O aumento surpreendentemente rápido do déficit da Previdência Social, de cerca de 18% entre 2012 e 2013, deixa evidente o grave risco que a atitude contemporizadora do governo Dilma em relação às necessárias mudanças no sistema previdenciário traz para seu equilíbrio no presente e para o bem-estar das gerações futuras. Como mostrou o Estado (21/1), o rombo no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que se mantinha relativamente estável, voltou a crescer em 2013, quando alcançou R$ 49,9 bilhões. O valor deve ter surpreendido até mesmo técnicos do governo, que esperavam um resultado semelhante ao de 2012, quando o déficit foi de R$ 42,2 bilhões.
Desde o início do ano passado, o ministro da Previdência, Garibaldi Alves, vinha admitindo que, em razão dos problemas econômicos do País - inflação alta, crescimento lento e deterioração da política fiscal - e das dificuldades cada vez maiores do governo nas relações com sua base no Congresso, seria difícil fazer avançar a reforma previdenciária. As manifestações de rua, iniciadas em junho, acabaram com a pouca disposição do governo de tratar seriamente a questão.
Com adiamentos sucessivos, o País vai perdendo as melhores oportunidades para discutir o problema. O primeiro momento foi quando a economia cresceu aceleradamente. O outro ainda está em curso e decorre da situação confortável do ponto de vista demográfico, pois ainda há muito mais brasileiros em idade ativa do que em idade de se aposentar.
Se nada for feito, o déficit da Previdência crescerá 20 vezes até 2050, de acordo com projeções do próprio governo. O rombo decorrerá do envelhecimento da população. Atualmente, para cada pessoa com mais de 60 anos, há 5,3 pessoas em idade economicamente ativa. Essa é a relação entre pessoas em idade de se aposentar e as que podem trabalhar e contribuir para a Previdência. Com a mudança do padrão demográfico, marcada pelo aumento da população idosa e pela redução da taxa de fecundidade (os brasileiros vivem mais e têm menos filhos), haverá apenas 1,8 pessoa em idade ativa para cada uma em idade de aposentadoria. Se nas condições atuais já é difícil sustentar o sistema, pode-se imaginar como será no futuro, quando a Previdência Social terá muito mais beneficiários e muito menos contribuintes.
Só essa projeção já deveria ser mais do que suficiente para estimular as autoridades e a sociedade a discutir as mudanças necessárias para evitar o comprometimento da qualidade de vida dos jovens das próximas gerações, que, se nada for feito, estarão condenados a grandes sacrifícios e poucos benefícios. Mas, além do futuro ameaçado, o sistema previdenciário enfrenta situações que lhe provocam desequilíbrios no presente e que deveriam estar sendo enfrentados com urgência.
O governo atribui parte do crescimento do déficit no ano passado à quitação, por decisão judicial, de passivos acumulados em exercícios anteriores. Mas a maior parte se deve, efetivamente, ao pagamento de benefícios correntes, alguns dos quais foram reajustados acima da inflação e outros tiveram um crescimento muito rápido.
Dos benefícios concedidos anualmente, 18% são por invalidez, um índice bem maior do que o governo considera "aceitável", de cerca de 10%, como a União Europeia impôs à Grécia como parte de seu programa de ajuste. Se, como pretende o governo, o número das aposentadorias por invalidez for reduzido em 40%, haverá uma substancial economia (no ano passado, por exemplo, uma redução dessas dimensões cortaria os gastos em R$ 20 bilhões).
Para isso, uma das medidas anunciadas é a avaliação mais rigorosa dos pedidos de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez, a exigência de o beneficiário submeter-se a um programa de reabilitação física e de adaptação profissional, bem como sua reavaliação a cada dois anos.
São medidas tópicas e já previstas na legislação. É preciso ir além, revendo-se, por exemplo, o tempo mínimo de contribuição para o usufruto de benefícios e o valor de alguns desses benefícios.
27 de janeiro de 2014
Editorial O Estado de S. Paulo
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