Causa desalento e surpresa a renúncia do ministro Joaquim Barbosa de suas obrigações jurisdicionais no tocante à execução das condenações impostas aos réus do processo do “mensalão”.
Desalento, porque Barbosa se revelou magistrado com braço forte e comprometido com a celeridade processual e com votos isentos, enérgicos e corajosos, como todos dele esperávamos.
Surpresa, porque a renúncia é inédita, ao menos do âmbito do Poder Judiciário e em face das leis, que em nenhuma passagem empregam o verbo renunciar, próprio do mundo político, ou da politicagem.
IMPEDIMENTO OU SUSPEIÇÃO
As legislações referentes ao Direito Processual e à magistratura não falam em “renúncia” de magistrado quanto às atribuições a ele próprias e inerentes à frente dos processos que preside.
A recusa às funções e deveres que são impostas ao magistrado pode ocorrer, no início e no curso do processo, que abrange e alcança a execução do que foi disposto na sentença. Mas a denominação jurídica é outra.
A não ser que a mídia esteja chamando o ato de Barbosa de renúncia, para fins apenas jornalísticos e facilitar a compreensão do leitor leigo, o nome correto é impedimento ou suspeição.
O QUE DIZEM AS LEIS
As legislações, ao cuidarem da impossibilidade de um juiz exercer suas funções no processo contencioso ou voluntário, permitem que o magistrado recuse presidir o processo por vários motivos. Um deles é o “motivo íntimo“, a respeito do qual o magistrado nem precisa dizer qual seja. Basta justificar o “foro íntimo”.
O motivo apresentado por Joaquim Barbosa deixa de ser “motivo íntimo”, pois o ministro tornou pública a razão do seu afastamento. Disse Barbosa que os advogados dos condenados passaram a atuar politicamente no processo por meio de insultos e manifestações pessoais. E citou o fato envolvendo Luiz Fernando Pacheco, advogado de Genoíno. Descartada esta causa (“foro íntimo”) para o autoafastamento do ministro, vejamos as demais previstas nas leis.
OS CÓDIGOS, DE PROCESSO PENAL E PROCESSO CIVIL
Ambos, o CPP (Código de Processo Penal) e o CPC (Código de Processo Civil) apresentam causas semelhantes:
1) ser amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes;
2) se alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou parentes até 3º grau;
3) ser o juiz herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes; 4) receber dádivas, antes ou depois de iniciado o processo;
4) dar conselhos a alguma das partes, no tocante ao objeto da causa, ou contribuir para as despesas do litígio;
5) for interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes;
6) se um parente seu tiver funcionado no processo, como defensor, advogado, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
7) se o próprio juiz houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha;
8) se parente seu, até 3º grau, for parte ou tiver interesse no feito. Registre-se o artigo 256 do CPP, textualmente:
“A suspeição não poderá ser declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la”.
A LEI DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O Regimento Interno do STF (RISTF) também cuida do Impedimento e da Suspeição dos seus ministros. Diz que eles devem se declarar impedidos ou suspeitos “nos casos previstos em lei” (art. 277). E casos previstos em lei são aqueles exauridos nos Códigos, de Processo Penal e Processo Civil. O RISTF não institui nenhum outro motivo, a não ser os “previstos em lei”.
Logo, conclui-se: a ligação de amizade, inimizade, sucessão, dívida-e-crédio, aconselhamento, parentesco é do juiz, ou parente seu, com a parte. Não, com o advogado da parte. Até mesmo a injúria lançada contra o juiz deve partir da parte (CPP, art. 256).
E ainda: nenhuma das leis utiliza o verbo renunciar, autorizativo para que um juiz se afaste do processo. Os nomes jurídicos próprios são Impedimento e Suspeição.
ROMA LOCUTA, CAUSA FINITA
Seja como for (Renúncia, no lugar de Impedimento e Suspeição), o certo é que Joaquim Barbosa deixa o comando da execução das penas impostas aos réus do mensalão, para o desgosto geral da nação.
E que seu sucessor neste ofício, Luis Roberto Barroso, não permita que o povo sinta saudade de Barbosa. E que a seleção de futebol chegue à final e vença. Porque se não se classificar ou acabar vice-campeã, o desastre desse meado de 2014 será total e completo.
18 de junho de 2014
Jorge Béja
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