"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

NO RIO, BEIJA-FLOR VENCE COM "CARNAVAL DO DITADOR"

Escola faturou seu 13º título ao levar para a Sapucaí homenagem à África. Enredo foi financiado pela ditadura brutal da Guiné Equatorial


O enredo da Beija-Flor homenageia o país do continente africano, Guiné Equatorial
O enredo da Beija-Flor homenageia o país do continente africano, Guiné Equatorial - Daniel Ramalho/VEJA.com

















Com um enredo que saudou a Guiné Equatorial, a Beija-Flor venceu o Carnaval deste ano no Rio de Janeiro. Foi o 13º título da agremiação de Nilópolis, uma das mais tradicionais do Estado, que amargava um jejum de quatro anos sem vitória. Numa disputa apertada, a escola terminou com 239,9 pontos, três décimos à frente do Salgueiro (239,6). A Viradouro foi rebaixada para a divisão de acesso.
O financiamento do desfile deste ano por uma ditadura representa uma variação de outras formas condenáveis de custeamento da festa carnavalesca nos barracões das escolas de samba. Dinheiro ilícito do tráfico de drogas e do jogo do bicho também já se transformou em fantasias e carros alegóricos. 
A origem dos recursos da Beija-Flor não anula, de forma alguma, a bonita festa que levantou a torcida na Marquês de Sapucaí. A escola foi a terceira a desfilar no Sambódromo, na madrugada de terça-feira. O samba-enredo da escola azul e branco foi batizado Um griô conta a história: um olhar sobre a África e o despontar da Guiné Equatorial. Caminhemos sobre a trilha de nossa felicidade. O griô é um sábio ancião que guarda a história e a reproduz através das gerações. 
Mauro Pimentel/VEJA.comDitador da Guiné Equatorial assiste ao desfile da Beija-Flor na Sapucaí, no Rio
Ditador da Guiné Equatorial, Teodoro Mbasogo, assiste ao desfile da Beija-Flor na Sapucaí, no Rio de Janeiro
A ironia do enredo é que, para exaltar a nação africana, escolheu-se exatamente a que tem um povo oprimido por seu governante. Há 35 anos no poder, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é acusado de brutais violações dos direitos humanos, com tortura e morte de opositores. Segundo reportagem do jornal O Globo, o ditador captou 10 milhões de reais para a Beija-Flor.
Nesta quarta, depois da conquista do título, o diretor artístico de Carnaval da escola, Fran Sérgio Oliveira, falou sobre a controvérsia: “As pessoas juntam enredo com política, o que é uma grande bobagem. Além disso, o povo da Guiné Equatorial é apaixonado por seu presidente. É uma ditadura? É. Mas é benéfica para a população do país”, disse. Segundo o jornal.
Uma comitiva de 40 autoridades do país africano esteve na Marquês de Sapucaí para a segunda noite de desfiles – e não economizou no luxo. Liderado pelo filho de Mbasogo, o vice-presidente da Guiné Equatorial, Teodorín Obiang, o grupo reservou os dois últimos andares do Copacabana Palace, o mais caro do Rio de Janeiro. Mbasogo também acompanhou o desfile.
A temática africana é recorrente na história de vitórias da Beija-Flor, que levou o título em 2007 com o samba-enredo Áfricas: do Berço Real à Corte Brasiliana. Em 1983 e em 1978, sob a batuta do carnavalesco Joãosinho Trinta, a escola venceu com os enredso A Grande Constelação das Estrelas Negras e A Criação do Mundo na Tradição Nagô, respectivamente.
Ditadura – Mbasogo comanda o país desde 1979, quando tomou o poder por meio de um golpe de Estado. Desde então, ele pôs a principal riqueza do país, a indústria petrolífera, a serviço do próprio enriquecimento. Seguindo o padrão de regimes tirânicos, a Guiné Equatorial se apresenta como democracia constitucional, mas as eleições realizadas no país são marcadas pela fraude, como demonstram os resultados: no pleito de 2009, Mbasogo venceu com 95,8% dos votos.
A riqueza oriunda do petróleo, que encheu os cofres do governo, obviamente não foi destinada a melhorar a vida da população. Vários programas de auxílio ao país que eram mantidos pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional foram cortados no início da década de 1990 devido à corrupção e má gestão. 
Para assumir o poder, Mgasogo passou por cima do tio Francisco Macias Nguema. Da independência, em 1968 até sua derrubada, em 1979, ele espalhou o terror no país, ordenou o assassinato de milhares de opositores e forçou um terço da população a fugir do país. Quando passou a comandar a Guiné Equatorial, Mgasogo promoveu um julgamento sumário do tio e mandou executá-lo.

Em 2003, o ditador declarou oficialmente ter conexões permanentes com Deus, o que lhe permitia matar qualquer pessoa que quisesse, sem dar explicações para ninguém – e sem ir para o inferno.
18 de fevereiro de 2015
Veja online

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