"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 6 de dezembro de 2014

O PALPITEIRO

Artigos - Cultura 
Em nosso violentado, tributado e inflacionado país, há uma figura cuja nocividade só não é maior do que a aceitação do público a suas falhas: o palpiteiro.
E parece que quanto mais furados são seus palpites, mais aceito e celebrado é o tipo.
Um espécime mui representativo dessa classe de embusteiros é Luis Fernando Verissimo.
Metido a sarcástico, sagaz e irônico, sua maior ironia reside em seu sobrenome.

Se esse senhor se dedicasse a conhecer tudo aquilo que finge entender, ​seria de um gênio quase inigualável. Contudo, porque não vai além da pose afetada, igualmente não vai além de falaciar e enganar sua legião de ingênuos leitores. Alertado por um amigo, li a coluna de Verissimo na ZH de 01/12/2014, de títuloBang!***, na qual o escritor desdenha da Igreja Católica em relação à Ciência, debochando do fato de o papa Francisco haver admitido a possibilidade de ocorrência do "Big Bang".


Quem estranha essa posição do papa desconhece completamente aquilo que finge entender – a ciência. Pois, o propositor da teoria do "Big Bang" foi um astrônomo que era... padre. Falo do belga Georges Lemaître.


Ou seja, era religioso o cientista que propôs a teoria que Verissimo e outros farsantes imaginam contrapor o criacionismo. Lamaître, aliás, era tão religioso quanto o "pai da Genética" (o monge agostiniano Gregor Mendel), o "pai da Geografia" (o beato Nicolaus Steno), o pioneiro do rádio brasileiro (o padre Landell de Moura), filósofos da estatura de Alberto Magno, Roger Bacon e Guilherme de Ockham, os mais de 30 jesuítas que dão nomes a crateras lunares (em homenagem a suas contribuições às pesquisas sobre nosso satélite) e muitos, muitos outros cientistas que contribuíram grandiosamente à humanidade. Aliás, eram religiosos – e católicos – os indivíduos que constituíram aquilo que conhecemos por universidades e hospitais.


Por omissão ou por ignorância, em postura consonante com seu petismo, Verissimo [a ironia deste nome é incrível!] falha retumbantemente em seu palpitarianismo. Por caridade e piedade, suportamos a ignorância de pessoas "normais", cujas opiniões não ultrapassam seu círculo de vivência. Todavia, pessoas que detêm as prerrogativas de espaços midiáticos como o que ZH oferece a Verissimo devem ser corrigidas – caso falhem em seu mister  e constrangidas – se insistirem nos erros. Pois, só disseminam desinformações as pessoas mal-informadas e/ou mal-intencionadas. De uma forma ou de outra, essas pessoas não deveriam meter-se a opinar em público. Deveriam limitar-se a babar na gravata, como diria Nelson Rodrigues (este sim, de verdadeiro gênio). Na melhor das hipóteses, poderiam recolher-se a estudar aquilo sobre que pretendem opinar e bancar gostosura intelectual.

* * *

Remeti uma versão resumida do texto acima à redação de Zero Hora. Grata surpresa: o jornal publicou minha contestação em sua edição de 02/12/14.
(A foto é do amigo Marcel van Hattem.)
* * *

***Eis o texto de Luis Fernando Verissimo:


A última do Papa Francisco é que nem o Big Bang desmente a teologia nem a teologia desmente o Big Bang. Um cristão pode aceitar a teoria do grande estouro que, segundo a ciência, deu origem ao Universo em um milésimo de segundo, sem abandonar sua crença na existência de um Deus criador de tudo. Pode-se até imaginar uma hipotética conversa do Papa, que o representa na Terra, com Deus, em que Este lhe confidencia:
— Francisco...
— Sim, Senhor.
— O Big Bang... Existiu mesmo.
— O quê?
— Existiu. Não adianta mais negar. A teoria está certa.
— O Senhor tem certeza?
— Meu filho, Eu estava lá.
— Então o Big Bang... foi o Senhor?
— Modestamente...

A Ciência não nos assegura que o Grande Nada que precedeu o Big Bang não fosse o tempo ocioso de Deus, indeciso sobre o que fazer da Sua vida. Crio um universo? Me resigno a esta imensa solidão, por toda a eternidade? E este meu poder sem limites, o que faço com ele? Se posso tudo, por que não fazer tudo? E Deus explodiu, criando tudo.

A vantagem de criacionistas sobre evolucionistas é que a Bíblia, onde está escrito tudo o que um criacionista precisa saber, pode ser lida como verdade incontestável ou como uma coleção de parábolas e metáforas. Assim, trechos que parecem cientificamente improváveis são explicados como sendo em linguagem figurada, com liberdade poética, e os outros, menos fantásticos, como fatos históricos. Não há nem poesia nem certezas iguais nas explicações científicas.

Há pouco uma sonda pousou num cometa e, entre as transmissões que mandou para a Terra, detectaram o que pareciam ser notas musicais. Não eram, mas por um breve instante de encantamento foi lembrada uma ideia antiga, a de um Universo sinfônico, e Deus como uma espécie de Beethoven sideral. O cometa traria, entranhado, algum resto da música das estrelas. Mas o ruído da sonda era só estática. Pena. Seria um ponto para o deslumbramento religioso contra a frieza da ciência.
06 de dezembro de 2014
Colombo Mendes

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