Claro, claro. São manifestantes pacíficos, ordeiros e bem-intencionados; e daí? Daí que as grandes cidades brasileiras não podem ficar reféns de bloqueios diários de trânsito, de entraves ao trabalho e ao lazer, de protestos que, por justos que sejam, já atravancam há quase cinco meses as atividade normais dos cidadãos.
E aqui não se fala de mascarados, de black-blocs, seja qual for o seu nome: quem participa de ações violentas e depredações de patrimônio público ou privado está fora da lei e seu direito é apenas a um julgamento justo.
Já houve um bloqueio em São Paulo em apoio aos portuários do Panamá, ou de Porto Rico; há bloqueios contra médicos cubanos, a favor de médicos cubanos, contra a praga que ameaça as plantações de centeio da Moldávia Exterior. Parar uma cidade, ou uma estrada, é fácil: meia dúzia de pessoas espalha meia dúzia de pneus na rua e, com meia dúzia de fósforos, incendeia-se o caminho. Falta pouco para sitiar bairros inteiros como protesto contra o gol anulado pelo juiz quando estava claro que não houve impedimento.
Manifestações existem em todo o mundo democrático. Em Londres, o Hyde Park é área preferencial de protestos, onde quase não há limites para a liberdade de expressão. Mas a cidade continua funcionando. Parar tudo também existe, mas em ocasiões específicas:
Buenos Aires, por exemplo, parou para os funerais de Perón. Já parar uma cidade porque alguém tem vontade de quebrar umas vitrines é coisa nossa.
Chega: o cidadão tem de ter no mínimo o direito de ir e vir.
O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, do PT, agiu mal: multiplicou o IPTU e chegou a demitir um secretário para que reassumisse sua cadeira de vereador e votasse favoravelmente à escorcha. Mas isso não é justificativa para manifestações em frente à sua casa: se alguém quiser protestar contra Maldadd, que o faça em frente à Prefeitura, ou em alguma solenidade – ou, melhor ainda, nas urnas, votando contra os candidatos que ele indicar. Mas não em sua casa, não envolvendo sua família, não perturbando seus vizinhos. Civilidade, enfim.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anunciou que os serviços de informações da Polícia Federal e das polícias de São Paulo e do Rio vão investigar em conjunto os manifestantes que agem com violência. Isso significa que só agora, depois de cinco meses de quebra-quebra, Sua Excelência decidiu trabalhar? Que até agora as polícias se recusavam a colaborar umas com as outras?
Já que o ritmo é este, o trabalho conjunto poderia começar por uma investigação simples: que é aquele cavalheiro, no Rio, que jogou coquetéis Molotov, correu na direção dos policiais, foi recebido, e reapareceu fardado instantes depois. Tudo foi filmado.
Como é que ele explica seu desempenho? Quem lhe deu ordens? Por que?
Vários funcionários municipais paulistanos foram detidos por exigir e receber propina, dando aos cofres públicos, ao mesmo tempo, prejuízos que ainda estão sendo calculados, mas podem chegar a meio bilhão de reais. Todos atuaram na administração Gilberto Kassab, ex-DEM, hoje PSD; e um deles, membro de destaque do grupo, foi nomeado para um cargo de confiança pelo prefeito Fernando Haddad, PT. Haddad diz que nomeou o cavalheiro como parte de sua estratégia para evitar que a investigação fosse revelada. Ah, bom: simplesmente deixar o servidor onde estava não era suficiente. Seria preciso promovê-lo, né? Então, tá.
Os detidos, informa-se, ameaçavam cobrar impostos altíssimos de quem fazia obras na cidade. Mas, mediante boa compensação, acabavam inscrevendo as obras com impostos bem baixinhos. Mas quem foi beneficiado? Se eles foram corrompidos, quem os corrompeu? Se receberam, quem pagou? É certo que quem pagou tinha condições de fazê-lo.
Será que denunciar quem pagou é perigoso?
A explicação do procurador da República Rodrigo de Grandis para não ter colaborado com as investigações pedidas pela Suíça a respeito do caso Alstom – formação de cartel e pagamento de propina em São Paulo, em obras e equipamentos do Metrô e dos trens metropolitanos – é simples: diz que o pedido suíço foi guardado numa pasta errada e por isso, nos três anos que se passaram, ninguém cuidou do caso.
Não é bem assim: houve três ofícios das autoridades brasileiras responsáveis pela recuperação de ativos internacionais desviados, todos olimpicamente ignorados. O fato é que, depois de três anos à espera de providências, os procuradores suíços decidiram arquivar o caso. Apenas como complemento, o caso Alstom é, no fundo, o caso Siemens. Cadê as investigações?
Em São Paulo, o Governo tucano impede a criação de uma CPI na Assembléia. Claro: tanto o caso Alstom quanto o caso Siemens se iniciaram no Governo tucano de Mário Covas e atravessaram os governos tucanos de Alckmin e Serra. Mas a bancada federal petista anunciou há dois meses que tem assinaturas suficientes para criar uma CPI no Congresso. Até agora não a criou. Por que?
05 de novembro de 2013
Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário