O DATAFOLHA confirma que os brasileiros não estavam tão otimistas com as perspectivas da economia fazia três anos. Nesta quinta (1º), soube-se ainda que a indústria cresceu mais do que o previsto em dezembro passado, que a venda de automóveis continuou a aumentar em janeiro, que a venda de caminhões ressuscita e que a confiança dos empresários é a maior em três anos e meio.
Dada a ruína que ainda é fácil e doloroso observar nas ruas e nas estatísticas, ainda há quem se insulte com o comentário a respeito da reanimação dos brasileiros, captada em todas as pesquisas.
Por que então interessa notar o fenômeno da confiança em alta casada com a recuperação, nanoscópica mas disseminada agora por quase toda a economia?
Porque essa consonância de ânimos e notícias melhores é novidade, coisa que não se via desde o início da década. Porque essa ainda discreta, mas provavelmente crescente, melhora de ânimos deve ter efeitos políticos. Porque a economia fora do coma muda um pouco os termos do debate do que é necessário mexer na política econômica.
Antes de mais nada, observe-se que, no caso dos números do Datafolha, o sentimento dos brasileiros quanto a desemprego, inflação e poder de compra dos salários ainda é parecido com o de meados de 2014. Trata-se de nível de confiança muito maior que o registrado durante o desastre de 2015 a 2017, mas não é lá grande coisa, embora algo se mova.
Em meados de 2014, último ano de Dilma 1, os brasileiros sentiam os efeitos do começo da recessão. A confiança no futuro da economia vinha na verdade em baixa desde o junho de 2013.
A diferença, agora, neste começo de 2018, é que a confiança vem crescendo e é corroborada pelos primeiros efeitos visíveis da recuperação econômica, evidente desde fins do ano passado. Visíveis com lupa, mas visíveis.
Sim, o crescimento da indústria, de 2,5% no ano passado, nem de longe compensa a destruição das fábricas desde 2014. A produção industrial no final de 2017 ainda era quase 15% menor do que no final de 2013. Isso é destruição de bombardeios de guerra.
A taxa de desemprego é ainda quase o dobro da registrada em 2014. Se tudo der certo, não vai chegar a um nível aceitável antes de 2021 ou 2022.
O aumento real médio dos salários neste ano não deve ser grande coisa, pois em 2017 a renda do trabalho se beneficiou especialmente da queda grande e inesperada da inflação. Neste ano, a inflação deve subir um tico, e os reajustes nominais serão menores. O aumento da renda total do trabalho vai vir do crescimento do número de pessoas empregadas. De resto, dificilmente o mercado de trabalho será menos precário do que em 2016, por exemplo: não deve haver criação de empregos formais suficientes para compensar os danos.
Portanto, trata-se uma recuperação em meio a ruínas. Como em filmes do pós-Segunda Guerra, vê-se a vida voltar ao normal em cidades de prédios destruídos por bombas e o povo sujeito a racionamento de comida.
Dado que a situação econômica é muito frágil e o governo do Brasil está quebrado, há o risco de choques externos ou tumulto político colocarem tudo a perder. Mas, por ora, é preciso pensar a vida no pós-guerra. Tende a ser diferente.
02 de fevereiro de 2018
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
Dada a ruína que ainda é fácil e doloroso observar nas ruas e nas estatísticas, ainda há quem se insulte com o comentário a respeito da reanimação dos brasileiros, captada em todas as pesquisas.
Por que então interessa notar o fenômeno da confiança em alta casada com a recuperação, nanoscópica mas disseminada agora por quase toda a economia?
Porque essa consonância de ânimos e notícias melhores é novidade, coisa que não se via desde o início da década. Porque essa ainda discreta, mas provavelmente crescente, melhora de ânimos deve ter efeitos políticos. Porque a economia fora do coma muda um pouco os termos do debate do que é necessário mexer na política econômica.
Antes de mais nada, observe-se que, no caso dos números do Datafolha, o sentimento dos brasileiros quanto a desemprego, inflação e poder de compra dos salários ainda é parecido com o de meados de 2014. Trata-se de nível de confiança muito maior que o registrado durante o desastre de 2015 a 2017, mas não é lá grande coisa, embora algo se mova.
Em meados de 2014, último ano de Dilma 1, os brasileiros sentiam os efeitos do começo da recessão. A confiança no futuro da economia vinha na verdade em baixa desde o junho de 2013.
A diferença, agora, neste começo de 2018, é que a confiança vem crescendo e é corroborada pelos primeiros efeitos visíveis da recuperação econômica, evidente desde fins do ano passado. Visíveis com lupa, mas visíveis.
Sim, o crescimento da indústria, de 2,5% no ano passado, nem de longe compensa a destruição das fábricas desde 2014. A produção industrial no final de 2017 ainda era quase 15% menor do que no final de 2013. Isso é destruição de bombardeios de guerra.
A taxa de desemprego é ainda quase o dobro da registrada em 2014. Se tudo der certo, não vai chegar a um nível aceitável antes de 2021 ou 2022.
O aumento real médio dos salários neste ano não deve ser grande coisa, pois em 2017 a renda do trabalho se beneficiou especialmente da queda grande e inesperada da inflação. Neste ano, a inflação deve subir um tico, e os reajustes nominais serão menores. O aumento da renda total do trabalho vai vir do crescimento do número de pessoas empregadas. De resto, dificilmente o mercado de trabalho será menos precário do que em 2016, por exemplo: não deve haver criação de empregos formais suficientes para compensar os danos.
Portanto, trata-se uma recuperação em meio a ruínas. Como em filmes do pós-Segunda Guerra, vê-se a vida voltar ao normal em cidades de prédios destruídos por bombas e o povo sujeito a racionamento de comida.
Dado que a situação econômica é muito frágil e o governo do Brasil está quebrado, há o risco de choques externos ou tumulto político colocarem tudo a perder. Mas, por ora, é preciso pensar a vida no pós-guerra. Tende a ser diferente.
02 de fevereiro de 2018
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
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