Novas organizações, mais violentas, estão surgindo nos presídios do País para fazer ao frente ao PCC. Para juiz, é mais um sinal de fracasso do modelo de encarceramento
Os assassinatos em série e as decapitações no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão, revelam o retorno da barbárie e uma nova onda de conflitos entre a mais poderosa das organizações, o PCC, e novas facções na luta pelo controle das prisões no País. O conflito recrudesceu em razão da expansão do PCC.
“Essa organização se espalhou pelo País inteiro. Em vários Estados, estão surgindo novas facções que não aceitam o comando do PCC e passaram a matar os detentos a ele vinculados”, afirma o juiz Douglas Martins, diretor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Responsável pelos mutirões carcerários coordenados pelo CNJ, ele se diz preocupado com o aumento da violência e a banalização de atos escabrosos. Em alguns casos registrados em Pedrinhas, em plena luz do dia, num espetáculo macabro, as vítimas são decapitadas e têm os olhos arrancados.
Num dos conflitos registrados este ano em Pedrinhas, os rebelados aproveitaram a visita de um desembargador maranhense à cadeia e jogaram em direção ao grupo, rolando como se fosse uma bola, a cabeça de um dos detentos.
As novas facções, mais violentas, estão surgindo em várias partes do país. Em São Paulo, onde o PCC exerce o domínio de 90% da massa carcerária, surgiu a Cerol Fino, que disputa os presídios da região de Presidente Prudente, a oeste da capital paulista. Como o próprio nome sugere, essa organização tem predileção pela degola das vítimas e busca o conflito a partir da região onde estão encarcerados os principais líderes do PCC.
Em Pedrinhas, maior palco de violência do sistema penal atualmente – com 58 homicídios e 13 decapitações registradas este ano – duas organizações estão se impondo: o PCM (Primeiro Comando do Maranhão) e o Bonde 40, assim denominada pela preferência de armas de calibre ponto 40 entre seus integrantes. As duas disputam entre si e brigam contra o avanço do PCC.
No Amazonas, especialmente na região de Manaus, surgiu a Família do Norte, que já matou vários membros do PCC e foi isolada. Na região metropolitana de Belém, no Pará, a queda de braço está sendo travada por duas facções cujos apelidos simbolizam o histórico conflito entre americanos e terroristas que gravitavam em torno de Bin Laden: a Al Qaeda e Estados Unidos, que se tornaram inimigas mortais.
Rio Grande do Sul
O PCC encontra mais dificuldades para entrar no sistema penal do Rio Grande do Sul, mas também lá encontrou adeptos, especialmente no Presídio Central de Porto Alegre, o de maior concentração do país, com 4.800 detentos.
O domínio da massa carcerária gaúcha na região metropolitana da capital pertence, entretanto, a três novas facções: Os Manos, Os Brasas e Os Balas na Cara. No outro extremo do país, em Salvador, surgiu uma organização com cara baiana: Comando da Paz.
“Os conflitos estão relacionados ao fenômeno da nacionalização do PCC, que ninguém sabe ainda aonde isso vai dar”, alerta a socióloga Camila Dias, do Núcleo de Estudos da Violência da USP e autora de alentado levantamento sobre a hegemonia da organização nos presídios e o domínio sobre o tráfico de drogas nas grandes cidades.
Camila diz que o PCC se firmou como uma grande organização cuja performance e receptividade na massa carcerária não se explica apenas pelos serviços sociais internos ou pelos negócios que comanda.
“O vetor de ação é um tipo de ideologia onde o inimigo é o estado violador dos direitos do preso. Acho que é um erro imaginar que se combate o PCC apenas com apreensão de drogas ou bloqueio dos bens de seus integrantes”, diz a socióloga. Segundo ela, é contra essa lógica que as novas organizações se insurgem, repetindo atos de violência que o PCC abandonou há quase uma década.
O juiz Douglas Martins diz que a proliferação de facções reflete o fracasso do modelo prisional brasileiro, baseado, segundo afirma, na concentração de detentos em grandes presídios das regiões metropolitanas e no encarceramento em massa priorizando modalidades ligadas aos crimes contra o patrimônio.
Dados oficiais
Os dados oficiais do Ministério da Justiça, com base no último levantamento disponível, demonstram que os detentos do país condenados por crimes contra a pessoa (homicídios e sequestros), num universo de 513.713 encarcerados até o final do ano passado, eram 64.736, enquanto os contra o patrimônio (roubos, furtos e latrocínios) alcançaram 267.975. Os sentenciados por tráfico de drogas cumprindo pena chegam a 138.198.
O grosso da população carcerária do país, 266.237, é formada por uma juventude com idade inferior a 29 anos. Destes, a imensa maioria (143.470), está na faixa entre os 18 e 24 anos, é parda (212.409) e branca (173.463) mora na região metropolitana (211.727), solteiro (146.481), não completou o ensino fundamental (231.429) e terá de cumprir pena que varia de quatro a oito anos de prisão (85.784).
21 de dezembro de 2013
Vasconcelo Quadros - iG
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