Vinte e cinco milhões de brasileiros não compareceram para votar. Isso é uma população maior do que a da Austrália. Além disso, há os votos brancos e nulos, que só nas capitais somaram 3,7 milhões. O silêncio dos que não quiseram escolher nas eleições precisa ser ouvido. Sempre há eleitores que preferem ficar à parte, erram no momento do voto ou anulam, mas um dos recados de domingo foi o desalento.
O eleitor tem toda razão de estar descontente. Há muitos motivos para desilusão, e o país está no meio de uma crise entre representantes e representados. No mundo inteiro, há desencanto com os processos políticos tradicionais. O poder está encastelado, dominado por oligarquias partidárias, sem capacidade de entender a velocidade de transformação do mundo atual. No Brasil, há tudo isso e mais o que temos sabido nos últimos anos das tenebrosas transações dos políticos para financiar suas campanhas e, em muitos casos, enriquecer pessoalmente.
A democracia brasileira precisa ouvir esse silêncio. A alienação eleitoral formada por esses ausentes e pelos votos nulos e brancos chegou a 43,14% em Belo Horizonte. Minas sempre foi estado em que se debate política de forma acalorada. O desinteresse é preocupante. Os índices chegaram a 42% no Rio, 38% em São Paulo e Porto Alegre. Na média do Brasil, ficou em 30%.
As urnas deste fim de semana deram vários recados ao Brasil. Um deles foi endereçado ao PT. A derrota do partido foi enorme e foi nacional. Se sua direção continuar falando aos militantes com o mesmo discurso autocomplacente de que é vítima das elites, da mídia, do Ministério Público e do Juiz Sérgio Moro, não sairá do lugar. O militante pode se sentir muito confortado com a explicação persecutória, mas o mais eficiente do ponto de vista político-eleitoral é a análise sincera do problema. O PT precisa de autocrítica e de estratégia de superação e renovação. O risco é achar que basta terceirizar suas culpas, encontrando um inimigo externo, e esperar que uma nova candidatura de Lula resgate o partido da crise.
O PT foi o protagonista de vários escândalos políticos recentes, principalmente os maiores — Mensalão e Lava-Jato. Foram para a prisão três dos últimos tesoureiros e ex-ministros poderosos. O ex-líder no Senado do último governo foi preso por ordem do Supremo e fez uma devastadora delação premiada. Está evidente que culpar os inimigos não explica os fatos. Não é o único partido envolvido com os escândalos de corrupção, mas foi atingido em cheio.
Além disso, o partido que nos governou por mais de 13 anos levou o país à mais devastadora crise econômica das últimas décadas, com 12 milhões de desempregados. A soma dos escândalos políticos e da desorganização econômica é forte demais. Diante disso, o PT foi o grande derrotado nestas eleições. Não vai superar o momento culpando os outros por erros que cometeu.
Mas a crise entre eleitores e políticos vai além da decepção com um partido. O desalento é em relação aos políticos em geral. A sensação é de que estão todos envolvidos com os escândalos, de uma forma ou de outra. Além disso, há uma fadiga em relação a um sistema político ineficiente, com partidos demais, que pouco se diferenciam uns dos outros, e com a falta de prestação de contas ao eleitor do que os representantes fazem no exercício do mandato.
Não haverá uma única reforma que enfrente todos estes problemas, mas o Brasil deve se dedicar a aperfeiçoar o sistema político e melhorar a democracia. Deixá-la ser ameaçada pelo desinteresse dos cidadãos pode ser o mais perigoso dos caminhos.
04 de outubro de 2016
Miriam Leitão, O Globo
O eleitor tem toda razão de estar descontente. Há muitos motivos para desilusão, e o país está no meio de uma crise entre representantes e representados. No mundo inteiro, há desencanto com os processos políticos tradicionais. O poder está encastelado, dominado por oligarquias partidárias, sem capacidade de entender a velocidade de transformação do mundo atual. No Brasil, há tudo isso e mais o que temos sabido nos últimos anos das tenebrosas transações dos políticos para financiar suas campanhas e, em muitos casos, enriquecer pessoalmente.
A democracia brasileira precisa ouvir esse silêncio. A alienação eleitoral formada por esses ausentes e pelos votos nulos e brancos chegou a 43,14% em Belo Horizonte. Minas sempre foi estado em que se debate política de forma acalorada. O desinteresse é preocupante. Os índices chegaram a 42% no Rio, 38% em São Paulo e Porto Alegre. Na média do Brasil, ficou em 30%.
As urnas deste fim de semana deram vários recados ao Brasil. Um deles foi endereçado ao PT. A derrota do partido foi enorme e foi nacional. Se sua direção continuar falando aos militantes com o mesmo discurso autocomplacente de que é vítima das elites, da mídia, do Ministério Público e do Juiz Sérgio Moro, não sairá do lugar. O militante pode se sentir muito confortado com a explicação persecutória, mas o mais eficiente do ponto de vista político-eleitoral é a análise sincera do problema. O PT precisa de autocrítica e de estratégia de superação e renovação. O risco é achar que basta terceirizar suas culpas, encontrando um inimigo externo, e esperar que uma nova candidatura de Lula resgate o partido da crise.
O PT foi o protagonista de vários escândalos políticos recentes, principalmente os maiores — Mensalão e Lava-Jato. Foram para a prisão três dos últimos tesoureiros e ex-ministros poderosos. O ex-líder no Senado do último governo foi preso por ordem do Supremo e fez uma devastadora delação premiada. Está evidente que culpar os inimigos não explica os fatos. Não é o único partido envolvido com os escândalos de corrupção, mas foi atingido em cheio.
Além disso, o partido que nos governou por mais de 13 anos levou o país à mais devastadora crise econômica das últimas décadas, com 12 milhões de desempregados. A soma dos escândalos políticos e da desorganização econômica é forte demais. Diante disso, o PT foi o grande derrotado nestas eleições. Não vai superar o momento culpando os outros por erros que cometeu.
Mas a crise entre eleitores e políticos vai além da decepção com um partido. O desalento é em relação aos políticos em geral. A sensação é de que estão todos envolvidos com os escândalos, de uma forma ou de outra. Além disso, há uma fadiga em relação a um sistema político ineficiente, com partidos demais, que pouco se diferenciam uns dos outros, e com a falta de prestação de contas ao eleitor do que os representantes fazem no exercício do mandato.
Não haverá uma única reforma que enfrente todos estes problemas, mas o Brasil deve se dedicar a aperfeiçoar o sistema político e melhorar a democracia. Deixá-la ser ameaçada pelo desinteresse dos cidadãos pode ser o mais perigoso dos caminhos.
04 de outubro de 2016
Miriam Leitão, O Globo
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