SÃO PAULO - Ao contrário de quase todo o mundo, não vejo com preocupação a alta nas abstenções e nos votos nulos e em branco registrada neste pleito. Penso até que isso é um sinal de que vivemos na normalidade democrática, o que é positivo.
Em primeiro lugar, o comparecimento é algo que varia mesmo em qualquer nação do mundo. Taxas típicas em locais onde o voto não é obrigatório flutuam entre 50% e 90%. Eleições locais tendem a ter menos participação que as nacionais.
No caso específico do Brasil, dado que o comparecimento às urnas é em tese obrigatório, parte do que seria abstenção acaba se convertendo em brancos e nulos. Mas o eleitor é um bicho esperto, que aprende. Já entendeu que pode deixar de votar e depois regularizar sua situação pagando uma multa módica.
Outro ponto digno de nota é que nossa burocracia é ruim. Contabilizamos como ausente até quem já morreu, mas não teve o óbito comunicado à Justiça Eleitoral. Cidades que fizeram o recadastramento apresentam índices de não comparecimento bem menores do que aquelas que estão com os dados envelhecidos.
A questão central, porém, é que não há nenhum problema moral ou prático em anular o voto ou deixar de comparecer. O pleito vale do mesmo jeito. É preciso ressaltar apenas que, ao não votar, o eleitor também está tomando uma posição política, em geral favorável ao "statu quo".
O que me intriga é a patrulha em favor do voto consciente, quando se considera que, do ponto de vista puramente racional, a decisão de não votar pode ser a mais sensata. Como em qualquer colégio eleitoral suficientemente grande a chance de cada sufrágio singular determinar o resultado é desprezível, o investimento em deslocar-se até a urna só supera o custo se o cidadão extrair satisfação pessoal do ato de votar. Muitos de fato têm prazer ao definir os rumos da nação, mas esse está longe de ser um sentimento universal.
08 de outubro de 2016
Hélio Schwartsman, Folha de SP
Em primeiro lugar, o comparecimento é algo que varia mesmo em qualquer nação do mundo. Taxas típicas em locais onde o voto não é obrigatório flutuam entre 50% e 90%. Eleições locais tendem a ter menos participação que as nacionais.
No caso específico do Brasil, dado que o comparecimento às urnas é em tese obrigatório, parte do que seria abstenção acaba se convertendo em brancos e nulos. Mas o eleitor é um bicho esperto, que aprende. Já entendeu que pode deixar de votar e depois regularizar sua situação pagando uma multa módica.
Outro ponto digno de nota é que nossa burocracia é ruim. Contabilizamos como ausente até quem já morreu, mas não teve o óbito comunicado à Justiça Eleitoral. Cidades que fizeram o recadastramento apresentam índices de não comparecimento bem menores do que aquelas que estão com os dados envelhecidos.
A questão central, porém, é que não há nenhum problema moral ou prático em anular o voto ou deixar de comparecer. O pleito vale do mesmo jeito. É preciso ressaltar apenas que, ao não votar, o eleitor também está tomando uma posição política, em geral favorável ao "statu quo".
O que me intriga é a patrulha em favor do voto consciente, quando se considera que, do ponto de vista puramente racional, a decisão de não votar pode ser a mais sensata. Como em qualquer colégio eleitoral suficientemente grande a chance de cada sufrágio singular determinar o resultado é desprezível, o investimento em deslocar-se até a urna só supera o custo se o cidadão extrair satisfação pessoal do ato de votar. Muitos de fato têm prazer ao definir os rumos da nação, mas esse está longe de ser um sentimento universal.
08 de outubro de 2016
Hélio Schwartsman, Folha de SP
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