No país em que imposto é chamado de "contribuição", não é de estranhar que o voto, um direito, seja obrigatório
É lamentável, mas é assim. A Comissão de Constituição e Justiça do Senado rejeitou, por 17 votos a 6, uma PEC de autoria do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), com voto favorável do relator, Pedro Taques (PDT-MT), que instituía o voto facultativo no Brasil.
Como vocês sabem, no Brasil, votar é chamado de um “direito” que o cidadão é obrigado a exercitar. Se não o fizer e não se justificar, ele é severamente punido.
O Brasil tem dessas delicadezas. Com alguma frequência, chama-se, por aqui, imposto de “contribuição”, e o “direito” se transforma numa imposição.
E mais triste ainda é quando o erro recebe o endosso dos bons.
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) votou contra. E deu uma justificativa lastimável, informa Gabriel Castro, na VEJA.com: “As democracias avançadas e consolidadas têm uma sociedade civil muito forte”.
Como assim? Estaria, então, a sociedade brasileira num processo de formação? Será que o Brasil é, digamos assim, infantil para poder lidar com coisas sérias como… voto facultativo? O senador certamente é capaz de explicação melhor do que essa. Não conheço nenhuma, mas ele pode tentar.
Como assim? Estaria, então, a sociedade brasileira num processo de formação? Será que o Brasil é, digamos assim, infantil para poder lidar com coisas sérias como… voto facultativo? O senador certamente é capaz de explicação melhor do que essa. Não conheço nenhuma, mas ele pode tentar.
Nos últimos 40 anos, os EUA , por exemplo, foram governados por quatro republicanos — Nixon-Ford (1973-1976); Reagan (1981-1988); Bush pai (1989-1992) e Bush Filho (2001 a 2008). São seis mandatos do partido. Ao todo, 24 anos. Tiveram três democratas (o quarto está em curso): Carter (1977-1980); Bill Clinton (1993-2000) e Barack Obama (2009-2012) — um total de 16 anos. Ao fim de 2016, com o Obama II, serão 20.
O quase empate se verifica caso de estenda o levantamento ao século passado. Por lá, o voto é facultativo — como é na Venezuela, onde sucessivos golpes no processo eleitoral têm impedido a alternância no poder. Nicolás Maduro só é presidente porque houve, nesta ordem: a) um golpe legal, b) fraude eleitoral.
O quase empate se verifica caso de estenda o levantamento ao século passado. Por lá, o voto é facultativo — como é na Venezuela, onde sucessivos golpes no processo eleitoral têm impedido a alternância no poder. Nicolás Maduro só é presidente porque houve, nesta ordem: a) um golpe legal, b) fraude eleitoral.
Assim, não é o voto obrigatório ou facultativo que faz a qualidade da democracia. Eu até tendo a achar, contra as minhas convicções mais gerais, que o voto facultativo contribui para submeter o processo político a uma torção à esquerda porque as esquerdas são sempre mais organizadas do que os conservadores.
Mas e daí? Há, independentemente da questão ideológica, um fator de princípio: direito não é obrigação nem mesmo quando uma eventual imposição contribui para proteger o indivíduo da própria negligência.
O uso de cinto de segurança, por exemplo, é uma imposição — ainda que faça bem ao usuário. Mas continua a não ser um direito.
Mas e daí? Há, independentemente da questão ideológica, um fator de princípio: direito não é obrigação nem mesmo quando uma eventual imposição contribui para proteger o indivíduo da própria negligência.
O uso de cinto de segurança, por exemplo, é uma imposição — ainda que faça bem ao usuário. Mas continua a não ser um direito.
Pedro Simon (PMDB-RS) se saiu com outro argumento de impressionante fragilidade. Segundo ele, em cidades com eleitorado pequeno, poderia haver manipulação e tal. É mesmo, é?
Digamos que um coronel local pudesse dar uma grande churrascada para que pessoas deixassem de votar. Isso é diferente de, por exemplo, oferecer transporte gratuito para que votem? Ora… Taques disse a coisa certa: “Ou nós chegamos à conclusão de que o cidadão brasileiro está preparado para fazer opções ou vamos continuar numa atitude paternalista de que o cidadão precisa ser tutelado por aquele que é mais inteligente”.
Digamos que um coronel local pudesse dar uma grande churrascada para que pessoas deixassem de votar. Isso é diferente de, por exemplo, oferecer transporte gratuito para que votem? Ora… Taques disse a coisa certa: “Ou nós chegamos à conclusão de que o cidadão brasileiro está preparado para fazer opções ou vamos continuar numa atitude paternalista de que o cidadão precisa ser tutelado por aquele que é mais inteligente”.
Lamentável a decisão da CCJ e mais lamentáveis ainda os argumentos dos bons em favor de uma causa ruim.
03 de outubro de 2013
Reinaldo Azevedo - Veja
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