Num magnífico artigo publicado na edição de domingo de O Globo, tão magnífico quanto excelente tem sido sua atuação na Lava-Jato, o juiz Sérgio Moro traçou caminhos adequados (e possíveis) para reduzir a corrupção no país, da mesma forma que destinados a tornar a Justiça mais rápida e assim evitar as constantes impunidades através da prescrição de prazos.
Ele disse reduzir, não zerar, já que isso é impossível, uma vez que infelizmente, todos reconhecemos, ela pertence à natureza humana. Mas Sérgio Moro separa a utopia, que frequentemente conduz ao escapismo, da corrupção sistêmica, cuja repetição leva a uma verdadeira endemia, já que falar em epidemia poderia parecer um exagero. A corrupção sistêmica atinge fortemente o sentimento de autoestima de um povo. E um povo que paga propina, disse ele, e aceita como normal, digo eu, é um povo sem dignidade.
PASSOU A SER PRAXE
Em nosso país, a corrupção cristalizou-se como algo insuperável e até almejado por muitos. Como sair desse quadro? – indaga o juiz de Curitiba. A matéria tornou-se extremamente complexa, uma vez que ser honesto não é mais uma qualidade essencial às pessoas, em particular, e à sociedade de modo geral. A corrupção transformou-se numa fonte de negócios materialmente bem sucedidos para alguns e predatórias para algo em torno de 97% da população.
Os corruptores, corruptos e os lobistas, bem como os intermediários das propinas e dos termos aditivos que acrescentam somas muitas vezes bilionárias a contratos, como sucedeu na Petrobrás, zombam da honestidade e consideram os honestos verdadeiros trouxas. Para eles, os ladrões pertencem ao universo dos espertos, os que dão a volta por cima, corrompendo e se deixando corromper. Ladrões de casaca, desprezam as pessoas que atuam corretamente.
A corrupção encontra-se, atualmente, na raiz do processo político. Passou a se constituir num fim em si mesmo.
REFORMA PÍFIA
Vejam os leitores, acentuo eu, a reforma ministerial concluída ontem como a posse dos escolhidos para novos endereços na esplanada de Brasília. Entre eles, alguns sem a menor afinidade para os postos a que foram designados. Assim, o que podem de fato representar? Os interesses do país é que não. Representam, isso sim, objetivos de poder. Entre eles certamente objetos subjetivos.
Na medida em que se trocam nomeações por votos no Legislativo, está se praticando um tipo de desvirtuamento da função pública e, indiretamente, pelo menos, alimentando-se a corrupção. Não que a participação multipartidária nos governos signifique um aviltamento da face política de um país. Longe disso. Mas é preciso que tal representação seja revestida de objetivos construtivos de interesse público, de interesse legítimo da população.
O poder não pode estar circunscrito a um exercício de narcisismo, ou, o que é pior, de um meio de enriquecimento particular. Neste plano, ele se desvirtua. Passa de instrumento coletivo para um equipamento de enriquecimento pessoal e grupal.
GRANDE CONTRADIÇÃO
Os governos e governantes que se prezam não podem aceitar a corrupção, é uma contradição completa, uma submersão de valores. Além do mais, um retrocesso que freia o desenvolvimento e leva à concentração ilícita da riqueza. Em vez de distribuir a renda ao povo, retira o mercado de emprego do país, rebaixa a moral, rouba os valores do trabalho. Um desastre. Sérgio Moro tem razão.
06 de outubro de 2015
Pedro do Coutto
Nenhum comentário:
Postar um comentário