O atual ministério é um deserto de homens e ideias, diria o estadista Oswaldo Aranha, e está ficando cada vez pior, porque os melhores ministros estão sendo afastados, por não aceitar interferências ilegítimas em suas pastas. O caso da demissão de Marcelo Calero, ministro da Cultura, é bastante sintomático. Na verdade, deve-se ressalvar que ele não se afastou exatamente por causa das pressões de Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo, de Eliseu Padilha, da Casa Civil, e do próprio presidente Michel Temer.
Calero estava até determinado a ficar e resistir às pressões, mas acabou se demitindo quando percebeu que o Planalto já havia montado uma campanha difamatória para desestabilizá-lo, exatamente como ocorrera meses atrás com o então ministro Medina Osório, da Advocacia-Geral da União, que também tinha sido pressionado pelo chamado “núcleo duro” do Planalto, comandado por Eliseu Padilha (Casa Civil) e Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo).
“INFORMAÇÕES FALSAS” – O depoimento de Calero à Polícia Federal foi bastante esclarecedor. Ele contou que, em seu último encontro com o presidente Temer, “tinha tomado conhecimento que estariam sendo ‘plantadas’ na imprensa informações desabonadoras e falsas a seu respeito; QUE o Presidente lhe disse que esse tipo de informações falsas eram comuns de serem divulgadas pela imprensa e ele mesmo já havia sido objeto delas; QUE por fim, o depoente disse ao Presidente que não se sentia à vontade para tomar qualquer decisão naquele processo, e assim despediu-se do Presidente”.
Marcelo Calero sabia que Medina Osório tinha sofrido uma implacável campanha difamatória, com notícias fabricadas contra ele e distribuídas para a imprensa pelo núcleo duro do Planalto, que agora Temer tenta amolecer. Inventaram que Medina Osório exigira um gabinete no Planalto, não se relacionava com a equipe técnica da AGU, perdera a ação da EBC (da qual nem participara), dera “carteirada” para voar em jatinho da FAB (notícia desmentida pelo Ministério da Aeronáutica), era nascisista e gostava de fumar charutos cubanos – coisas assim, fúteis e devastadoras.
Diante desse exemplo concreto, Calero ficou atento. Quando a campanha difamatória foi iniciada, decidiu abortá-la imediatamente, e a única maneira de conseguir era se demitindo.
NÚCLEO DURO – Essas campanhas difamatórias não tinham a participação de Temer, embora seu nome fosse usado com frequência. Eram montadas diretamente por Padilha e Geddel, como apoio do Secretário de Imprensa, Márcio de Freitas Gomes, que há 17 anos é funcionário do PMDB e assessora os caciques do partido, e do subsecretário Jurídico da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha, que há anos é advogado do partido.
Jornalistas de renome foram inadvertidamente usados contra Medina Osório. Recebiam as notícias “em off”, diretamente da cúpula do Planalto, e acreditavam que fossem verdadeiras. Somente depois que o ministro da AGU foi afastado é que vazou a informação de que tinha havido uma “armação” contra ele. E desde então muitos jornalistas de Brasília ficaram com um pé atrás, como se dizia antigamente.
Quando o Planalto começou a plantar notícias também contra o ministro da Cultura, houve estranheza. Ao invés de publicar as informações manipuladas, os jornalistas Natuza Nery e Paulo Gama, da Folha, foram ouvir Marcelo Calero. O ministro então percebeu que já estava sendo vitima de um processo difamatório idêntico ao de Medina Osório, e deu logo a explosiva entrevista que detonou Geddel e agora ameaça Padilha e o próprio Temer.
MÁQUINA DE DIFAMAÇÃO – Em setembro, Temer não gostou da demissão de Medina Osório, que saiu atirando e denunciou a Operação Abafa destinada a inviabilizar a Lava Jato. O presidente então aproximou-se mais de Moreira Franco, secretário do Programa de Parcerias de Investimentos, e começou a esvaziar o núcleo duro, com a recriação da Secretaria de Comunicação Social, diretamente subordinada à Presidência e dirigida pelo porta-voz Alexandre Parola.
Quase três meses depois, Temer consegue se livrar de Geddel por vias transversas, mas à custa de um desgaste enorme, e ainda falta defenestrar de Padilha e seus dois penduricalhos – Márcio Gomes e Gustavo Rocha, ambos ligados aos caciques do PMDB. Haverá mais desgaste. Porém, somente assim Temer conseguirá destruir a máquina de difamação que funciona no Planalto e poderá governar com mais tranquilidade, se é que tem realmente esse objetivo.
26 de novembro de 2016
Carlos Newton
Nenhum comentário:
Postar um comentário