Resultado das incertezas que cercam o atual governo, programa de concessões tem atraído menos interessados do que seria de esperar
Se o programa de concessões do governo federal dependesse de superstições para ser bem-sucedido, seria o caso de registrar que a iniciativa não parece ter começado com o pé direito.
Verdade que o governo comemorou o leilão da rodovia BR-050 (MG-GO), a primeira a ser concedida à iniciativa privada no âmbito do Programa de Investimentos em Logística. O consórcio vencedor ofereceu desconto de 42% em relação ao preço máximo do pedágio --resultado considerado bom, embora não excepcional.
Entretanto, a ausência de interessados no outro trecho que deveria ter sido leiloado na semana passada, a BR-262 (ES-GO), surpreendeu o governo. Mais que isso, o fiasco foi um exemplo do tipo de problema que o país enfrenta pelas deficiências da regulação no setor de infraestrutura e pela falta de planejamento e previsibilidade da administração Dilma Rousseff.
No caso das rodovias, os vários órgãos públicos envolvidos demonstram pouca coordenação entre si. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) não combina seus planos com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), órgão regulador do setor, e não dá sinais de se entender com todo o Ministério dos Transportes. A pasta, por sua vez, não conversa com as empresas a tempo de evitar fracassos.
Não ficaram restritas às rodovias as notícias de mau agouro. O campo de Libra, joia do pré-sal, atraiu menos concorrentes do que se esperava: 11 empresas se inscreveram no leilão, que deverá render R$ 15 bilhões ao governo federal.
Entre as interessadas estão seis estatais --especialmente chinesas, preocupadas em garantir fornecimento de petróleo--, mas gigantes privadas (ExxonMobil, Chevron, BP, BG) ficaram de fora, num sinal de que não consideram o retorno e o modelo de exploração suficientemente atraentes ou seguros.
Reproduzem-se em cada caso particular os problemas que são regra geral. No petróleo, uma incerteza regulatória adicional diz respeito à presença da nova estatal Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), responsável pelos contratos de partilha de produção e com poderes de veto em algumas matérias.
O governo dá sinais de que garantirá o sucesso do leilão, em último caso até financiando a Petrobras para que a empresa ultrapasse a participação obrigatória por lei, de 30%. Como sempre, os bancos públicos teriam papel destacado.
Se o leilão de Libra for afinal um sucesso --como se imagina, apesar dos pesares--, o governo ganhará algum alívio. Mas o programa de concessões, por razões bastante conhecidas e nada sobrenaturais, começou mal.
24 de setembro de 2013
Editorial da Folha de São Paulo
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