Flores, revisões do crescimento, pólen, reuniões de primavera do FMI e do Banco Mundial em Washington DC. O que se projeta para o horizonte próximo é espelho do que há tempos se diz sobre o estado da economia mundial. “Demasiado lenta por tempo demasiado” é como o FMI caracteriza a expansão mundial no seu mais recente World Economic Outlook (“Panorama Econômico Global”).
A dor - as reformas que muitos países ainda têm de fazer - deve curar algumas lástimas, mas o crescimento é pouco, o comércio frustra, e o investimento é flor que não nasce em parte alguma. As incertezas, a geopolítica, as convulsões sociais, as crises políticas matam o investimento mundo afora antes que possa florescer. Antes fosse de plástico. As flores de plástico não morrem.
Acompanhando o FMI, o Peterson Institute for International Economics acaba de divulgar suas projeções para o crescimento das principais economias do planeta, como faz regularmente duas vezes ao ano, durante as reuniões das instituições de Bretton Woods. Trocando em miúdos, a expansão da atividade na Europa não deve passar de 1,5% nos próximos dois anos; o Japão dos samurais monetários e das taxas de juros negativas não haverá de crescer mais do que 0,6% ou 0,7%; a Inglaterra e os EUA, onde as medidas de estímulo monetário excepcionais nos anos posteriores à crise financeira internacional tiveram mais sucesso, deverão expandir-se em ritmo próximo daquele que é considerado seu potencial, ao redor de 2%. Flores desenxabidas.
Na China, o crescimento deve minguar de cerca de 7% em 2015 para uns 6% em 2017. Trata-se, porém, de desaceleração gradual, não de desastre anunciado. É pouco provável que ocorra na China a catástrofe econômica que os mercados e os eternos pessimistas volta e meia enxergam, ainda que a divulgação dos Panama Papers possa vir a causar alguma turbulência política. A China torna-se, cada vez mais, uma economia cujo pilar principal são os serviços, não a indústria ou a produção de bens manufaturados. O setor de serviços, hoje, representa mais da metade da economia chinesa. Tal transformação, contudo, traz consequências negativas para o resto do mundo, ainda que não seja o caso de se cortar pulsos e punhos. Exemplo disso é a evolução recente do volume de importações chinesas de bens: entre 2012 e 2014, o crescimento médio anual das importações chinesas situava-se em torno de 10%; hoje, ele está próximo de zero. Os países que mais sofrem? Em ordem decrescente: a Austrália, a Coreia do Sul, o Japão, o Brasil. Para esses países, a China da atualidade não é flor vibrante, mas erva daninha.
Erva daninha nasce em terra arrasada? O Brasil tornou-se aquele país que se sobressai em qualquer tabela comparativa, recessão seguida de recessão, ano após ano, o desastre. É difícil para quem não viveu a hecatombe brasileira entender como chegamos a esse ponto. Artigo recente de Robert Samuelson publicado no Washington Post para o qual contribuí como fonte afirma: “O que o Brasil ensina é que a promessa dos ‘países emergentes’ não passava de ‘wishful thinking’”. A presunção era a de que esses países, sobretudo os Brics, iriam estreitar o hiato em relação às sociedades mais avançadas. Adotariam novas tecnologias, expandiriam seus sistemas de educação, aprimorariam a administração local.
O que se perdeu nessa visão simplista foi a relevância das diferenças nacionais - dos valores, das instituições, da política - para garantir o crescimento sustentável”. A Índia, de acordo com as projeções do Peterson Institute, deve crescer 7,5% ao ano, em média, no biênio 2016-2017. E vejam que há problemas de sobra na Índia: uma matriz energética precária, governos frágeis sustentados por coalizões esquisitas, grandes gargalos de infraestrutura. Mas está comprometida com o fortalecimento de instituições e políticas que garantam a estabilidade macroeconômica. Está, também, engajada em diálogos intensos com parceiros regionais e com os EUA para aumentar sua inserção global, aprimorando laços de comércio e de investimento direto. A Índia cresce, o Brasil padece.
No Brasil, as flores têm cheiro de morte.
13 de abril de 2016
ECONOMISTA, PESQUISADORA DO PETERSON INSTITUTE FOR INTERNATIONAL ECONOMICS E PROFESSORA DA SAIS/JOHNS HOPKINS UNIVERSITY
Estadão
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