A última rodada do Programa Internacional de Avaliação dos Alunos (Pisa), divulgada no final do ano passado, mostra que o Brasil continua firme no ranking entre os países com pior desempenho em educação. E os melhores países continuam os mesmos, com algumas mudanças de posição. As sete primeiras são ocupadas pelos asiáticos. A diferença entre os alunos do país mais bem colocado - China, Xangai - e os do Brasil é de mais de 200 pontos, ou seja, o equivalente a cinco anos escolares. É com países desse naipe educacional que competimos na arena internacional.
É fato que não se podem esperar grandes mudanças a cada aplicação do Pisa. Para isso acontecer teria sido necessário um esforço gigantesco dos brasileiros, o que não ocorreu. O que chama mesmo a atenção, contudo, é o silêncio e o alheamento dos responsáveis pela política econômica e das lideranças empresariais diante da situação educacional do Brasil em relação ao restante do mundo. Afinal, o Pisa é a ponte que liga a educação à economia do conhecimento.
Concebido na virada do século por especialistas reunidos pela Organização de Cooperação para Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Pisa logo se tornou um benchmark, o termômetro da qualidade internacional da educação. A cada ano é maior o número de países que adere a esse teste, aplicado a cada três anos e que é original em várias dimensões.
A característica mais importante do Pisa é a de que a avaliação afere habilidades consideradas essenciais para o sucesso do jovem na escola, no mercado de trabalho e na vida da economia do século 21. O teste está para a sociedade do conhecimento da mesma forma que saber ler e escrever estava para os primórdios da Revolução Industrial. É preciso ressaltar que o Pisa não é um teste escolar, ele mede a capacidade das pessoas de mobilizar conhecimentos das três disciplinas escolares básicas - Linguagem, Matemática e Ciências - para lidarem com informações e problemas do mundo real. É tudo o que um empresário gostaria de saber antes de recrutar um novo funcionário. O Pisa faz isso.
O Pisa também traz outro alerta importante para o setor produtivo: a escola deve preparar o aluno para continuar a estudar e para resolver os problemas concretos do mundo. Mas para isso é preciso existir um ensino rigoroso das disciplinas básicas no ensino fundamental. Profissionalização é assunto para o ensino médio e deve ser realizada em instituições com vocação específica, não relegadas a status inferior em escolas de educação geral.
Os dados colhidos na aplicação dos testes também revelam a importância da disciplina, da pontualidade e do respeito aos professores para o sucesso escolar dos alunos. Crianças que faltam ou se atrasam já na pré-escola se situam entre as de pior desempenho mais tarde. A escola não é fábrica. A educação escolar, contudo, deve ser também educação para a cidadania e para os valores do mundo do trabalho.
Estudos realizados com alunos que fizeram o primeiro teste do Pisa, em 2003, comprovam a sua validade preditiva quanto ao desempenho acadêmico e profissional dos jovens nas economias globalizadas. Não por acaso, em pouco menos de dez anos o Pisa virou uma espada de Dâmocles pairando sobre os países industrializados, levados a ajustar os seus sistemas educativos aos resultados do teste.
Da última rodada do Pisa participaram 65 países. O Brasil ficou entre os seis e/ou os oito piores, dependendo da disciplina considerada - Linguagem, Matemática e Ciências. O mais preocupante é a quantidade de alunos brasileiros abaixo do mínimo, o nível 2 - em Matemática são mais de 67%. Nos países da OCDE, com os quais competimos comercialmente, 23% dos alunos estão abaixo desse nível.
Outro dado que deveria preocupar as elites brasileiras: em média, 12,6% dos alunos dos países da OCDE alcançam o patamar superior da prova. Esse porcentual no Brasil é de apenas 0,8%. Não cuidamos das categorias de base nem do grupo de elite. A média dos alunos de nossas escolas particulares fica a uma boa distância abaixo da dos países mais desenvolvidos. E por aí vai.
O Brasil participa do Pisa desde a primeira rodada e tem mostrado alguns avanços. Mas a maior parte deles não se deve a melhoras na educação, e sim na economia. O melhor desempenho econômico das famílias e a escolaridade dos pais estão entre os fatores que explicam o avanço dos alunos. No País é a economia que melhora a educação, e não vice-versa. Nada que justifique qualquer demonstração de euforia.
O comentário mais interessante sobre os resultados dos Estados Unidos no Pisa de 2012 veio do economista Erik Hanushek, da Universidade Stanford. Disse ele: "Nossa economia ainda continua forte porque temos um bom sistema econômico capaz de superar as deficiências de nosso sistema educativo".
Mudar a educação não é fácil. Se fosse, muitos países teriam um sistema educacional muito melhor. Mas os caminhos para que isso ocorra são conhecidos e são muito diferentes dos que vimos trilhando ou do que está delineado no Plano Nacional da Educação (PNE). Em qualquer país, uma reforma educativa requer o estabelecimento de um consenso e uma mobilização em torno de ideias básicas e cientificamente fundamentadas, como currículo, avaliação, formação e carreira de professores e gestão. Requer foco e capacidade de definir prioridades, sem açodamento. E requer também uma enorme capacidade de implementação adequada, no caso, ao nosso modelo federalista de governo.
Se Erik Hanushek teme que a economia americana não venha a se tornar robusta o suficiente para financiar um sistema educacional que se situe na média do dos países da OCDE, o que diria ele da economia brasileira? Penso que não compartilharia a euforia que o ministro da Educação do Brasil tem demonstrado.
27 de janeiro de 2014
João Batista Araujo Oliveira é presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB).
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