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Quando um indivíduo declara: “o que eu quero mesmo é aproveitar a vida”, ele está dizendo, com todas as letras, que o centro de sua vida é seu gozo carnal e que o resto ficará em segunda ordem.
É muito mais fácil dominar um homem pelos seus vícios do que pelas suas virtudes. Esse ensino é de Napoleão Bonaparte e, diga-se de passagem, ele sabia muito bem do que estava falando. E é por isso que hoje tanto se estimula o cultivo e a busca dum bem secundário como o prazer carnal.
Se a afirmação atávica da saúde, como bem primeiro na escala de valores, deixa os indivíduos desfibrados, a afirmação da busca do prazer como razão primeira da existência, os reduz a condição de meros escravos crendo candidamente que uma vida hedonista seria a forma mais virtuosa de se caminhar por esse vale de lágrimas.
Quando um indivíduo declara: “o que eu quero mesmo é aproveitar a vida”, ele está dizendo, com todas as letras, que o centro de sua vida é seu gozo carnal e que o resto ficará em segunda ordem. E olhe lá! Tal frase, dita tantas vezes pelas estradas da vida, bem retrata a mentalidade decadente da sociedade contemporânea.
Doravante, a vida política num tal estado de coisas torna-se um reles joguete utilitarista/hedonista que reduz o bem-público a uma mera fatia de satisfação momentânea. Trocando por miúdos: quando hoje se fala em bem comum, está-se falando apenas de qual parte cabe a cada um desse latifúndio para que possamos tornar mais “legal” a mesquinha vida (depre)cívica brasileira.
Não é por menos que o desejo, no mundo atual, tornou-se uma fonte de direitos. Mais que isso! Foi elevado à categoria de eixo axiológico na edificação duma identidade grupal. Desejos, hoje, são bandeiras políticas que são histericamente tremuladas nas ruas e praças e que, aos olhos dos manifestantes, seria apenas uma forma estética de manifestação democrática.
De mais a mais, Alexis de Tocqueville nos diz que uma democracia, para ser vivida, deve cultivar a crença em idéias comuns. Idéias que permitam a edificação duma ação comum que tenham em vista o dito bem comum. Pois é, mas desejos miúdos não são idéias comuns, mesmo que esses sejam partilhados por muitos.
Todos os tempos que nos antecederam sabiam disso, mesmo não conhecendo a tal da democracia. Mas o nosso, ao que tudo indica, faz questão de esquecer, de modo similar as personagens de Aldous Huxley e George Orwell.
E, tal esquecimento, tem um preço: o despotismo duma minoria que crê representar uma maioria na defesa de delírios como se esses fossem direitos humanos universais legitimando, assim, as intenções totalitárias doutro grupo que muito bem sabe dominar as almas enfraquecidas pelo cultivo e elogio dos mais rasteiros vícios presentes no coração humano. Ponto.
N.do E.: O soma, referido no título do artigo, é, no romance Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, uma droga que causava um torpor reconfortante no usuário. Para qualquer leve susto, surpresa desagradável, e, principalmente, reflexões mais dolorosas sobre real condição do ser humano naquela horrível realidade, todos eram adestrados para consumi-la de forma imediata e sempre recomendá-la com vigor.
25 de dezembro de 2013
Dartagnan da Silva Zanela
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