A conjuntura externa tem sido a desculpa predileta do governo para explicar todos os males que se abatem sobre a economia brasileira. O argumento se aplica desde a alta da inflação até a oscilação do dólar, passando pelo próprio resultado fiscal do Brasil. Os estímulos econômicos que vêm dilacerando as contas públicas brasileiras são resposta à crise internacional, disse o ministro Guido Mantega em inúmeras ocasiões. No caso da Petrobras, não poderia ser diferente. Tanto a presidente Dilma Rousseff quanto a atual chefe da estatal, Graça Foster, alegaram fatores externos como causas da queda do valor de mercado da companhia na bolsa. Até mesmo o ex-presidente da empresa, José Sergio Gabrielli, arriscou dizer em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que a crise internacional foi a causa dos males da empresa durante sua gestão, digamos, 'exemplar'.
Contudo, os números mostram que o impacto da crise no desempenho da Petrobras na bolsa não foi tão pernicioso assim — e que as coisas pioraram mesmo com a queda da confiança do mercado em relação à empresa e ao Brasil. Entre as dez maiores companhias de energia do mundo, segundo o ranking mais recente da consultoria IHS, apenas a Petrobras acumula queda de valor de mercado entre 2009, quando o mundo sofria o impacto agudo da crise, e 2014. As demais conseguiram trafegar pelos anos difíceis e se reerguer, como mostra o gráfico. A americana Chevron, por exemplo, saiu da terceira posição no ranking das maiores empresas em dezembro de 2008 para a primeira posição em 2014. Curiosamente, em maio de 2008, antes da eclosão da crise, a Petrobras havia conseguido ultrapassar a Microsoft, o Walmart e a própria Chevron em valor de mercado, tornando-se a terceira maior empresa do continente americano, atrás apenas da Exxon e da General Electric. À época, o valor da estatal estava próximo de 500 bilhões de reais. Hoje, está em 200 bilhões.
Os números são elucidativos porque mostram que, em dezembro de 2008, as maiores empresas de petróleo do mundo haviam passado por uma tormenta sem precedentes devido ao derretimento dos mercados de ações e à falta de liquidez nos Estados Unidos e na Europa. Naqueles tempos, não houve empresa em bolsa que tivesse ficado ilesa. Assim, em 2009, todas as petroleiras estavam na estaca zero — recolhendo os cacos. Ao longo daquele ano, a Petrobras conseguiu acompanhar o curso do setor e mostrou recuperação. Suas ações, que eram negociadas a 24 dólares no último pregão de 2008, terminaram 2009 a 47 dólares. De lá pra cá, porém, a queda foi constante — mesmo em 2010, ano em que a economia brasileira cresceu 7,5% e não sinalizava a desaceleração permanente que estava por vir. Aquele também foi o ano da capitalização bilionária da Petrobras, em que a companhia levantou 120 bilhões de reais no mercado para financiar os investimentos na exploração do pré-sal. Portanto, a queda verificada no período mostrava uma clara insatisfação do mercado com os planos da empresa para os bilhões captados. Porém, quando se olha a trajetória das outras empresas do setor, apenas a Petrobras perdeu valor de mercado no período.
Durante o governo Dilma, a forte atuação da empresa como braço de controle inflacionário terminou de minar qualquer plano otimista que pudesse haver para o futuro. Para se ter ideia, a produção da companhia não saiu do patamar de 2,5 milhões de barris/dia nos últimos anos, enquanto sua dívida disparou, passando de 65 bilhões em 2010 para 223 bilhões em 2014. "A petroleira não se valeu apenas do dinheiro captado com a oferta de ações em 2008, mas também aumentou seu endividamento para conseguir investir”, explica Flavio Conde, economista da Gradual. “Como a Petrobras não aumentou sua produção para acompanhar a demanda, precisou importar a um preço mais alto no mercado internacional, o mercado não gostou e as ações despencaram", diz.
Na mesma base de comparação, a americana Exxon conseguiu crescer sem explodir sua dívida: em 2010, seu valor de mercado era de 369 bilhões de dólares o endividamento era de 7 bilhões de dólares; agora, vale 416 bilhões de dólares e seu a dívida avançou para 18 bilhões de dólares. “A resposta para a matemática da Exxon está na lucratividade; empresas têm de ter um lucro compatível com a necessidade de investimentos”, aponta Conde. No caso da Petrobras, a origem da baixa produtividade da empresa está não só na gestão aparelhada, mas também na política de conteúdo nacional, que fez com que a estatal dependesse de uma cadeia de fornecedores locais para conseguir levar adiante seu plano de investimentos. A estratégia deu errado não só porque a execução da política de governo mostrou-se mais difícil do que o esperado, mas também porque os fornecedores não se mostraram dispostos a investir para atender à demanda da empresa.
Resultado da insatisfação do mercado com a condução da estratégia pela gestão petista foi visto recentemente, numa situação pra lá de esdrúxula, quando as ações da empresa passaram a subir mesmo com a perspectiva de uma CPI — fato que assustaria qualquer acionista. A influência do governo na estatal também pesou. Tanto que a queda da aprovação do governo Dilma impactou positivamente a variação das ações da Petrobras. Diante de tantas contradições, o mercado continua com mais perguntas do que respostas sobre o que a estatal se tornou hoje e como as coisas podem ser diferentes no futuro.
26 de abril de 2014
Veja
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