"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

PEC DO TETO DO GOVERNO NEM ROÇA PROBLEMAS ESTRUTURAIS DO BRASIL

O principal problema do teto de gastos, se for definitivamente aprovado pelo Congresso, não é que leve a uma redução das verbas para setores como saúde e educação. Seria, de fato, um problemão, mas há dúvidas consistentes sobre a inevitabilidade da redução.

Além disso, políticos não costumam se suicidar, cortando verbas que o eleitorado costuma reivindicar. No fim do dia, acabarão por dar um jeitinho: ou cortarão em outros itens orçamentários ou derreterão, de alguma maneira, a rigidez do teto, o que seria mais coerente com o histórico do PMDB e do centrão, majoritários no Congresso.

Por tudo isso, o principal problema é que o teto não estabelece nem mesmo um piso para o crescimento da economia, que, bem feitas as contas, é o verdadeiro nó.

Qual seria então o ponto a ser atacado? Recorro a Gray Newman, professor adjunto na Escola de Assuntos Públicos e Internacionais da Universidade Columbia, ex-diretor-gerente e economista-chefe para a América Latina do banco Morgan Stanley.

"O maior obstáculo para o crescimento do Brasil tem muitas faces, mas pode ser resumido em uma única palavra: produtividade", escreve Newman em capítulo de recente livro sobre a economia brasileira, adaptado para o número mais recente da Americas Quarterly.

Os dados que Newman esgrime para sustentar sua tese são de fato impressionantes, já resumidos nesta Folha, aliás, a propósito do índice de competitividade global do Fórum Econômico Mundial, muito recente.

Há três pontas no problema. A eles:

1 - Capital humano - A qualidade do ensino básico brasileiro, cronicamente deficiente, ficou na 132ª colocação em 140 países, no ranking do Fórum. É sempre bom lembrar que, no ensino superior, o desempenho não é exatamente brilhante.

2 - Capital físico - A qualidade das estradas brasileiras ficou no 121º lugar no ranking, e a dos portos, no 120º, o que, comenta Newman, "representa um enorme desafio aos agricultores para o que deveria ser um dos pontos fortes do Brasil —suas exportações agrícolas".

3 - Ambiente regulatório - Pesquisa do Banco Mundial coloca o Brasil na 174ª colocação entre 189 economias quando se trata de começar um negócio, e na 178ª colocação em dificuldade de pagar impostos.

Conclui o economista: "Meu medo é que a maioria dos planos macroeconômicos e propostas sendo discutidos hoje provavelmente tenha pouco efeito sobre a trajetória de crescimento de longo prazo do Brasil, se essas barreiras, certamente mais importantes, não forem removidas".

Outro ponto a propósito do teto é esgrimido por economistas ortodoxos como Monica de Bolle e Felipe Salto, em artigo para o blogue do último: argumentam que um deficit primário (fora juros da dívida) de 2% a 3% do PIB já bastaria para estabilizar a dívida (que é o grande objetivo do teto).

Perguntam: "De que serve, então, aprovar regra que produz um primário de quase 6,5% do PIB ao final de 20 anos?" [que é o que calculam que o teto entregará, tal como está desenhado].


21 de outubro de 2016
Clovis Rossi, Folha de SP


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