O juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava-Jato, analisados na primeira instância da Justiça Federal, em Curitiba, afirmou nesta terça-feira que apresentará, na quinta-feira, no Senado, sugestão para adicionar um artigo ao projeto de abuso de autoridade que tramita na Casa.
Moro foi convidado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, autor do projeto, para participar de audiência sobre a proposta, criticada porque poderia servir para limitar a atuação de juízes e do Ministério Público na Lava-Jato. O relator do projeto é o senador Roberto Requião (PMDB).
– Vou fazer uma única sugestão para esse projeto. Eu teria várias sugestões, mas vou fazer a sugestão de um único dispositivo, visando evitar que esse projeto, ainda que eventualmente bem-intencionado, seja utilizado para intimidação da independência da magistratura. A sugestão que vou apresentar é a inclusão de um artigo na parte final dizendo literalmente: ”Não configura crime previsto nesta lei a mera divergência na interpretação da lei penal e por si só penal, ou na avaliação de fatos e provas” – disse Moro, ao participar na Maison de France, no Rio, do evento “E agora, Brasil?”, organizado pelo GLOBO e pela Confederação Nacional do Comércio (CNC).
INDEPENDÊNCIA – Moro explicou que a independência do trabalho dos juízes ficaria prejudicada, caso fique caracterizada irregularidade passível de punição quando um juiz de primeira instância tem uma decisão modificada pelo juiz de instância superior.
Além do projeto de abuso de autoridade, que tramita no Senado, também preocupa Moro a proposta que tipifica o crime de responsabilidade para juízes e membros do Ministério Público. Algumas das emendas em discussão na Câmara, na visão de Moro, podem, claramente, criminalizar a diferença de interpretação entre juízes, da mesma forma que promotores e procuradores seriam criminalizados caso a Justiça não aceite denúncias por eles formuladas.
REPÚDIO À PRESSÃO – Nesta terça-feira, os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato de Curitiba divulgaram nota de repúdio ao que chamaram de tentativa de “aterrorizar procuradores, promotores e juízes”, após notícias de que o plenário da Câmara pode apreciar emendas e substitutivo ao projeto das “10 Medidas Contra a Corrupção”, entre elas a introdução do “crime de responsabilidade” para integrantes do Ministério Público e do Judiciário. Segundo os procuradores, a figura do crime de responsabilidade abre a possibilidade para que investigados processem criminalmente os investigadores, gerando “intimidação” e “retaliação”.
A força-tarefa afirmou que deputados e senadores não estão sujeitos a crime de responsabilidade e que a proposta, destinada a integrantes da Justiça e do MP, atenta “contra a independência do exercício da atividade ministerial e judicial. Segundo os procuradores, dizer que juízes e procuradores formam uma “casta privilegiada” ou “intocável” tem o objetivo apenas de manipular a opinião pública, pois eles se sujeitam à responsabilidade civil, criminal, de improbidade administrativa e disciplinar.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – O juiz Sergio Moro demonstra grande capacidade de liderança e mostra invulgar conhecimento de técnica legislativa. Sua sugestão de artigo é primorosa. Os juízes precisam ter independência para analisar a aplicação da lei. Em função das circunstâncias agravantes e atenuantes, que variam de caso a caso, é preciso haver sutileza nos julgamentos. Moro diz que tem outras sugestões, mas fará apenas essa. Não devia proceder assim. Precisa apresentar todas as suas ideias, para que sejam avaliadas pelos parlamentares, porque sua contribuição pode aprimorar bastante o projeto, cuja aprovação é necessária. Abuso de autoridade significa exercício da antidemocracia. (C.N.)
30 de novembro de 2016
Deu em O Globo
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