Em vez de guerra ideológica, precisamos de choque de gestão, sem tempo a perder.
De repente uma execução bárbara, e Marielle torna-se símbolo de qualquer rótulo que se queira pregar nela, em seu louvor ou seu apedrejamento. Enquanto viva, defendendo causas, exigindo ações, acertando aqui, errando ali, não me lembro de ter lido qualquer texto abordando sua luta, e a importância desta luta para o Rio encurralado. Nunca deparei nas redes sociais com alguém que a defendesse ou a atacasse. E, no entanto, não importa nas mãos de quem, as armas que a mataram há muito já disparavam contra cada carioca.
Estamos vivendo um momento trágico, em que o nosso estado agoniza e precisa de união de todos, acima das divergências, em defesa da causa maior. Marielles, Marias, Andersons, Antônios, universitários, operários. Marielles e Marias que temem levar filhos à escola ou ao parquinho, Andersons e Antônios que recebem seus salários atrasados e não têm outra fonte para sustentar suas famílias, Marielles brancas, negras, morenas, sem oportunidades pelo que não aprenderam na escola, Marielles com alta escolaridade e assim mesmo desempregadas pela estagnação econômica.
Quando fui sequestrado, decidi que, se saísse daquilo com vida, iria fazer o que pudesse por um Rio mais seguro e mais feliz. Libertado, me uni ao Movimento Viva Rio e promovemos um evento pela paz que reuniu 400 mil pessoas vestidas de branco e de emoção. Era um começo. Foi ali que entrou em minha história uma das pessoas mais admiráveis que já encontrei: o sociólogo Betinho. E ele me disse: “Roberto, passamos tempo demais sem nos conhecer”. Daí para frente, nossa cidade foi a nossa ponte.
Em vez de guerra ideológica, precisamos de um choque de gestão, sem tempo a perder. Não há bala de esquerda ou de direita. O direito de ir e vir foi usurpado por bandos de ladrões e assassinos. A população não pede favor para ser socorrida — exige! Não há um plano B para a intervenção federal na segurança pública. Não há dinheiro, competência administrativa ou liderança para substituí-la. Ela tem que ficar pelo tempo necessário para que as polícias recuperem sua capacidade de proteger a vida do cidadão. E é imperativo que receba todo o apoio do governo federal, do governo estadual e das vítimas em potencial, que chamamos de sociedade.
Teremos neste ano a oportunidade de escolher nossos representantes no poderes do estado e da República. Aproveitemos, com lucidez cidadã e sem desperdício do voto, esta oportunidade de nos reinventar. Acima de qualquer radicalismo, os valores que devem prevalecer na escolha são a capacidade de gestão e a honestidade, a criatividade e a coragem, a determinação e o bom senso.
Vamos olhar com lupa os candidatos, antes de decidir a quem delegaremos nosso poder de mudar. Vamos abrir espaço para ouvir o que as Marielles e Andersons de todas as classes e todos os lugares têm a dizer e a cobrar, antes que seja tarde demais. Vamos eleger um novo amanhã para nosso estado, com a firmeza da razão e a energia da esperança.
24 de março de 2018
Roberto Medina, O Globo
De repente uma execução bárbara, e Marielle torna-se símbolo de qualquer rótulo que se queira pregar nela, em seu louvor ou seu apedrejamento. Enquanto viva, defendendo causas, exigindo ações, acertando aqui, errando ali, não me lembro de ter lido qualquer texto abordando sua luta, e a importância desta luta para o Rio encurralado. Nunca deparei nas redes sociais com alguém que a defendesse ou a atacasse. E, no entanto, não importa nas mãos de quem, as armas que a mataram há muito já disparavam contra cada carioca.
Estamos vivendo um momento trágico, em que o nosso estado agoniza e precisa de união de todos, acima das divergências, em defesa da causa maior. Marielles, Marias, Andersons, Antônios, universitários, operários. Marielles e Marias que temem levar filhos à escola ou ao parquinho, Andersons e Antônios que recebem seus salários atrasados e não têm outra fonte para sustentar suas famílias, Marielles brancas, negras, morenas, sem oportunidades pelo que não aprenderam na escola, Marielles com alta escolaridade e assim mesmo desempregadas pela estagnação econômica.
Quando fui sequestrado, decidi que, se saísse daquilo com vida, iria fazer o que pudesse por um Rio mais seguro e mais feliz. Libertado, me uni ao Movimento Viva Rio e promovemos um evento pela paz que reuniu 400 mil pessoas vestidas de branco e de emoção. Era um começo. Foi ali que entrou em minha história uma das pessoas mais admiráveis que já encontrei: o sociólogo Betinho. E ele me disse: “Roberto, passamos tempo demais sem nos conhecer”. Daí para frente, nossa cidade foi a nossa ponte.
Em vez de guerra ideológica, precisamos de um choque de gestão, sem tempo a perder. Não há bala de esquerda ou de direita. O direito de ir e vir foi usurpado por bandos de ladrões e assassinos. A população não pede favor para ser socorrida — exige! Não há um plano B para a intervenção federal na segurança pública. Não há dinheiro, competência administrativa ou liderança para substituí-la. Ela tem que ficar pelo tempo necessário para que as polícias recuperem sua capacidade de proteger a vida do cidadão. E é imperativo que receba todo o apoio do governo federal, do governo estadual e das vítimas em potencial, que chamamos de sociedade.
Teremos neste ano a oportunidade de escolher nossos representantes no poderes do estado e da República. Aproveitemos, com lucidez cidadã e sem desperdício do voto, esta oportunidade de nos reinventar. Acima de qualquer radicalismo, os valores que devem prevalecer na escolha são a capacidade de gestão e a honestidade, a criatividade e a coragem, a determinação e o bom senso.
Vamos olhar com lupa os candidatos, antes de decidir a quem delegaremos nosso poder de mudar. Vamos abrir espaço para ouvir o que as Marielles e Andersons de todas as classes e todos os lugares têm a dizer e a cobrar, antes que seja tarde demais. Vamos eleger um novo amanhã para nosso estado, com a firmeza da razão e a energia da esperança.
24 de março de 2018
Roberto Medina, O Globo
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