Eles estão como pediram ao diabo.
As capas dos jornais deste fim de semana (e quem é que consegue ir além delas?) tinha para todo mundo. Eles “tiveram acesso” a denúncias de “suposta corrupção” “envolvendo” o PSDB em delitos cometidos ha 20 anos, Marta Suplicy, do PT, em outros de ha 10 reveillons, Gilberto Kassab, do PSD, por mutretas de ha quatro ou cinco, o ubíquo Jorge Murad da Roseana do PMDB, por mamar até no sangue das masmorras sórdidas de madame e mais uma meia dúzia de gatunos menores com ou sem partidos mas todos mamando em mutretas com o concurso de governos e partidos.
A imprensa esforça-se por mostrar-se democrática na sua nulidade. E todo dia a lista se repete. E todo dia a lista cresce. No mais é quem, no meio desse mutuo escoicear, está disposto a se juntar com quem para escoicear o próximo. E daí não passa.
A concorrência entre os “contemplados” é a isca que a canalha usa para rebaixar a vontade dos jornais e televisões de apurar aquilo a que os seus arapongas e aloprados lhes “dão acesso”. Como se um não publicar o outro publica e os Conselhos de Administração sem jornalistas dos jornais exigem "medidas aferíveis de desempenho" (nada desses critérios subjetivos de qualidade de alienados que não se dedicam exclusivamente à nobre arte de “ad value to the shareholder”) e “furo” é o que dá pra medir com régua nesse vago mundo dos escrevinhadores, o desastre se completa.
O resultado é que a imprensa que alardeia que está saneando o país fazendo papel de polícia está mesmo é fornecendo ao partido do "Eu sou, mas quem não é?" o grande liquidificador em que ele trata de moer todas as frutas no mesmo suco malcheiroso de nada diante do qual o poder de optar, que é a única arma de que dispõe o eleitor, fica completamente anulado.
É a mesma receita que eles tiveram a benção de poder aplicar para transformar as esperanças ressuscitadas pela quase zebra da quase condenação dos mensaleiros em num idêntico suco de nada graças à mesma boa “condição objetiva” que se apresentou: a falta de uma liderança das manifestações de junho capaz de expressar em português claro em que elas se diferenciavam da “zona” em que aqueles “black blocs” de encomenda, providencialmente mascarados, transformaram as ruas do país inteiro nos meses que se seguiram até que os ressuscitados do STF enfiassem suas esperanças no saco e voltassem, mudos, para a toca da desesperança.
Uma coisa é consequência da outra, na verdade.
É à imprensa que cabe abrir os novos caminhos. Ou pelo menos indicar os que já estão abertos mas ninguém está vendo. É à imprensa que cabe municiar o cidadão de argumentos até que surja um líder com vontade de gritá-los e capacidade de traduzí-los para as massas.
No jornalismo de CEO, em que os donos das empresas de comunicação abrem mão dessa responsabilidade e os CEOs não estão autorizados a assumí-la nem que surja um com capacidade para fazê-lo, quem pauta os jornais é o governo e, especialmente, as suas polícias, arapongas e aloprados. Ou, quando muito, os governos que estão e os governos que querem estar, alternadamente: amor com amor se paga.
Os jornais, que nasceram para ser ferramentas constitutivas do aparato institucional das democracias tão imprescindíveis que um dos inventores dela dizia que a governos sem jornais ou jornais sem um governo, preferia a segunda opção, transformaram-se, no Brasil do Terceiro Milênio, em meros bonecos de ventríloqüo dos contendores da briga de navalha no escuro que por aqui se trava pelo poder. São armas que atiram a esmo as balas com que eles os carregam para alvejarem-se uns aos outros.
Charles de Gaulle, o estadista que impediu que a França “passasse do chão” depois de cair quase sem resistência nos braços de Hitler e a reergueu para o clube restrito das potências que mandaram no século 20 nos dois períodos em que esteve no primeiro posto da Nação entre o fim da 2a Guerra Mundial e 1969 quando se retirou para morrer, dizia que para governar o país e levá-lo a recuperar um papel condizente com sua história, o sujeito tinha de ter “une certaine idée de la France”.
Para governar um jornal e torná-lo relevante como ele precisa ser para não se tornar dispensável e, como consequência, um mau negócio, é preciso ter “uma certa ideia do Brasil”.
Ainda que o tipo se proíba de propor suas próprias soluções – coisa que, vá lá! – tem ao menos a obrigação de divulgar as que foram testadas e aprovadas por outros povos empenhados na mesma luta que nós para crescer livres de quem lhes chupe o sangue da carótida.
A internet está aí, janela escancarada para o mundo precisando de edição, cobrindo ao vivo e em cores até o que acontece de bom nele. Mas não! O jornalismo de CEO só fala inglês para papaguear termos financeiros em voga junto às fontes dessa especialidade que é encarnada por outros “Chief Executive Officers” e seus interlocutores em “boards” de administradores de empresas que seguem, todos eles, a cartilha do “benchmarking” expressão que significa, literalmente, medir-se tomando por referência o seu semelhante, que é o avesso de ousar e de inovar.
Funciona para fabricar parafusos e outras atividades igualmente demandantes de inovação e insumos culturais.
Para promover a democracia é um desastre porque as respostas estão todas em inglês e como as “fontes” das seções de Política são aqueles nobres senhores de cabelo implantado e pintado que você conhece bem e não falam inglês, o jornalismo de CEO também esquece o seu inglês e, portanto, não ha como escaparmos ao suco de nada, este que, enquanto durar, garante que a canalha não sai do paraíso.
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