"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

QUANTOS SOMOS? ONDE? PARA ONDE E COMO IREMOS?


Com argumentos fortes de ambos os lados - a favor e contra a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos de idade -, a Câmara dos Deputados aprovou esta semana a continuidade desse debate. 
Os propositores da redução entendem que isso diminuirá a criminalidade no País; os opositores acham que nada mudará, pode até piorar. 
Seja qual for o rumo, o panorama é complicado: uma pessoa é assassinada a cada dez minutos no Brasil (Estado, 13/11/2014); a cada quatro minutos é cometido um estupro (12/11); a polícia mata seis pessoas por dia (11/11); as violências sexuais contra mulheres cresceram 20% em um ano (2/3/15); a cada três minutos um gay sofre violência no País (21/11).

E é complicado, seja qual for o rumo para o qual se volte a atenção. Também no Congresso Nacional, vários Estados, principalmente os de mais altos índices econômicos, que se julgam prejudicados pela "concorrência desleal", se rebelam contra a decisão do Senado de pôr em regime de urgência o projeto de lei complementar que "perdoa" incentivos fiscais sobre o ICMS concedidos por unidades da Federação a empresas, sob o argumento de atraí-las para seu território ou estimulá-las para que ali permaneçam. 
Para que melhor se entenda, a regra tem sido conceder redução de até 30% no recolhimento do ICMS; o comprador do produto paga o valor total com o ICMS integral; mas a empresa beneficiada só recolhe 70%; e esses incentivos significam centenas de bilhões de reais.

E tudo acontece no momento em que Estados e municípios endividados tentam com o governo federal reduzir o indexador de suas dívidas gigantescas, complicando a vida da administração federal, já em palpos de aranha. 
Grande parte dos Estados, com a recessão econômica, já não tem receita suficiente para pagar sua folha corriqueira - o que significa atraso para o funcionalismo, impossibilidade de contratar mais professores, médicos, policiais, etc. 
Como a lei exige aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária - que em princípio se reuniria em abril - para a concessão dos incentivos fiscais, os Estados que os concederam e concedem poderiam perder esse caminho e até ser obrigados a pedir de volta o que concederam em incentivos.

Nesta hora? Pois é, na hora em que o ranking do Instituto Internacional de Finanças (IIF), mantido pelos maiores bancos do mundo, aponta o Brasil como um dos mercados com "política econômica mais vulnerável" (Estado, 31/3). 
Em 2014 a queda dos investimentos no País foi de 4,4%, o crescimento do PIB foi de apenas 0,1% e pode até cair em 2015 - enquanto a China, embora arrefecendo um pouco, cresceu no ano passado 7%; os EUA, 2,2%; a Alemanha 1,6%.Por aqui, até a Região Nordeste está perdendo ritmo (Folha de S.Paulo, 29/3). Talvez isso tenha contribuído para os índices de "ruim e péssimo" do governo federal haverem crescido para 55% ( eram de 11% em outubro de 2014).

E não é só na área econômica que as coisas se complicam. O desemprego subiu para 5,9% em fevereiro - o maior patamar desde 2011 -, segundo o IBGE. E a renda real do trabalhador, descontada a inflação, recuou 0,5%, comparada com a de um ano atrás. Só a indústria eliminou 259 mil vagas em um ano; a construção, 105 mil; os "outros serviços", 165 mil. 
Há governadores, como o do Maranhão, propondo (Estado, 29/3) ao governo federal a cobrança de imposto maior para "detentores de grandes fortunas", de modo a poderem aumentar o seguro-desemprego e dar outras vantagens a pessoas mais pobres. 
Mexe em caixa de marimbondos, certamente, ainda mais quando o Banco Central admite que a inflação "vai estourar o teto fixado na legislação" (FP, 27/3).

Onde encontrar, em momento tão delicado, consenso para uma questão difícil como a dos apoios financeiros a campanhas eleitorais dos partidos? Já há certa indignação - em hora de tantas dificuldades - com a triplicação no Congresso dos recursos previstos no Orçamento-Geral da União de 2015 para o Fundo Partidário - de R$ 289,56 milhões para R$ 867,56 milhões (Estado, 30/3). 
Quem achará, então, o formato para as contribuições de empresas privadas para as campanhas eleitorais de partidos? 
Pode progredir a proposta de implantar o recall - o poder de retirar o mandato concedido a um representante eleito -, como lembrou neste jornal, em artigo (31/3), o jornalista Fernão Lara Mesquita? 
Ou os governantes da hora vão simplesmente enfrentar a maioria parlamentar, que não quer mexer nas fontes de financiamento de campanhas eleitorais?

Seria possível seguir ainda por muitos caminhos nos quais trafega a insatisfação da sociedade - na falta de saneamento básico em 40% dos domicílios brasileiros; na educação precária, com uma taxa alarmante de pessoas que permanecem analfabetas ou semialfabetizadas mesmo frequentando escolas; num sistema de saúde trôpego ante os avanços de epidemias e números recordes como os da dengue e da tuberculose; nas macrorreformas urbanas, que nem ao papel chegam; na ausência de aterros sanitários adequados na maioria dos municípios; na redução do valor proporcional da aposentadoria para quem recebe mais de um salário mínimo (embora possa até ter contribuído pelo máximo durante décadas); na permanência de mais de 40 milhões de pessoas no nível de pobreza (apesar de 40 milhões receberem o Bolsa Família) ou na pobreza extrema.

Muito mais ainda poderia ser dito. Mas até a discussão vai ser mais difícil, com a notícia de que o IBGE vai cancelar a contagem da população prevista para 2016 (a de 2015 já fora adiada), pelo fato de o ajuste do governo federal ter reduzido suas verbas (Estado, 26/3). 

Como vamos saber quantos somos, onde, em que situação, quem está migrando, para onde, e assim por diante? A última contagem foi em 2010. Como saberão os municípios quanto receberão do Fundo de Participação se, ao que parece, só haverá nova contagem em 2020?

Ainda haverá muito pano para mangas.
03 de abril de 2015
Washington Novaes

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