Grupo de fiscais envolvido em escândalo esbanjava riqueza e imaginava-se intocável; investigação do caso não pode escolher alvos
"Quem não gosta de jantar num restaurante caro e bom? Eu gosto." A pergunta retórica e a resposta são de Vanessa Caroline Alcântara, ex-companheira do fiscal Luis Alexandre Cardoso de Magalhães.
Segundo Alcântara, o fiscal municipal costumava levá-la a restaurantes nobres de São Paulo, nos quais gostava de pedir o vinho mais caro da carta. O destino seguinte era um hotel dispendioso, cuja diária custava R$ 5.000. Era comum que a noite consumisse R$ 10 mil.
Não é preciso esforço para notar a discrepância entre os hábitos faustosos e o salário de Magalhães. Como funcionário público, recebia cerca de R$ 14 mil por mês.
Apelidado de "louco" por alguns colegas, o fiscal não fazia questão de disfarçar os sinais de uma riqueza incompatível com os seus vencimentos. Em seu nome ou no das empresas que controla estão 27 imóveis; seu patrimônio estimado é de R$ 18 milhões.
Vem do Ministério Público a explicação para o descompasso: Magalhães e pelo menos outros três servidores são acusados de envolvimento num esquema de corrupção que impôs prejuízo de R$ 500 milhões aos cofres municipais.
Tratava-se de cobrar propina para reduzir o valor do ISS (Imposto sobre Serviços) a ser pago por determinada empresa. Os fiscais embolsavam até metade do montante devido; a prefeitura, quase nada.
Calcula-se que o grupo tenha entesourado R$ 80 milhões. São 59 imóveis, nove quotas de participação em empresas, automóveis de luxo e uma lancha avaliada em R$ 1 milhão. Podem ser todos ingênuos ou inexperientes na arte de ocultar bens ilícitos, mas é ainda assim espantosa a desfaçatez. Imaginavam-se intocáveis.
De acordo com a ex-companheira de Luis Magalhães, por exemplo, foi somente após saber-se investigado pela Controladoria Geral do Município que o fiscal tentou usá-la como laranja.
O episódio suscita questões embaraçosas para o ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD). Por que agiam com tamanha certeza de impunidade? Sobrava proteção a essas práticas ou faltava investigação por parte dos órgãos públicos?
Tampouco está livre de questionamento o prefeito Fernando Haddad (PT). É que Ronilson Bezerra Rodrigues, apontado como chefe do esquema, foi nomeado diretor de finanças da SPTrans (empresa que gerencia o transporte municipal) na atual administração. Além disso, o nome de Antonio Donato, secretário de Governo do petista, já apareceu ligado a Magalhães em escuta autorizada pela Justiça.
Espera-se que a promissora Controladoria Geral do Município não faça distinções políticas no exercício de seu dever.
05 de novembro de 2013
Editorial da Folha
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