O principal problema do teto de gastos, se for definitivamente aprovado pelo Congresso, não é que leve a uma redução das verbas para setores como saúde e educação. Seria, de fato, um problemão, mas há dúvidas consistentes sobre a inevitabilidade da redução.
Além disso, políticos não costumam se suicidar, cortando verbas que o eleitorado costuma reivindicar. No fim do dia, acabarão por dar um jeitinho: ou cortarão em outros itens orçamentários ou derreterão, de alguma maneira, a rigidez do teto, o que seria mais coerente com o histórico do PMDB e do centrão, majoritários no Congresso.
Por tudo isso, o principal problema é que o teto não estabelece nem mesmo um piso para o crescimento da economia, que, bem feitas as contas, é o verdadeiro nó.
Qual seria então o ponto a ser atacado? Recorro a Gray Newman, professor adjunto na Escola de Assuntos Públicos e Internacionais da Universidade Columbia, ex-diretor-gerente e economista-chefe para a América Latina do banco Morgan Stanley.
"O maior obstáculo para o crescimento do Brasil tem muitas faces, mas pode ser resumido em uma única palavra: produtividade", escreve Newman em capítulo de recente livro sobre a economia brasileira, adaptado para o número mais recente da Americas Quarterly.
Os dados que Newman esgrime para sustentar sua tese são de fato impressionantes, já resumidos nesta Folha, aliás, a propósito do índice de competitividade global do Fórum Econômico Mundial, muito recente.
Há três pontas no problema. A eles:
1 - Capital humano - A qualidade do ensino básico brasileiro, cronicamente deficiente, ficou na 132ª colocação em 140 países, no ranking do Fórum. É sempre bom lembrar que, no ensino superior, o desempenho não é exatamente brilhante.
2 - Capital físico - A qualidade das estradas brasileiras ficou no 121º lugar no ranking, e a dos portos, no 120º, o que, comenta Newman, "representa um enorme desafio aos agricultores para o que deveria ser um dos pontos fortes do Brasil —suas exportações agrícolas".
3 - Ambiente regulatório - Pesquisa do Banco Mundial coloca o Brasil na 174ª colocação entre 189 economias quando se trata de começar um negócio, e na 178ª colocação em dificuldade de pagar impostos.
Conclui o economista: "Meu medo é que a maioria dos planos macroeconômicos e propostas sendo discutidos hoje provavelmente tenha pouco efeito sobre a trajetória de crescimento de longo prazo do Brasil, se essas barreiras, certamente mais importantes, não forem removidas".
Outro ponto a propósito do teto é esgrimido por economistas ortodoxos como Monica de Bolle e Felipe Salto, em artigo para o blogue do último: argumentam que um deficit primário (fora juros da dívida) de 2% a 3% do PIB já bastaria para estabilizar a dívida (que é o grande objetivo do teto).
Perguntam: "De que serve, então, aprovar regra que produz um primário de quase 6,5% do PIB ao final de 20 anos?" [que é o que calculam que o teto entregará, tal como está desenhado].
21 de outubro de 2016
Clovis Rossi, Folha de SP
Além disso, políticos não costumam se suicidar, cortando verbas que o eleitorado costuma reivindicar. No fim do dia, acabarão por dar um jeitinho: ou cortarão em outros itens orçamentários ou derreterão, de alguma maneira, a rigidez do teto, o que seria mais coerente com o histórico do PMDB e do centrão, majoritários no Congresso.
Por tudo isso, o principal problema é que o teto não estabelece nem mesmo um piso para o crescimento da economia, que, bem feitas as contas, é o verdadeiro nó.
Qual seria então o ponto a ser atacado? Recorro a Gray Newman, professor adjunto na Escola de Assuntos Públicos e Internacionais da Universidade Columbia, ex-diretor-gerente e economista-chefe para a América Latina do banco Morgan Stanley.
"O maior obstáculo para o crescimento do Brasil tem muitas faces, mas pode ser resumido em uma única palavra: produtividade", escreve Newman em capítulo de recente livro sobre a economia brasileira, adaptado para o número mais recente da Americas Quarterly.
Os dados que Newman esgrime para sustentar sua tese são de fato impressionantes, já resumidos nesta Folha, aliás, a propósito do índice de competitividade global do Fórum Econômico Mundial, muito recente.
Há três pontas no problema. A eles:
1 - Capital humano - A qualidade do ensino básico brasileiro, cronicamente deficiente, ficou na 132ª colocação em 140 países, no ranking do Fórum. É sempre bom lembrar que, no ensino superior, o desempenho não é exatamente brilhante.
2 - Capital físico - A qualidade das estradas brasileiras ficou no 121º lugar no ranking, e a dos portos, no 120º, o que, comenta Newman, "representa um enorme desafio aos agricultores para o que deveria ser um dos pontos fortes do Brasil —suas exportações agrícolas".
3 - Ambiente regulatório - Pesquisa do Banco Mundial coloca o Brasil na 174ª colocação entre 189 economias quando se trata de começar um negócio, e na 178ª colocação em dificuldade de pagar impostos.
Conclui o economista: "Meu medo é que a maioria dos planos macroeconômicos e propostas sendo discutidos hoje provavelmente tenha pouco efeito sobre a trajetória de crescimento de longo prazo do Brasil, se essas barreiras, certamente mais importantes, não forem removidas".
Outro ponto a propósito do teto é esgrimido por economistas ortodoxos como Monica de Bolle e Felipe Salto, em artigo para o blogue do último: argumentam que um deficit primário (fora juros da dívida) de 2% a 3% do PIB já bastaria para estabilizar a dívida (que é o grande objetivo do teto).
Perguntam: "De que serve, então, aprovar regra que produz um primário de quase 6,5% do PIB ao final de 20 anos?" [que é o que calculam que o teto entregará, tal como está desenhado].
21 de outubro de 2016
Clovis Rossi, Folha de SP
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