O PSDB divulgou, no último dia 17, doze diretrizes para orientar seu futuro programa de mudanças para o país. A oitava delas defende "mais autonomia para estados e municípios, maior parceria da União". Essa parte, como as outras, é equilibrada. Critica, corretamente, as atabalhoadas desonerações tributárias do governo, que causaram perdas aos governos subnacionais, a quem pertence uma parcela do IPI e do imposto de renda.
A proposta do senador Aécio Neves era outra. No dia 18 de novembro, ele obtivera do PSDB a Declaração de Poços de Caldas + 30, a qual propugnava um novo pacto federativo "que signifique responsabilidades e recursos compartilhados de forma mais justa, pelo bem dos brasileiros". No mesmo dia, em sua coluna na Folha de S. Paulo, ele propôs "reverter o desmanche da federação brasileira e o crescente risco de insolvência de estados e municípios, vitimados pela grave concentração, na órbita federal, de recursos e poder". Tradução: mais dinheiro da União para estados e municípios.
Vi de perto movimento semelhante na Assembleia Constituinte. Parlamentares das regiões menos desenvolvidas prometiam redimi-las com transferências da União. As demais pediam o mesmo para aliviar dívidas. Era preciso, diziam, acabar o "pires na mão". Assim, a Constituição de 1988 promoveu a maior transferência de recursos federais da história (44% do imposto de renda e 54% do IPI mais os impostos únicos sobre combustíveis, minerais, transportes e comunicações). Passados 25 anos, as regiões menos desenvolvidas não foram redimidas e todas continuam endividadas. Grande parte do dinheiro virou gasto de é economista pessoal. O "pires" continua na mão.
Nosso federalismo é mal definido desde a República. A ação que derrubou a monarquia se inspirou no federalismo americano de 1787. Até no nome. Tornamo-nos República dos Estados Unidos do Brasil (Constituição de 1891). Aqui, a ideia era reformar o Estado imperial centralista moldado na cultura portuguesa. Nada mudou. Lá, buscou-se evitar a desintegração da confederação de treze estados muito autônomos (as antigas colônias) nascida da independência. A federação americana implicou certa centralização, incluindo a criação do cargo de presidente da República. Os nossos federalistas podem ter pensado em descentralização, mas prevaleceu a cultura de dependência do governo central.
Vem daí a inconsequente repartição das receitas da União em 1988, sem cuidados e sem transferência de encargos. Além disso, decidiu-se elevar os gastos sociais e aumentar a vinculação de receitas a despesas como as da educação. A União perdeu receitas e ganhou novos encargos. A conta não fechava. Era preciso aumentar a carga tributária, mas o IR e o IPI, os dois principais tributos federais, haviam perdido importância. Restou à União pouco mais de 40% e 30% desses impostos, respectivamente. Assim, recorrer a tais impostos exigiria mais do que dobrar as alíquotas. O caminho de menor custo para os contribuintes era apelar para tributos não partilháveis, isto é, as contribuições, que pertencem integralmente á União. A consequência, inevitável, foi a piora da qualidade do sistema tributário.
O senador Aécio acertava ao reivindicar um novo pacto federativo, mas errava ao mirar a redução dos recursos da União. A centralização resulta da agenda social da Constituição e dos aumentos do salário mínimo (150% acima da inflação) nos últimos catorze anos. O mínimo é a base de muitos dos benefícios sociais, que representaram 63,2% das despesas não financeiras federais em 2012. Mesmo assim, curiosamente, a fatia da União nas receitas disponíveis caiu de 53%, em 1999, para 48%, em 2009.
A federação foi atropelada por essas medidas. As demandas de descentralização das receitas, já velhas em 1988, se tornaram caducas na atualidade. Perto de 90% das receitas federais se destinam a gastos incomprimíveis. Essa vaca não dá mais leite. Ela iria para o brejo. Felizmente, o documento final do PSDB não considerou as ideias de Aécio. Os tucanos modernizaram sua visão sobre o federalismo. As diretrizes, mesmo que genéricas, são um bom ponto de partida para discutir a questão.
A proposta do senador Aécio Neves era outra. No dia 18 de novembro, ele obtivera do PSDB a Declaração de Poços de Caldas + 30, a qual propugnava um novo pacto federativo "que signifique responsabilidades e recursos compartilhados de forma mais justa, pelo bem dos brasileiros". No mesmo dia, em sua coluna na Folha de S. Paulo, ele propôs "reverter o desmanche da federação brasileira e o crescente risco de insolvência de estados e municípios, vitimados pela grave concentração, na órbita federal, de recursos e poder". Tradução: mais dinheiro da União para estados e municípios.
Vi de perto movimento semelhante na Assembleia Constituinte. Parlamentares das regiões menos desenvolvidas prometiam redimi-las com transferências da União. As demais pediam o mesmo para aliviar dívidas. Era preciso, diziam, acabar o "pires na mão". Assim, a Constituição de 1988 promoveu a maior transferência de recursos federais da história (44% do imposto de renda e 54% do IPI mais os impostos únicos sobre combustíveis, minerais, transportes e comunicações). Passados 25 anos, as regiões menos desenvolvidas não foram redimidas e todas continuam endividadas. Grande parte do dinheiro virou gasto de é economista pessoal. O "pires" continua na mão.
Nosso federalismo é mal definido desde a República. A ação que derrubou a monarquia se inspirou no federalismo americano de 1787. Até no nome. Tornamo-nos República dos Estados Unidos do Brasil (Constituição de 1891). Aqui, a ideia era reformar o Estado imperial centralista moldado na cultura portuguesa. Nada mudou. Lá, buscou-se evitar a desintegração da confederação de treze estados muito autônomos (as antigas colônias) nascida da independência. A federação americana implicou certa centralização, incluindo a criação do cargo de presidente da República. Os nossos federalistas podem ter pensado em descentralização, mas prevaleceu a cultura de dependência do governo central.
Vem daí a inconsequente repartição das receitas da União em 1988, sem cuidados e sem transferência de encargos. Além disso, decidiu-se elevar os gastos sociais e aumentar a vinculação de receitas a despesas como as da educação. A União perdeu receitas e ganhou novos encargos. A conta não fechava. Era preciso aumentar a carga tributária, mas o IR e o IPI, os dois principais tributos federais, haviam perdido importância. Restou à União pouco mais de 40% e 30% desses impostos, respectivamente. Assim, recorrer a tais impostos exigiria mais do que dobrar as alíquotas. O caminho de menor custo para os contribuintes era apelar para tributos não partilháveis, isto é, as contribuições, que pertencem integralmente á União. A consequência, inevitável, foi a piora da qualidade do sistema tributário.
O senador Aécio acertava ao reivindicar um novo pacto federativo, mas errava ao mirar a redução dos recursos da União. A centralização resulta da agenda social da Constituição e dos aumentos do salário mínimo (150% acima da inflação) nos últimos catorze anos. O mínimo é a base de muitos dos benefícios sociais, que representaram 63,2% das despesas não financeiras federais em 2012. Mesmo assim, curiosamente, a fatia da União nas receitas disponíveis caiu de 53%, em 1999, para 48%, em 2009.
A federação foi atropelada por essas medidas. As demandas de descentralização das receitas, já velhas em 1988, se tornaram caducas na atualidade. Perto de 90% das receitas federais se destinam a gastos incomprimíveis. Essa vaca não dá mais leite. Ela iria para o brejo. Felizmente, o documento final do PSDB não considerou as ideias de Aécio. Os tucanos modernizaram sua visão sobre o federalismo. As diretrizes, mesmo que genéricas, são um bom ponto de partida para discutir a questão.
24 de dezembro de 2013
MAÍLSON DA NÓBREGA, Veja
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