"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

CENÁRIO DE RECUPERAÇÃO LENTA ESTÁ CONSOLIDADO

Na segunda-feira passada (31), o Ibre apresentou o cenário macroeconômico para 2016 e 2017. Nenhuma grande novidade. O crescimento deste ano, após um terceiro trimestre pouco pior do que imaginávamos, foi revisto de -3,2% para -3,4%. Para 2017, mantivemos a previsão de leve crescimento de 0,6%.

Consolida-se o cenário de recuperação lenta. Muito diferente das três últimas recuperações cíclicas, em 2000, 2004 e 2010, quando, após os difíceis anos de 1999, 2003 e 2009, a economia reagiu e cresceu, respectivamente, 4,3%, 5,7% e 7,5%.

No Ibre, temos acompanhado diversos sinais qualitativos que sugerem que a retomada após a atual crise -que se iniciou no segundo trimestre de 2014 e, aparentemente, terminará no primeiro trimestre de 2017- será mais parecida com a crise da dívida externa dos anos 1980.

Os indicadores de sondagem das empresas -indústria, comércio, serviços e construção civil- mostram recuperação concentrada na melhora do indicador de expectativa empresarial. No entanto, o indicador da situação atual dos negócios não tem acompanhado o avanço observado no indicador de expectativa.

Adicionalmente, a melhora do indicador de expectativa tem sido fruto integralmente da queda de pessimismo entre os empresários, em direção a uma posição mais neutra. Diferentemente das três recuperações cíclicas mencionadas, o otimismo não tem aumentado.

Mais de uma vez lembrei neste espaço que a experiência intervencionista de 2009 até 2014 (alguns sinais começaram já em 2006) teve diversas semelhanças com o período militar, especialmente a partir do governo Geisel (1974-79).

O aprofundamento da crise a partir de 2015 -a queda do investimento que está na raiz dessa piora inicia-se no primeiro trimestre de 2014- ocorreu por exaustão de uma série de programas que tinham como premissa uma capacidade financeira ilimitada do Estado brasileiro: Tesouro, bancos públicos e empresas estatais. De forma parecida, o Segundo Programa Nacional de Desenvolvimento (PND) da era Geisel tinha como premissa capacidade ilimitada de captação de dívida externa.

Ambos os ciclos se esgotaram quando a realidade refutou a premissa. Nos anos 1980, a crise veio quando acabou a capacidade de endividamento externo em razão, principalmente, da alteração da política monetária norte-americana.

No atual ciclo, também há esgotamento financeiro: do Tesouro Nacional, que não consegue manter programas como o Minha Casa, Minha Vida; dos bancos públicos, que não conseguem manter eternamente linhas muito subsidiadas para que a Transpetro adquira navios a preços mais de duas vezes maiores do que os de mercado; ou das empresas estatais, como é o caso da Petrobras, que não consegue manter o ritmo de investimento, uma vez que sua dívida nos últimos sete anos foi multiplicada por cinco e sua produção de petróleo aumentou menos de 25%. Esse esgotamento explica a profunda queda do investimento.

Na indústria automobilística, em outro exemplo, o investimento caiu simplesmente porque temos um parque produtivo capaz de produzir 5 milhões de unidades por ano, para um mercado que absorve metade disso, e não somos capazes de competir com os asiáticos no mercado internacional.

A digestão das decisões equivocadas de investimento e das dívidas que foram constituídas, além da reconstrução da responsabilidade fiscal, que levará uma década, pelo menos, explica a natureza lenta desta recuperação. Não está e não será fácil.



08 de novembro de 2016
Samuel Pessôa, Folha de SP

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