"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

O JULGAMENTO DE LULA

Lula e seus adoradores querem que os brasileiros acreditem que está no banco dos réus não um homem comum, mas 'o maior líder popular da história deste país'

Em junho de 2009, quando José Sarney, então presidente do Senado, vivia o escândalo das nomeações de parentes e da criação de cargos por atos secretos, o então presidente da República, Lula da Silva, saiu-se com esta: “Sarney tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum”. Para o petista, Sarney não poderia, em razão de alegados bons serviços prestados à Nação, ser alvo de denúncias cabeludas como aquelas. À época, interpretou-se que a enfática defesa de Lula tinha como objetivo preservar o aliado Sarney, fundamental, segundo seu raciocínio, para blindar seu governo no Congresso e para levar o PMDB a apoiar a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, no ano seguinte.

Mas havia um outro objetivo, que agora, passados quase dez anos, se desenha nitidamente: Lula pretendia instilar no imaginário nacional a ideia de que há figuras políticas tão fundamentais para a história do País – a começar por ele próprio, é claro – que não podem ser tratadas como pessoas comuns, sujeitas aos rigores da lei.

É nisso que hoje Lula e seus adoradores querem que os brasileiros acreditem: que está no banco dos réus não um homem comum, mas “o maior líder popular da história deste país”, conforme costuma bradar seu séquito de bajuladores; logo, quem quer que decida investigá-lo, julgá-lo e eventualmente condená-lo só pode ser considerado um inimigo da pátria, do povo e da própria democracia.

É preciso deixar claro, de uma vez por todas, que quem estará sendo julgado hoje em Porto Alegre, pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, não é o grande redentor dos pobres, o demiurgo de Garanhuns, a viva alma mais honesta do País, e sim, simplesmente, um político condenado em primeira instância pelo crime de corrupção, que teve plenamente assegurada sua defesa e que recorre da sentença conforme lhe faculta o melhor direito.

Não se trata de uma questão moral, como querem fazer crer os petistas. Por esse critério, Lula já está condenado há muito tempo, desde que liderou um governo e um partido que mergulharam fundo na corrupção – protagonizando os maiores escândalos da história nacional e contribuindo decisivamente para a desmoralização da política – e desde que criou deliberadamente as condições para que o Brasil afundasse em recessão, inflação alta e desemprego.

Lula não está sendo julgado porque é líder das pesquisas de intenção de voto para presidente nem porque teria feito um governo para os pobres e contrariado as elites, como discursam os petistas. Lula está sendo julgado porque, conforme a sentença do juiz Sérgio Moro ora em revisão no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, “recebeu vantagem indevida” e “ocultou e dissimulou vantagem indevida recebida em decorrência do cargo de presidente da República”, no contexto “de um esquema de corrupção sistêmica na Petrobrás e de uma relação espúria entre ele o Grupo OAS”, razão pela qual “agiu (...) com culpabilidade extremada”. Moro acrescentou, como se necessário fosse diante da histeria petista, que, “em síntese e tratando a questão de maneira muito objetiva, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está sendo julgado por sua opinião política e também não se encontram em avaliação as políticas por ele adotadas durante o período de seu governo”.

Os petistas, contudo, são incansáveis na sua mendacidade. Os mesmos militantes e dirigentes do PT que já declararam sua integral solidariedade ao ditador venezuelano Nicolás Maduro consideram que está estabelecido no Brasil um “estado de exceção”. Segundo eles, essa “ditadura jurídico-midiática” começou com o “golpe” do impeachment de Dilma Rousseff e culminará com a eventual cassação do direito de Lula de se candidatar à Presidência. Logo, uma decisão contrária a Lula no julgamento de hoje será interpretada pelo departamento de agitprop petista como um crime de lesa-pátria e, por que não?, de lesa-majestade.

Felizmente, toda a arenga petista desde o impeachment não tem impressionado os que têm a tarefa de julgar os crimes cometidos durante os trágicos anos do PT no poder. A eles continua a caber somente uma missão: fazer cumprir rigorosamente a lei.


24 de janeiro de 2018
Editorial Estadão

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