"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

QUEM FICOU RICO COM OS PREJUÍZOS DA PETROBRAS?

A 36 dias da abertura da Copa do Mundo, o futebol vai se tornando o assunto predominante no Brasil, embora as pesquisas de opinião pública sobre a disputa da Presidência continuem em voga. Então, talvez não seja de mau alvitre recorrer a lúcidos ensinamentos do futebol para aplicar na campanha eleitoral. Este é o caso da máxima dos treinadores que mais ganham campeonatos seguindo uma lição simples: "Em time que está ganhando não se mexe". Mas, com a importância cada vez maior dada ao marketing político nas democracias ocidentais, convém não esquecer o lema que está por trás de toda publicidade, seja comercial, seja religiosa, seja política, atribuído a Joseph Goebbels, o mago da propaganda do nazismo: "Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade".

Candidata obstinada à própria reeleição, a presidente Dilma Rousseff pode até não ter pensado nas duas sentenças, mas, na certa, as aplicou quando repetiu o mantra com que seu antecessor, padrinho e agora pedra no sapato Luiz Inácio Lula da Silva derrotou Geraldo Alckmin, em 2006, e ela própria adotou para manter José Serra à distância, em 2010. Há oito anos, aparentemente debilitado pela denúncia do mensalão, o ex-presidente foi ajudado por uma campanha subliminar insinuando que os tucanos privatizariam a Petrobrás. O efeito deletério da patranha em seu desempenho fez o oponente vestir uma jaqueta com logomarcas de estatais, entre elas a Petrobrás. Em vão: teve menos votos no segundo do que no primeiro turno e deu-se a reeleição. Há quatro anos, a falácia levou Serra às cordas e o poste de Lula venceu.

A decisão do eleitor diante da urna depende de muitas motivações e as vitórias petistas não podem ser atribuídas apenas à mentira que, de tão repetida, passou a ser dada como verdadeira. Mas, por via das dúvidas, em Minas, berço dela mesma e de seu maior empecilho à permanência no poder, Aécio Neves, a presidente assumiu como sua a profecia de que a oposição privatizará a Petrobrás ou trocará seu nome.

O problema dela e do Partido dos Trabalhadores (PT) é que o contexto mudou significativamente nesta eleição. Nas duas disputas anteriores, o salário-família para os mais pobres e a bonança econômica para os abonados amplificavam bastante a fé popular na pregação governista. E a Petrobrás propagava ótimas notícias e, consequentemente, excelentes razões para o eleitor não permitir alterações profundas na gestão da maior empresa do Brasil. A fantasia dos Emirados Árabes do Brasil tinha prefixo, hífen e nome: pré-sal - o sonho de mil e uma noites, que Sheherazade não tinha tido a ideia de contar ao rei persa Shariar, de um país disposto a gastar petrodólares em educação e saúde para o povo.

Sete anos após a revelação do sonho, o petróleo extraído da camada do pré-sal no fundo do Atlântico brasileiro continua sendo uma miragem. E, 60 anos depois do delírio de "o petróleo é nosso", a pérola mais preciosa do colar da rainha das estatais, com sua fortuna enterrada em subsolo brasileiro, chafurda na lama de chiqueiros ocupados por figurões do PT e seus aliados, suspeitos de terem dilapidado um patrimônio bilionário em "nebulosas transações". E pior: a pérola jogada aos porcos se desvalorizou vertiginosamente. No palanque em que tenta recuperar o prestígio perdido nas pesquisas de intenção de votos, a "gerentona" de Lula se apega ao truísmo de que a empresa vale hoje mais do que valia no tempo de Fernando Henrique. Este desocupou o trono há mais de 11 anos e continua sendo o parâmetro universal do PT.

Essa comparação sem lógica feita pela candidata não elimina, porém, duas constatações assustadoras de fiasco: em seu mandato, a empresa teve o patrimônio reduzido à metade e desabou do 12.º para o 120.º lugar no ranking do Financial Times. Ou seja: a contabilidade da petroleira foi ao fundo do mar, até o pré-sal, mas não extraiu petróleo para vir à tona.

A princípio, pensava-se que a gigante estatal seria vítima apenas da ingerência política que sangrou seus cofres mantendo o preço de derivados abaixo do custo para evitar a má influência da inflação na medição da preferência eleitoral pela chefe do governo em outubro que vem. Essa má gestão causou, segundo O Globo, um rombo de R$ 13 bilhões em outra estatal, a Eletrobrás, para permitir que a candidata à reeleição baixasse demagogicamente o preço da tarifa de luz.

Mas este não foi o único "malfeito", para usar o termo favorito da beneficiária número um do aparelhamento das empresas públicas pelo PT. A Polícia Federal (PF), que, pelo visto, não foi totalmente submetida ao aparelhamento amplo, geral e irrestrito dos companheiros, constatou na Operação Lava Jato que houve bandalheira. Ao que se saiba até hoje, a desventura em Pasadena, Texas, custou ao cidadão brasileiro, proprietário da Petrobrás, um prejuízo de US$ 2 bilhões. Dez vezes este "troco de pinga" sumiram na obra faraônica da Refinaria Abreu e Lima, bancada pelo público para agradar ao tirânico compadre venezuelano Hugo Chávez.

Governo e oposição acionaram o Supremo Tribunal Federal (STF) para resolver o impasse que adia a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o tema: esta exige uma comissão mista e aquele não abre mão de circunscrevê-la ao Senado para controlá-la. A presidente da petroleira, Graça Foster, oscila entre o "mau negócio", pondo o mico nas costas do antecessor, José Sérgio Gabrielli, e o "bom negócio à época", quando lembrada que a empresa é gerida por petistas e aliados há 12 anos. Investigar será o único jeito de saber quem embolsou o lucro, além do barão belga Frère, da Astra Oil. As compras de altíssimo risco das refinarias de Pasadena e Okinawa, os custos estratosféricos da de Abreu e Lima e as suspeitas associações na operação de três termoelétricas são a parte exposta do iceberg. Quem ficou podre de rico com o rombo dos prejuízos que a Petrobrás teve - eis a questão submersa.

 
07 de maio de 2014
José Nêumanne, O Estado de S.Paulo

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