"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 8 de junho de 2019

EM BUSCA DO MÉTODO

Identificar a motivação de Bolsonaro para seus atos é uma tarefa desafiadora

“Apesar de isso ser loucura, há método nela”, escreveu Shakespeare. Quando se trata de Jair Bolsonaro, não temos muita dificuldade em identificar as loucuras, mas encontrar um método nelas é tarefa das mais desafiadoras.

O presidente atira para todos os lados. Ele representa a direita nacionalista, dirão alguns. Não duvido. Bolsonaro inscreveu o “Brasil acima de tudo” em seu dístico de campanha, ameaçou tirar o país de tratados internacionais, desconfia dos chineses e tem fixação pelo nióbio. Mas ele agora está falando em adotar uma moeda comum para o Mercosul, ideia das mais internacionalistas, que deveria causar arrepios em qualquer nacionalista legítimo.

Ele é um punitivista reacionário, proclamarão outros. De novo, a observação faz sentido. Bolsonaro acaba de vetar a única parte decente da nova lei sobre drogas, que permitiria a redução de até dois terços da pena para pequenos traficantes. Mas, quando tratou de trânsito, o presidente revelou-se um verdadeiro anarcolibertário, disposto a apagar qualquer traço de autoritarismo da lei.

Bolsonaro não está só. Gostamos de nos imaginar como seres coerentes que agem segundo princípios, mas não é o que se vê na prática. Até os blocos ideológicos, que deveriam guiar-se por ideias unificadoras, parecem ser incapazes de fazê-lo.

São bandeiras caras à esquerda, por exemplo, a liberação do aborto e das drogas e a condenação à pena de morte e ao porte de armas. Já a direita sustenta exatamente o contrário. Conciliar ambos os conjuntos de posições com uma narrativa linear exige ginástica mental. Se é o princípio da sacralidade da vida que prepondera, deveríamos ser contra os quatro pontos. Já a defesa intransigente da autonomia individual recomendaria a aprovação de todos.

O que torna Bolsonaro um caso único é que ele não parece obedecer nem a princípios, nem a alinhamentos históricos e nem ao oportunismo. Suas posições podem ser descritas como a resultante do caos.


08 de junho de 2019
Hélio Schwartsman
Folhba de SP

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