As críticas ao comportamento da presidente Dilma Rousseff em seu discurso de posse não significam perseguição nem má vontade. Todos sabem que o cargo de chefe do governo exige uma postura digna e condizente com a realidade dos fatos, mas não é isso que está ocorrendo.
O problema é que estamos vivendo na estranha e perigosa Era da Encenação Política, digamos assim. Já houve tempo em que os próprios governantes redigiam seus discursos, quando não o faziam de improviso. Mas nos últimos anos os pronunciamentos políticos passaram a ser escritos por marqueteiros, que usam técnicas comerciais, como se estivessem vendendo um produto.
Foi por isso que o longo e enfadonho discurso de Dilma Rousseff veio recheado de promessas recicladas, que já haviam sido feitas na primeira posse, quatro anos atrás, e de êxitos governamentais superdimensionados, como se a pobreza já tivesse sido erradicada, embora 54 milhões de famílias brasileiras ainda tenham de ser socorridas pela Bolsa Família, o que significa mais da metade da população do país em situação de miséria.
PACOTE ILUSÓRIO
O pior mesmo foi o “pacote anticorrupção” citado por Dilma Rousseff no final do discurso de posse, em que tentou assumir a “autoria” do combate ao crime que vem vendo desfechado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público, conforme já registramos aqui na Tribuna da Internet. E além de cometer essa gravíssima falsidade ideológica em seu pronunciamento, ela anunciou bombasticamente o envio ao Congresso de cinco propostas, ainda no primeiro semestre deste ano, que, segundo ela, visam a “garantir processos e julgamentos mais rápidos e punições mais duras”.
Acontece que essa promessa é ardilosa e ilusória, representa apenas uma mera ação de marketing político que precisa ser denunciada, porque três das cinco propostas já tramitam no Congresso e jamais receberam apoio da presidente Dilma Rousseff para serem aprovadas. Reportagem de Fábio Brandt, Isadora Peron, Daiene Cardoso e Ricardo Brito, publicada pelo Estadão, mostra que aguardam aprovação do Legislativo os seguintes projetos:
1) transforma em crime o enriquecimento não justificado de agentes públicos;
2) dá mais agilidade aos processos contra políticos e autoridades com foro privilegiado;
3) transforma em crime a prática do caixa dois em campanha eleitorais.
Apenas duas propostas de Dilma ainda não foram apresentadas por parlamentares ao Congresso: as que pretendem facilitar o confisco de bens adquiridos de forma ilícita e agilizar processos sobre desvio de recursos públicos.
SERIA MAIS DIGNO
Traduzindo tudo isso: ao invés de tentar assumir a “autoria” do combate à corrupção, que jamais partiu dela, que fez exatamente o contrário e diminuiu as verbas da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União, e de tentar também assumir a “autoria” de projetos que já existem e estão tramitando no Congresso sem o menor apoio do governo ou da base aliada, a presidente Dilma deveria ter dito a verdade.
Ficaria mais digno se ela simplesmente afirmasse que vai apoiar as três propostas dos parlamentares e pretende apresentar os dois projetos restantes. Mas qual o político que se interessa em dizer a verdade nos dias de hoje? Todos preferem ouvir e seguir os marqueteiros, cuja principal função, todos sabem, é iludir o respeitável público. Simples assim.
08 de janeiro de 2015
Carlos Newton
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