Carta de Formulação e Mobilização Política - Sexta-feira, 31 de janeiro de 2014
Em 2013, o governo Dilma gastou como nunca, investiu uma ninharia e produziu o menor superávit em quatro anos. A gestão das finanças é um dos melhores indicadores da boa governança de um país. Tratar com zelo o dinheiro pago pelos contribuintes e dar-lhe a melhor aplicação é obrigação do administrador comprometido com o bem-estar da população. Quando isso não acontece, é sinal de que o governo de turno desdenha dos cidadãos.
Governo que gasta muito é como casa desarrumada. Governo que investe pouco é como família que não constrói seu futuro. O que na economia doméstica podem ser meros pecadilhos, na gestão de um país é falha grave. Mas assim tem sido na administração das contas públicas brasileiras pela gestão Dilma.
Ontem, o Tesouro Nacional divulgou os números finais da contabilidade oficial de 2013. Em linhas gerais, o governo federal gastou como nunca, investiu uma ninharia e produziu o menor saldo fiscal desde 2009, ano de crise econômica brava. Mesmo com tudo isso, porém, a equipe econômica petista se deu por satisfeita.
O superávit do governo central fechou em R$ 77 bilhões, levemente acima dos R$ 73 bilhões acordados – recorde-se que, no início do processo, quando da proposição da lei orçamentária de 2013, a meta fiscal havia sido definida em R$ 83 bilhões, valor depois substancialmente reduzido.
Parece incrível que, a despeito de toda a desconfiança, o governo Dilma tenha conseguido entregar o que, a duras penas, prometeu. E é incrível mesmo. Dos R$ 77 bilhões do superávit, a economia efetiva de despesas representou apenas 21% do resultado, conforme calculou O Estado de S.Paulo. Ou seja, o esforço fiscal real da gestão petista não passou de R$ 16 bilhões no ano.
Tudo o mais (equivalente a R$ 61 bilhões) veio de receitas extraordinárias e pagamentos de estatais: R$ 22 bilhões vieram de concessões (principalmente os bônus do campo de Libra), R$ 21,8 bilhões de débitos de empresas renegociados com o fisco e R$ 17 bilhões de dividendos pagos por estatais e, notadamente, pelo BNDES. Assim fica fácil...
O superávit de 2013 equivale a 1,6% do PIB. Foi o menor em quatro anos e quase 13% inferior ao de 2012. Não custa lembrar que, em 2011, primeiro ano da atual gestão, o saldo fiscal havia sido de 3,1% do PIB. Ou seja, economizamos cada vez menos, sem ver este dinheiro ser empregado em prol do desenvolvimento do país e da melhoria das condições de vida da população.
A coisa fica mais feia quando se decompõe o resultado. O governo torrou dinheiro como nunca no ano passado: o equivalente a 19% do PIB, patamar de gastança nunca antes atingido. No mesmo período, as despesas com investimento representaram mero 1,3% do PIB, mesmo assim anabolizadas pelos subsídios ao Minha Casa, Minha Vida.
No ano passado, as despesas do governo aumentaram R$ 109 bilhões, caminhando para atingir a casa do trilhão. Isso significa alta nominal de 13,6% na comparação com o resultado de 2012, enquanto as receitas aumentaram 11,2%. A pergunta que fica é: onde foi parar toda esta dinheirama, resultante dos tributos que pagamos todos os dias?
A maior parte serviu para bancar o aumento de despesas sociais, das quais o governo tem dificuldade de se desvencilhar. Mas uma parcela robusta – R$ 31,7 bilhões – foi torrada em despesas correntes. Mas, e os investimentos? Os investimentos ficaram com módicos R$ 3,8 bilhões deste bolo, com alta de magro 0,5% sobre 2012, descontada a inflação.
O governo petista, porém, não parece considerar que seu desempenho no manejo do dinheiro pago pelos contribuintes tem sido uma lástima completa. Só agora “parece convencido de que o rigor fiscal é um sinal importante para readquirir credibilidade junto aos agentes econômicos, melhorar as expectativas e desafogar a política monetária”, conforme escreve hoje Claudia Safatle no Valor Econômico, depois de entrevistar Guido Mantega.
A gestão das finanças é um dos melhores indicadores da boa governança de um país. Tratar com zelo o dinheiro que é arrecadado dos contribuintes e dar-lhe a melhor aplicação é obrigação do administrador comprometido com o bem-estar da população. Quando isso não acontece, é sinal de que o governo de turno preocupa-se apenas com seus pantagruélicos interesses e desdenha dos cidadãos.
Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica estão disponíveis na página do Instituto Teotônio Vilela
Maquiagem federal
Inflado por receitas extraordinárias, superavit primário atinge R$ 77 bilhões em 2013, mas não anima os investidores. Saldo é o pior desde 2009 e reforça a gastança desenfreada do governo. Despesas aumentaram 13,5% em relação a 2012
O governo bem que tentou dar um tom ufanista ao superavit primário de 2013, que atingiu R$ 77,1 bilhões ou 1,6% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas a economia para o pagamento de juros da dívida pública não animou ninguém. Além de o resultado ter sido o pior desde 2009, o número apresentado pelo secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, cuja credibilidade está no chão, foi alcançado basicamente por causa de receitas extraordinárias. Pelos cálculos dos especialistas, R$ 62,6 bilhões, ou 80% do total, foram conseguidos por meio de verbas que não se repetirão.
O correto, disseram os analistas, seria obter o superavit por meio de corte de gastos. Mas o que se viu foi exatamente o contrário. As despesas, por causa do inchaço da máquina pública, avançaram 13,5% em relação a 2012, totalizando R$ 914 bilhões. O crescimento foi superior ao salto das receitas, de 12,5%, que bateram em R$ 991,1 bilhões, já incluídos os recursos extraordinários. “Diante desses números, não há como se falar em ajuste fiscal consistente”, disse José Matias-Pereira, professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB).
No entender do secretário do Tesouro, não há o que reclamar. O superavit, segundo ele, ficou R$ 2,1 bilhões acima dos R$ 75 bilhões antecipados no início do mês pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para acalmar “os nervosinhos” e R$ 4,1 bilhões além da meta oficial, de R$ 73 bilhões. “Esse resultado, para nós, é importante, pois auxilia no equilíbrio macroeconômico do país (o Banco Central está aumentando as taxas de juros) e reforça o esforço para a melhoria do indicador fiscal”, afirmou.
Augustin destacou ainda que o número foi alcançado “de forma positiva”, e o saldo de dezembro, de R$ 14,5 bilhões, foi o segundo melhor da série histórica. Para cutucar os pessimistas, ele adiantou que o resultado acumulado de novembro, dezembro e janeiro será o maior da história.
Descalabro
O governo bem que tentou dar um tom ufanista ao superavit primário de 2013, que atingiu R$ 77,1 bilhões ou 1,6% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas a economia para o pagamento de juros da dívida pública não animou ninguém. Além de o resultado ter sido o pior desde 2009, o número apresentado pelo secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, cuja credibilidade está no chão, foi alcançado basicamente por causa de receitas extraordinárias. Pelos cálculos dos especialistas, R$ 62,6 bilhões, ou 80% do total, foram conseguidos por meio de verbas que não se repetirão.
O correto, disseram os analistas, seria obter o superavit por meio de corte de gastos. Mas o que se viu foi exatamente o contrário. As despesas, por causa do inchaço da máquina pública, avançaram 13,5% em relação a 2012, totalizando R$ 914 bilhões. O crescimento foi superior ao salto das receitas, de 12,5%, que bateram em R$ 991,1 bilhões, já incluídos os recursos extraordinários. “Diante desses números, não há como se falar em ajuste fiscal consistente”, disse José Matias-Pereira, professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB).
No entender do secretário do Tesouro, não há o que reclamar. O superavit, segundo ele, ficou R$ 2,1 bilhões acima dos R$ 75 bilhões antecipados no início do mês pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para acalmar “os nervosinhos” e R$ 4,1 bilhões além da meta oficial, de R$ 73 bilhões. “Esse resultado, para nós, é importante, pois auxilia no equilíbrio macroeconômico do país (o Banco Central está aumentando as taxas de juros) e reforça o esforço para a melhoria do indicador fiscal”, afirmou.
Augustin destacou ainda que o número foi alcançado “de forma positiva”, e o saldo de dezembro, de R$ 14,5 bilhões, foi o segundo melhor da série histórica. Para cutucar os pessimistas, ele adiantou que o resultado acumulado de novembro, dezembro e janeiro será o maior da história.
Descalabro
O superavit foi inflado, sobretudo, pelos R$ 15 bilhões oriundos da concessão do Campo de Libra e pelos mais de R$ 20 bilhões do Refis, programa de renegociação de dívidas atrasadas. Os dividendos pagos por estatais, mesmo 38% menores do que em 2012, também reforçaram o caixa do Tesouro e ajudaram na criatividade de Augustin. Segundo o professor Matias-Pereira, é preocupante a forma como o governo vem tratando um indicador tão importante para a confiança no país.
Ele lembrou que, inicialmente, a meta cheia de superavit, incluindo estados e municípios, era de 3,1% do PIB, conforme especificado na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Depois, reduziu-se o objetivo para 2,2%. Agora, dificilmente, se chegará a 2%, mesmo com a contribuição de outras esferas da Federação. “Infelizmente, optou-se por uma série de abatimentos no superavit, como as desonerações da folha salarial e as despesas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)”, destacou o professor da UnB, ressaltando, que, pelas suas contas, a economia pura para o pagamento de juros da dívida foi de apenas 0,2% do PIB em 2013.
Repetindo o mantra de que tudo está na mais perfeita ordem, o secretário do Tesouro desdenhou dos que o acusam de ser o maquiador oficial da Esplanada dos Ministérios. “O critério (para o cálculo do superavit) primário é econômico. Não há outra consideração que não seja técnica e econômica”, assinalou. E disse mais: “As receitas com concessões serão contínuas nos próximos anos e poderão ser em volumes maiores”. O governo acredita que, neste ano, conseguirá avançar nas transferências de estradas para o setor privado e na privatização de portos e ferrovias.
Conforme Matias-Pereira, as falas de Augustin só contribuem para reduzir a confiança no país. “Esse tipo de declaração só piora a credibilidade do Brasil. Falta humildade ao governo para reconhecer que está recorrendo a expedientes que não condizem com as boas práticas contábeis”, disse. Na opinião do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, ninguém mais se surpreende com a criatividade do governo para mostrar uma saúde que as contas públicas não têm. “O Tesouro está sempre pronto para apresentar algo novo. Com certeza, os truques vão continuar em 2014. Disso, ninguém duvida”, frisou.
Não à toa, o país deverá ser rebaixado pela agências de classificação de risco nos próximos meses. Como a população será a grande prejudicada, o coordenador do Movimento Brasil Eficiente, Paulo Rabello de Castro, afirmou que a hora é de despertar em relação ao aumento e a péssima qualidade dos gastos públicos. “A sociedade produtiva que paga impostos está sem sangue, pregada na cruz e de cabeça para baixo. Enquanto isso, a gastança do governo se mantém desenfreada, coberta por receitas extraordinárias”, enfatizou.
“É preciso impor limites a esse quadro assustador. Os gastos deveriam ser com investimentos produtivos, para melhorarem a condição de vida no país”, disse.
ROSANA HESSEL Correio Braziliense
02 de fevereiro de 2014
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