"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 22 de junho de 2014

POR UM BRASIL DE TODOS

Campanha eleitoral - e não se trata de outra coisa - é assim mesmo, quando os poderosos de turno resolvem se beneficiar das fragilidades das instituições democráticas: vale o que parece, não o que é; importa a versão, danem-se os fatos. E nessa aventura marota, na qual mergulhou de cabeça para evitar um desastre para o PT em outubro, Luiz Inácio Lula da Silva é insuperável. Por isso, não se pode negar razão ao senador Aécio Neves, agora candidato oficial dos tucanos à Presidência, quando declarou, na segunda-feira à noite em São Paulo: "Não vamos cair nessa armadilha do debate que apequena a política, do nós contra eles, da disputa de classes".

A pregação da luta de classes, mote desde sempre das campanhas eleitorais do PT, desvirtua um dos fundamentos da sociedade democrática, o de que para se conquistar o bem comum é preciso somar e não dividir. Desde suas origens políticas na luta sindical, Lula notabilizou-se por "partir para cima" de seus "inimigos", atacá-los sem trégua, eliminá-los sob qualquer pretexto. Houve apenas uma ocasião em que mudou de tática: por recomendação de seus marqueteiros, para consolidar a tendência de vitória nas eleições de 2002 passou a encenar o "Lulinha paz e amor". Tal como faria pouco depois, ao renegar, na famosa Carta aos Brasileiros, a pregação estatizante com que até então combatia a política econômica do governo FHC, Lula abandonou temporariamente - só temporariamente - sua vocação visceral para "guerra e ódio".

A mesmíssima prática marqueteira de manipular os fatos para impor a versão que mais lhe convém Lula adota agora na tentativa de transformar em limonada o intragável limão da manifestação anti-Dilma ocorrida na Arena Corinthians. Ninguém provido de um mínimo de sensatez, educação e civismo aprova o modo grosseiro, com o uso de expressões chulas, com que a presidente foi ofendida pela multidão.

Feita a ressalva necessária, é preciso também repelir com veemência a canhestra tentativa lulopetista de apresentar o episódio do Itaquerão como prova de que Dilma é "vítima das elites". Absolutamente, não. Registre-se que o ministro Gilberto Carvalho, homem de Lula dentro do Palácio do Planalto, saiu-se na última quarta-feira com a aparentemente surpreendente versão de que o episódio do Itaquerão não deve ser debitado a uma iniciativa da "elite branca" presente no evento, mas é o resultado da "pancadaria diária" de que o governo e o PT são vítimas nos meios de comunicação. Trata-se de uma variante tática do jogo lulopetista, que merece comentário à parte.

O fato é que a contundente manifestação no estádio corintiano foi o resultado do mesmíssimo sentimento de insatisfação difusa que desde junho do ano passado tem levado diariamente às ruas brasileiros que, frustrados por mais de uma década de um ufanismo mirabolante e vazio, começam a se dar conta de que caíram num enorme conto do Lula. E mesmo que se admita, apenas para argumentar, que a manifestação anti-Dilma no Itaquerão tenha sido obra exclusiva da "zelite", esta pode ser condenada por se ter comportado em relação à chefe do governo do PT exatamente da mesma forma como o PT e seu governo se comportam em relação a ela, a "elite"? Colhe-se o que se planta.

De qualquer modo, é profundamente lamentável que, faltando ainda quase quatro meses para o pleito de outubro, a campanha eleitoral esteja enveredando pelo descaminho da retórica belicosa com que Lula e o PT pretendem, em desespero, aprofundar entre os brasileiros a divisão alimentada pelo ódio. E por essa perspectiva desanimadora é também responsável a oposição, que entra no jogo do lulopetismo em vez de se concentrar numa campanha propositiva, que desmistifique, com objetividade e clareza, a empulhação populista de Lula e sua sucessora, aponte caminhos viáveis para garantir as inegáveis conquistas sociais e econômicas dos últimos 20 anos e defina uma rota segura para devolver ao Brasil a certeza de que estará rumando em direção à prosperidade econômica e à justiça social.

É preciso tirar o ódio do caminho e estimular a cidadania, valorizar a unidade na diversidade e lutar, com genuíno espírito democrático, por um Brasil de todos.

 
22 de junho de 2014
Editorial O Estadão

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