"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

A MÉDIA QUE NOS COLOCA ABAIXO

Dados do projeto Índice para uma vida melhor mostram que Brasil precisa esboçar, com urgência, uma revolução educacional. Do contrário, não veremos país nenhum


Apenas 34 mil brasileiros acessaram o endereço da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para conferir o Índice para uma vida melhor (www.ocdeindicevidamelhor.org). Desses, 800 responderam ao questionário. Apesar da adesão pequena, os resultados apontam pistas sobre o grau de satisfação da população com o país, e quais expectativas nutrem.

Dos 11 itens da pesquisa, as maiores preocupações nacionais, nessa ordem, são “educação”, “satisfação pessoal” e “saúde”. As menores preocupações são “comunidade” e “engajamento cívico”. Resta saber se os itens mais coletivos importam menos à população ou se, na visão dos respondentes, estão mais bem resolvidos. A pesquisa não responde essa sutileza, mas aponta para tantas outras que podem pautar as políticas públicas. A dizer, os demais itens são moradia, renda, trabalho, satisfação de vida, segurança, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.

O resultado que mais deu repercussão – negativa – diz respeito à produtividade. De acordo com os índices da OCDE, o brasileiro trabalha mais do que a média dos habitantes de países ricos, mas produz menos e ganha remunerações mais medíocres. Entre os 36 países avaliados, o Brasil tem a pior renda per capita e 11% da população com carga horária semanal superior a 11%. Tudo isso, mesmo sendo a sétima economia do mundo. Soa esquizofrênico: rico, o Brasil tem uma das piores rendas per capitas – algo quatro vezes a menos do que a das famílias médias americanas, por exemplo.

A explicação para tamanha disparidade está na instrução. Com menos tempo de exposição à escola, a população brasileira encontra mais dificuldade em transformar o tempo gasto na vida profissional em resultados. O que mais surpreende os analistas é que, apesar do desempenho pouco vantajoso – não é agradável trabalhar tanto e receber pouco em troca –, 80% dos que responderam ao questionário se dizem satisfeitos com a vida, um índice quatro dígitos mais alto do que a dos outros países.

Assim que o dado da produtividade foi divulgado, houve quem o lesse do ponto de vista mais pejorativo – algo como “o brasileiro trabalha pouco”. Produzir menos não é, contudo, sinônimo de trabalhar menos, mas de não tirar do tempo do trabalho tudo o que ele pode render, usando do raciocínio e da organização, habilidades que melhoram à medida que avança o tempo de exposição à escola.

Os índices educacionais confirmam que o país perde – e muito – por causa desses descompasso, aspecto que compromete as perspectivas de desenvolvimento. Não se tem notícia de país desenvolvido que tenha quadro semelhante. No Brasil, 43% das pessoas entre 25 e 64 anos têm ensino médio. No Chile, esse índice é de 72%. Nos EUA, de 89%. As perspectivas não são muito melhores entre os jovens adultos, em tese, com idade de acertar sua situação escolar: 57% dos brasileiros entre 25 e 34 anos concluíram o ensino médio. Entre os desenvolvidos essa estatística supera 80% da população na mesma faixa etária.

Mesmo em situações de crise, países como a Argentina e a Rússia, para citar dois, se saem melhor, graças à escolaridade. Um engenheiro que esteja trabalhando de motorista de táxi, em Buenos Aires, por exemplo, tende não só a otimizar – como gostam de dizer os representantes do mundo corporativo – como em retornar para seu campo de atuação específica ou migrar para o empreendedorismo.

É questão séria. Difícil não citar aqui a média dos índices educacionais nas zonas de “polícias pacificadoras”, ou o nome que tenha. Em Curitiba e região metropolitana, por exemplo, a faixa nessas zonas favelizadas é de quatro anos de estudo, mesmo entre os jovens adultos. Do que se pode deduzir que os moradores das “zonas congeladas” podem ficar livres da violência, mas permanecem sujeitos à informalidade, situação na qual são vulneráveis ao crime, ativo e passivo. Do que se deduz que sem uma revolução educacional, em paralelo, não há política de segurança pública que funcione.

Em tempo. Esses dados eram conhecidos, antes mesmo da OCDE trazê-los à baila. A cada ano o Brasil perde mais a oportunidade de romper o dique e salvar seus jovens. Não se trata, obviamente, de uma tarefa do Estado, apenas, mas de toda a sociedade. Enquanto as mais diversas instituições não fizeram dessa a sua bandeira, não veremos país nenhum.

 
23 de junho de 2014
Editorial Gazeta do Povo, PR

Nenhum comentário:

Postar um comentário