Só a necessidade de fazer caixa explica a pressa do governo para leiloar a frequência de 700 MHz
O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou, no dia 4, que o governo federal ainda não publique o edital do leilão da frequência de 700 MHz, em que as operadoras de telefonia disputarão uma nova faixa para oferecer seus serviços de 4G, antes que o pleno do TCU aprove o documento. A decisão adia por algumas semanas o plano de realizar o quanto antes o leilão, mas não será suficiente para cumprir o desejo das operadoras de telecomunicações, que gostariam de deixar tudo pelo menos para 2015.
A faixa de 700 MHz, entre os canais 52 e 59, é hoje ocupada por emissoras de televisão operando em sinal digital e analógico. À medida que elas vão adotando o sinal digital, os dois modelos estão convivendo simultaneamente, mas existe um cronograma para o desligamento definitivo do sinal analógico (chamado switch-off), começando em abril de 2016 e encerrando em novembro de 2018, iniciando pelas grandes cidades (em Curitiba, a data é 25 de junho de 2017) e terminando pelas regiões mais remotas do país. No entanto, diversos especialistas em comunicação revelam que o cronograma é um tanto ambicioso e deverá enfrentar várias dificuldades, desde a adaptação das emissoras menores até a mudança total nos aparelhos de toda a população brasileira, já que só funcionarão os televisores que saem de fábrica preparados para o sinal digital, ou aqueles que tiverem conversores.
Até aí, é natural e desejável que as frequências que forem gradativamente abandonadas pelas emissoras de televisão sejam ocupadas pela telefonia móvel, melhorando o serviço oferecido ao consumidor. Visto por esse ângulo, o leilão parece – e é – a coisa certa a fazer, para não deixar ociosa uma frequência que as operadoras de telefonia cobiçam com ansiedade por questões técnicas. Hoje, o 4G opera apenas na frequência de 2,5 GHz. Mas o raio de alcance das antenas de 2,5 GHz é menor que as de 700 MHz, ou seja, no futuro será preciso instalar e manter menos antenas para cobrir a mesma área. Além disso, o sinal de 700 MHz é melhor que o de 2,5 GHz em ambientes fechados.
O problema está no timing do leilão. As operadoras contestam, com razão, a necessidade de leiloar imediatamente algo que só estará completamente disponível daqui a quatro anos – e isso se não houver absolutamente nenhum empecilho na migração do sinal de televisão. É bom lembrar a experiência de Japão e Estados Unidos, sociedades mais avançadas tecnologicamente e que tiveram de enfrentar adiamentos na mudança definitiva para o sinal digital. Também no Brasil as datas do processo de desligamento do sinal analógico já foram postergadas uma vez, pois a previsão anterior para era encerrar a migração em 2016. Isso indica que seria melhor esperar o início do switch-off para avaliar o ritmo do processo e ter uma noção mais precisa do cronograma.
Além disso, as operadoras precisarão desembolsar agora dinheiro que poderia ser usado na melhoria da rede de telecomunicações atual – que, como todos sabemos, bem precisa de um incremento na qualidade. E ainda caberá aos vencedores do leilão arcar com custos como os da redistribuição dos canais de televisão, mitigação contra interferências no sinal digital, além da compra de filtros e conversores para beneficiários do Bolsa Família e de antenas para casas onde o sinal sofrer interferência do 4G. Inclusive os custos que excederem o que estiver estipulado no edital também terão de ser bancados pelas operadores de telefonia, o que forçará os participantes do leilão a dar tiros no escuro.
Mas talvez a real motivação para tanta pressa em fazer o leilão esteja nas palavras do secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. “Estou contando com os R$ 8 bilhões este ano”, disse a jornalistas, referindo-se ao valor que, imagina-se, as operadoras pagarão pela faixa de 700 MHz. Esse dinheiro é parte dos recursos extraordinários com os quais o governo espera poder fechar suas contas no fim de 2014, assim como fez no ano passado, com os R$ 15 bilhões do leilão do campo de Libra, no pré-sal. Em outras palavras, o governo resolveu correr com algo que afeta praticamente todos os brasileiros e onera desequilibradamente as teles não porque tenha uma política de médio e longo prazo para as telecomunicações, mas simplesmente pela necessidade de fazer caixa. É um absurdo evidente usar o leilão para, mais uma vez, maquiar a incapacidade governamental de economizar o necessário para cumprir metas como a do superávit primário. Essa precipitação por pura falta de disciplina fiscal cria riscos para a área de telefonia e para a de televisão, sem falar do risco moral de um governo que acredita poder contar eternamente com receitas extraordinárias – designação, aliás, autoexplicativa – e que, guiado apenas pela pressão para tapar rombos fiscais, se condena a errar sistematicamente.
O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou, no dia 4, que o governo federal ainda não publique o edital do leilão da frequência de 700 MHz, em que as operadoras de telefonia disputarão uma nova faixa para oferecer seus serviços de 4G, antes que o pleno do TCU aprove o documento. A decisão adia por algumas semanas o plano de realizar o quanto antes o leilão, mas não será suficiente para cumprir o desejo das operadoras de telecomunicações, que gostariam de deixar tudo pelo menos para 2015.
A faixa de 700 MHz, entre os canais 52 e 59, é hoje ocupada por emissoras de televisão operando em sinal digital e analógico. À medida que elas vão adotando o sinal digital, os dois modelos estão convivendo simultaneamente, mas existe um cronograma para o desligamento definitivo do sinal analógico (chamado switch-off), começando em abril de 2016 e encerrando em novembro de 2018, iniciando pelas grandes cidades (em Curitiba, a data é 25 de junho de 2017) e terminando pelas regiões mais remotas do país. No entanto, diversos especialistas em comunicação revelam que o cronograma é um tanto ambicioso e deverá enfrentar várias dificuldades, desde a adaptação das emissoras menores até a mudança total nos aparelhos de toda a população brasileira, já que só funcionarão os televisores que saem de fábrica preparados para o sinal digital, ou aqueles que tiverem conversores.
Até aí, é natural e desejável que as frequências que forem gradativamente abandonadas pelas emissoras de televisão sejam ocupadas pela telefonia móvel, melhorando o serviço oferecido ao consumidor. Visto por esse ângulo, o leilão parece – e é – a coisa certa a fazer, para não deixar ociosa uma frequência que as operadoras de telefonia cobiçam com ansiedade por questões técnicas. Hoje, o 4G opera apenas na frequência de 2,5 GHz. Mas o raio de alcance das antenas de 2,5 GHz é menor que as de 700 MHz, ou seja, no futuro será preciso instalar e manter menos antenas para cobrir a mesma área. Além disso, o sinal de 700 MHz é melhor que o de 2,5 GHz em ambientes fechados.
O problema está no timing do leilão. As operadoras contestam, com razão, a necessidade de leiloar imediatamente algo que só estará completamente disponível daqui a quatro anos – e isso se não houver absolutamente nenhum empecilho na migração do sinal de televisão. É bom lembrar a experiência de Japão e Estados Unidos, sociedades mais avançadas tecnologicamente e que tiveram de enfrentar adiamentos na mudança definitiva para o sinal digital. Também no Brasil as datas do processo de desligamento do sinal analógico já foram postergadas uma vez, pois a previsão anterior para era encerrar a migração em 2016. Isso indica que seria melhor esperar o início do switch-off para avaliar o ritmo do processo e ter uma noção mais precisa do cronograma.
Além disso, as operadoras precisarão desembolsar agora dinheiro que poderia ser usado na melhoria da rede de telecomunicações atual – que, como todos sabemos, bem precisa de um incremento na qualidade. E ainda caberá aos vencedores do leilão arcar com custos como os da redistribuição dos canais de televisão, mitigação contra interferências no sinal digital, além da compra de filtros e conversores para beneficiários do Bolsa Família e de antenas para casas onde o sinal sofrer interferência do 4G. Inclusive os custos que excederem o que estiver estipulado no edital também terão de ser bancados pelas operadores de telefonia, o que forçará os participantes do leilão a dar tiros no escuro.
Mas talvez a real motivação para tanta pressa em fazer o leilão esteja nas palavras do secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. “Estou contando com os R$ 8 bilhões este ano”, disse a jornalistas, referindo-se ao valor que, imagina-se, as operadoras pagarão pela faixa de 700 MHz. Esse dinheiro é parte dos recursos extraordinários com os quais o governo espera poder fechar suas contas no fim de 2014, assim como fez no ano passado, com os R$ 15 bilhões do leilão do campo de Libra, no pré-sal. Em outras palavras, o governo resolveu correr com algo que afeta praticamente todos os brasileiros e onera desequilibradamente as teles não porque tenha uma política de médio e longo prazo para as telecomunicações, mas simplesmente pela necessidade de fazer caixa. É um absurdo evidente usar o leilão para, mais uma vez, maquiar a incapacidade governamental de economizar o necessário para cumprir metas como a do superávit primário. Essa precipitação por pura falta de disciplina fiscal cria riscos para a área de telefonia e para a de televisão, sem falar do risco moral de um governo que acredita poder contar eternamente com receitas extraordinárias – designação, aliás, autoexplicativa – e que, guiado apenas pela pressão para tapar rombos fiscais, se condena a errar sistematicamente.
11 de agosto de 2014
Editorial Gazeta do Povo, PR
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