A ministra Cármen Lúcia tirou o presente de Natal da gatunagem do colarinho branco. Ela suspendeu o decreto de Michel Temer que afrouxava as regras para o indulto presidencial. O texto permitia perdoar até 80% das penas de condenados por crimes como corrupção e lavagem de dinheiro.
O ato ganhou o apelido de “decreto do insulto” e gerou um levante de juízes e investigadores. Nomeada por Temer, a procuradora Raquel Dodge classificou o texto como “arbitrário”, “inconstitucional” e “indiscriminado”. Ao contestar a generosidade presidencial, ela conseguiu o que parecia impossível: recebeu elogios do antecessor, Rodrigo Janot.
IMPUNIDADE – Para a chefe do Ministério Público Federal, o decreto “ampliou benefícios desproporcionalmente e criou um cenário de impunidade”. Ela disse que a medida favorecia, em especial, quem praticou crimes contra a administração pública. Além de reduzir penas, permitia o cancelamento de multas aplicadas pela Justiça.
“O decreto de indulto faz o crime compensar”, escreveu Dodge. “A Lava Jato está colocada em risco, assim como todo o sistema de responsabilização criminal”, acrescentou.
A presidente do Supremo concordou com os argumentos da procuradora. “Indulto não é nem pode ser instrumento de impunidade”, afirmou. “Não é prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime. Nem pode ser ato de benemerência ou complacência com o delito”, prosseguiu.
MAIS DESGASTE – A liminar amplia o desgaste de um governo que passou o ano na defensiva, com o presidente e seus aliados mais próximos acusados de corrupção. A decisão tem trechos curiosos. Em dois momentos, Cármen cita decisões do ministro Gilmar Mendes, conselheiro do Planalto, para apontar desvio de finalidade no decreto.
Em outra passagem, ela observa que o indulto não pode se converter em “benemerência sem causa”. A presidente do Supremo foi elegante, porque a causa da benemerência de Temer estava claríssima.
30 de dezembro de 2017
Bernardo Mello Franco
Folha
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