 menor que em maio do ano passado.
O estoque de crédito, a quantidade total de dinheiro emprestada, cresce cada vez mais devagar, agora a 6% ao ano, em termos reais, apenas devido àquelas linhas em que há a mão do governo ou direcionamento legal do dinheiro. Isto é, empréstimos do BNDES, crédito imobiliário e crédito rural, além do consignado.
Ou seja, dinheiro que o governo toma emprestado e empresta para a banca estatal, que o repassa a juros subsidiados; dinheiro da caderneta de poupança, que em grande parte deve financiar imóveis; dinheiro subsidiado para a agricultura.
Em parte, portanto, o crédito ainda cresce porque o governo se endivida a juros altíssimos. Em parte, empresas mantêm empregos porque o governo se endivida, baixando impostos de modo a aumentar a rentabilidade das empresas. Como a receita do governo é insuficiente, há deficit, o governo fica no vermelho. A fim de cobrir o buraco, o governo toma dinheiro emprestado.
Além de outros equívocos de política econômica, é fácil perceber que esse esquema artificial de remendos não vai funcionar nem prestar, além de contrariar a política monetária, a do Banco Central, que eleva a taxa de juros justamente a fim de esfriar uma economia em que a inflação está além do conveniente.
O crédito dito "livre" secou; o restante, "direcionado" pelo governo, cresce de modo que não faz muito sentido.
Nas grandes metrópoles, ao menos, a massa salarial vem tendendo à estagnação. O emprego formal cresce a 60% do ritmo médio dos três primeiros anos do governo Dilma Rousseff.
A prévia do indicador de confiança do empresário industrial de junho foi ruim: caiu pelo sexto mês seguido, na pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas. Decerto a indústria é o setor mais avariado da economia. Mesmo assim. A indústria contamina, real ou "psicologicamente", os demais setores.
Vamos parando o carro quebrado, no meio da rua, mas no máximo vamos tentar consertá-lo com uma gambiarra, o que também não vai prestar.
27 de junho de 2014
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
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