Os jornais estão noticiando que a Procuradoria Regional Eleitoral no Rio de Janeiro solicitou que a Polícia Federal investigue denúncia do juiz da 100ª Zona Eleitoral de Campos dos Goytacazes, Glaucenir Silva de Oliveira, de que o ex-governador Anthony Garotinho e o filho dele Wladimir Matheus teriam oferecido R$ 1,5 milhão e R$ 5 milhões, por meio de terceiros, para influenciar o magistrado e evitar a prisão do ex-governador. O relato foi feito à Procuradoria Regional Eleitoral pelo próprio juiz Glaudecir, que na semana passado decretou a prisão preventiva do ex-governador e determinou a transferência dele do Hospital Municipal Souza Aguiar para o hospital penitenciário do Complexo Prisional de Gericinó, em Bangu.
ALGO ESTRANHO – De repente, surgiu algo muito estranho neste caso espetacular que envolve Anthony Garotinho. O procedimento do magistrado em relação a ele é altamente suspeito.
Na quarta-feira, o juiz Glaucenir determinou a surpreendente prisão do ex-governador. Até aí, tudo bem. Mas na sexta-feira, deu a colossal mancada de desrespeitar o laudo oficial dos médicos do Hospital Souza Aguiar, que haviam comprovado o problema cardíaco do paciente e indicado uma angioplastia para identificação mais precisa do diagnóstico. Todo juiz tem de agir com seriedade e sem precipitação, caso contrário pode causar anulação do processo.
A injustificada remoção do réu foi um impressionante abuso de autoridade. Fez lembrar o caso do juiz federal Flávio Roberto de Souza, que tomou a iniciativa de se apossar do Porsche de Eike Batista para uso próprio e depois foi afastado e aposentado por problemas mentais.
ESTRANHA ACUSAÇÃO – O mesmo juiz Glaucenir Silva de Oliveira agora denunciou ao procurador regional eleitoral Sidney Madruga que intermediários do ex-governador teriam procurado pessoas próximas a ele para suborná-lo. Primeiro, com R$ 1,5 milhão, e depois, R$ 5 milhões.
O juiz afirmou à Procuradoria que as propostas de propina foram feitas há cerca de um mês, mas somente resolveu fazer a denúncia agora, para não prejudicar as investigações e a operação em que mandou prender Garotinho.
É tudo muito estranho. Se realmente houve proposta de suborno, o magistrado tinha obrigação funcional de dar ordem de prisão ao criminoso, e esse fato agravaria implacavelmente a acusação contra Garotinho. Em caso de resistência, o juiz deveria chamar imediatamente a Polícia. No entanto, o juiz ficou passivo, embora tenha dito que depois até recebeu uma segunda tentativa de suborno, sem tomar a menor providência. E somente agora, um mês depois, é que se lembrou de fazer a denúncia.
JUIZ CONTRAVENTOR – Isso significa que durante um mês, o juiz incorreu em contravenção criminal, por descumprir o art. 66 (deixar de comunicar à autoridade competente crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício da função).
E a justificativa apresentada por ele à Procuradoria é pífia, porque nada impedia que fizesse a comunicação em caráter sigiloso, não existe impedimento legal quanto a isso, e o que a lei não proíbe pode ser praticado, qualquer estudante de Direito sabe disso. E a denúncia iria agravar, jamais prejudicar a acusação ao réu.
INVESTIGAR O JUIZ – Paralelamente à tramitação do processo judicial aberto contra Garotinho, o próprio juiz Glaucenir Silva de Oliveira precisa ser investigado pela Procuradoria Eleitoral e pela Polícia Federal. Seus procedimentos são temerários e injustificados, não somente por ter demorado um mês para fazer uma gravíssima comunicação de tentativa de suborno, cuja pena é reclusão de até 12 anos, mas também por ter desconsiderado o laudo médico oficial da maior instituição hospitalar do Estado.
O procurador Sidney Madruga agiu corretamente ao mandar a Polícia Federal investigar o caso, porque é preciso comprovar se realmente houve as tentativas de suborno. No entanto, o fato é que ninguém sabe mais o que está acontecendo, qualquer especulação se torna admissível e os advogados de Garotinho certamente irão arguir a suspeição do juiz, sob alegação de que estaria perseguindo o ex-governador.
ABUSO DE AUTORIDADE – De toda forma, uma coisa é certa – o procedimento desregrado e desastrado do juiz Glaucenir veio se tornar a maior demonstração de que é necessário haver uma lei que puna exemplarmente abuso de autoridade, conforme pretende o Congresso, incentivado pelo senador Renan Calheiros, vejam a que ponto chegamos, num país em que a Lei Orgânica da Magistratura praticamente garante a impunidade dos juízes, pois a condenação significa aposentadoria altamente remunerada e até direito de exercer a profissão de advogado, pois o registro na OAB não é cassado.
E foi esta lei corporativista, conhecida por Loman, que elevou à estratosfera os salários do Poder Judiciário. Num país como o Brasil, é revoltante saber que há juiz que pode receber mais de R$ 200 mil num só contracheque. É uma afronta à própria Justiça. Não existe esta remuneração para juiz em nenhum país do mundo.
21 de novembro de 2016
Carlos Newton
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