"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 14 de novembro de 2015

O PERFIL (POSSÍVEL) DOS JIHADISTAS DO ESTADO ISLÂMICO, COM A FRANÇA EM DESTAQUE

França sempre foi território fértil para o recrutamento do Estado Islâmico para a guerra do Califado na Síria ou Iraque. Condições financeiras são mais importantes no recrutamento do que religião




À medida que vai sendo libertada informação sobre os ataques a Paris pelas forças de segurança, descobre-se o inevitável: 
alguns dos terroristas são franceses ou terão vindo de outros países europeus, nascidos e criados no continente da liberdade, que decidiram matar os seus concidadãos em nome de um ideal fanático religioso que vê o Ocidente como um inimigo.

Como explicar que cidadãos europeus, nascidos em liberdade e em terra onde a laicidade é razão de Estado, se sintam atraídos pelo Estado Islâmico (EI)? 

Esta é a pergunta que os serviços de informações europeus têm tentado descobrir desde que o EI se tornou uma ameaça visível.

As respostas – as explicações para uma situação com esta complexidade só podem ser no plural – partem da pouca informação do EI que se encontra disponível mas que são claras em diversos pontos – e com a França em particular destaque.

Os seguintes dados foram recolhidos pelo Observador em Outubro de 2014 com base informações das secretas da França, Bélgica, Holanda e Alemanha. 
Apesar de poderem estar desatualizados em termos de pormenor (um ano depois, os serviços de informações têm mais informação sobre o EI), permitem perceber melhor o ‘sucesso’ daquela organização terrorista na Europa:

O EI sempre teve uma forte capacidade de atrair jovens europeus para o combate militar na Síria e no Iraque. 
Dos 10 mil a 12,5 mil combatentes estrangeiros alistados nas fileiras do EI em Outubro, cerca de 2500 eram europeus. Destes a maior parte eram franceses.

Os quatro serviços de informações europeus não conseguiram fazer um perfil rigoroso do jihadista europeu, mas majoritariamente são homens entre os 18 e os 35 anos, mas existiam cada vez mais mulheres entre os 15 e os 25 anos. 

Nota importante: estamos a falar essencialmente de jovens que representam todos os estratos sociais, com predominância para a classe média. 
A questão da pobreza ou desemprego não é assunto neste dossiê.
A forma de recrutamento predominante é simples: a internet e as redes sociais. Sites e páginas nas redes sociais de radicais islâmicos são o primeiro contacto com o EI, existindo depois uma fase de recrutamento presencial que passa, em primeiro lugar, por uma educação religiosa e pela conversão ao Islão.

Contudo, a questão religiosa não é apontada pelos quatro serviços de informações como a questão predominante no sucesso do recrutamento.
Jovens com uma vida sedentária, segura e ‘monótona’, em que a cultura dos video-jogos tem alguma influência – são algumas das explicações que são dadas para a aventura de emigrar para a Síria e contribuir para a construção do Califado.

A questão financeira também é importante – muito mais que a questão religiosa. 
A ‘aventura’ na Síria tem salário e casa garantidos. 
O EI também promete aos homens que terão uma mulher à sua espera. Estas duas questões são consideradas essenciais pelos serviços de informações para aumentar a sua competitividade na área do recrutamento face a outros grupos terroristas como a Al-Qaeda 

O EI tem grande interesse em recrutar europeus com habilitações literárias em áreas técnicas como a medicina, engenharia, eletricidade ou água para reforçar a sua capacidade de povoar os territórios que são conquistados.
Por isso mesmo, os combatentes europeus dividem-se em dois grupos: os combatentes e os que ajudam no povoamento do califado ou em outras áreas técnicas como a propaganda.
Qual o perfil dos jihadistas portugueses? E regressaram?


A pouca informação disponível sobre o EI é uma das razões para o ‘sucesso’ dos seus objetivos militares e terrorista mas também explica a ineficácia no combate às suas ações na Europa. 
A coordenação e troca de informação entre as diferentes secretas europeias tem sido essencial para elaborar o perfil dos combatentes mas também para tentar coordenar os indivíduos que estão sinalizados como elementos suspeitos.

Por exemplo, a troca de informação dentro do Espaço Schengen tem sido crucial para identificar os europeus que partem para a Síria ou para o Iraque para se juntarem às fileiras do EI, sendo que o seu regresso à Europa leva as secretas a seguirem o seu rasto para descobrir células adormecidas.

O mesmo acontece com Portugal, estando essa monitorização a cargo do Serviço de Informações de Segurança (SIS).

O perfil dos jihadistas portugueses é mais difícil de fazer do que dos restantes europeus devido ao seu reduzido número mas também devido ao fato de Portugal não representar um alvo estratégico para o EI.

Das poucas informações que existem na comunidade de informações, é possível dizer o seguinte:

Tratam-se de cidadãos com nacionalidade portuguesa nascidos em território nacional ou noutros países europeus. 
Cidadãos luso-franceses são predominantes.
A idade média situa-se entre 18-40 anos, maioritariamente do sexo masculino e convertidos ao Islão. Contudo, tratam-se de conversões rápidas, recentes e que têm subjacente um laço frágil com o islamismo.
As primeiras deslocações dos combatentes portugueses para a Síria ocorreram em 2011.


Verificaram-se regressos temporários mas a maioria dos regressados, apesar dos laços familiares, não têm uma ligação ou quadro de vida em Portugal que lhes permita ficar em território nacional durante muito tempo.

O SIS avalia a presença de jihadistas em Portugal como uma ameaça real mas com duas perspetivas:
Portugal pode ser um local de recuo para o descanso do guerreiro;
E um vértice de financiamento da organização terrorista


Uma questão importante na avaliação da ameaça do EI para Portugal é o fato de o português ser uma das línguas que o EI usa para efeitos de propaganda.


14 de novembro de 2015
Luis Rosa, in Observador

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