Embora sejam suplementares ao sistema público de saúde, os planos médicos no Brasil investem mais no setor do que o governo federal no SUS (Sistema Único de Saúde). Este é o único caso no mundo, segundo estudo da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Por aqui, a parcela do orçamento federal destinada à saúde gira em torno 8,7%, diz o estudo. Esse número é menor do que a média dos países africanos (10,6%) e mundial (11,7%).
Mesmo assim, a situação era ainda pior em 2001, quando apenas 4,7% dos gastos públicos eram destinados ao setor.
O relatório da organização chegou à conclusão de que, exceto pelo Brasil, em nenhum lugar em que a saúde pública é universal o sistema privado investe mais. Ele é público e gratuito no Brasil, Argentina, Reino Unido, Suécia, Canadá, Alemanha, França e Cuba.
No Reino Unido, cujo modelo inspirou o SUS, 83% do dinheiro investido vêm do Estado. Mas até em países sem o sistema universal o gasto público supera o particular. Na Noruega essa proporção é de 86%, seguida por Luxemburgo (84%), Japão (80%), Turquia (75%), Colômbia (74%) e Uruguai (68%).
QUATRO VEZES MAIS
No Brasil, quando se compara os gastos federais com aqueles efetuados pelos planos de saúde, essa diferença fica evidente: os convênios investem quatro vezes mais do que a verba anual que o Ministério da Saúde destina ao SUS, per capita.
De acordo com a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), as operadoras desembolsaram R$ 90,5 bilhões em 2013 com pagamento de internações, consultas e exames de laboratórios para atender um total de 50 milhões de clientes. Este ano, o SUS recebeu da União R$ 91,6 bilhões para chegar a 200 milhões de pacientes.
Embora invista menos que os planos – autorizados para funcionar apenas como auxiliar ao SUS –, o Ministério da Saúde se defende afirmando que os recursos destinados a toda rede pública “mais que triplicaram nos últimos 11 anos”, uma vez que esse montante girava em torno de R$ 27,2 bilhões em 2003. Quando se corrige esse valor pela inflação do período, no entanto, o aumento equivale a 86%.
ATENDIMENTO UNIVERSAL
A maioria dos países opta por não adotar o atendimento universal. Nesse caso, o Estado paga apenas uma parte do que despendem as famílias, normalmente contratantes de planos médicos.
É assim nos Estados Unidos, onde os cidadãos escolhem seus planos por conta própria ou aderem a convênios empresariais.
O Estado também prepara programas públicos especiais, como o Medicare, destinado à terceira idade, e o Medicaid, para pessoas de baixa renda. Além desses grupos, só os veteranos das forças armadas têm garantida saúde de graça.
93% REJEITAM O SUS
Presidente da Associação Paulista de Medicina (APM), o médico Florisval Meinão atribui à falta de investimento público uma das razões para o resultado de uma pesquisa encomendada pela associação ao Datafolha, que em agosto último revelou que 93% da população estão insatisfeitos com o SUS. “O usuário tem essa percepção de que falta dinheiro.”
Diretor executivo da Abramge (Associação Brasileira de Medicina de Grupo), Antônio Carlos Abbatepaolo acredita que o baixo investimento em saúde pública prejudica também o setor privado, que acabaria assumindo atendimento básico, que deveria ser todo ele realizado pelo SUS. “Com mais dinheiro público, os planos participariam em áreas de alta complexidade e atendimento especializado.”
O presidente da APM concorda. Meinão sugere que o SUS aumente os repasses, hoje em R$ 10,1 bilhões, para o programa Saúde da Família – equipes compostas por médicos, enfermeiros e agente de saúde que fazem atendimento preventivo em domicílio. “A atenção primária detecta precocemente doenças, diminui os agravos, emergências e reduz a procura por pronto-socorro e cirurgias reparadoras.”
PLANOS DE BAIXO CUSTO
Para o médico, a União vem incentivando a comercialização de planos de baixo custo para diminuir a necessidade de colocar mais dinheiro no setor. O resultado, diz ele, é que essas operadoras também são mal avaliadas.
“O sistema privado coloca muitos obstáculos para realizar exames de alta complexidade, cobra caro pelos serviços e remunera muito mal os profissionais e hospitais”, diz ele. “Em alguns casos, paga-se tão pouco que o médico prefere não operar.”
10 de novembro de 2014
Wanderley Preite Sobrinho
iG São Paulo
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