"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

FELIZ NATAL, QUEIRAM OU NÃO

                  
          Artigos - Cultura 
ifPor mais que me esforce, não consigo imaginar como se faz para desejar “Feliz Natal” contra alguém. Mesmo que estejamos nos dirigindo a um cidadão que rejeita o nosso Cristo com todas as suas forças, o que lhe ensejamos com essas palavras, já que ele não quer os benefícios da vida futura, é que pelo menos desfrute de alguma paz e bem-estar na sua casa enquanto, na nossa, celebramos o Advento do Salvador sem incomodá-lo no mais mínimo que seja e até pensando alguma coisa em seu favor durante as nossas orações.
 
No entanto, de uns tempos para cá um vasto grupo de ateístas militantes, escorado em organizações bilionárias e no apoio da grande mídia, decidiu fingir que se sente mortalmente ofendido quando assim o cumprimentamos. Quando em vez disso um deles nos diz “Boas Festas”, o sentido da sua mensagem é claro: “Vá para o diabo com o seu Natal, o seu Cristo e toda a sua maldita religião.
Esconda-a, pratique-a nas catacumbas mas tire essa coisa hedionda da minha frente.”
 
Subentende-se que, saudados com tamanha gentileza, devemos retribuir desejando para o nosso interlocutor uma pletora de bens deste mundo e total despreocupação quanto à existência do outro. Se em vez disso você insiste em responder com “Feliz Natal”, terá de fazê-lo com plena consciência de que essas duas palavrinhas fatídicas serão ouvidas como uma declaração de guerra.
É assim que, neste como em outros casos, o sentido do que dizemos já não depende da intenção com que o fazemos, mas do propósito imaginário que um fingidor histérico nos atribui. Como ele nos odeia, tem de fazer de conta que a nossa gentileza é uma ofensa intolerável.
 
Essa inversão projetiva – talvez o mais clássico sintoma da histeria -- é minha velha conhecida. Uns dez anos atrás, um grupo de moleques enfezados criou no Orkut uma comunidade de nome “Nós odiamos o Olavo de Carvalho”, onde espalhavam a meu respeito as histórias mais medonhas, me atribuíam toda sorte de crimes e baixezas e vasculhavam a vida da minha família em busca de pecados escabrosos.
 
Tudo, é claro, sob o pretexto de “debate democrático”, com o direito suplementar de queixar-se de “ataques ad hominem” quando, uma ou duas vezes numa década, eu lhes dava um minuto de atenção e os mandava pastar.
Quando a virulência da coisa chegou ao nível da loucura pura e simples, trocaram o nome da página para “O Olavo de Carvalho nos odeia”, para dar a impressão de que era eu, de algum modo misterioso, o autor das suas ações, a fonte misteriosa do ódio que despejavam sobre mim.
 
O caso, em si, não tem a mais mínima importância, mas, se isso não tivesse me acontecido, talvez eu não compreendesse tão claramente quanto compreendo hoje o mecanismo psicopatológico que inverte o sentido do cumprimento natalino e lhe atribui uma intenção odienta no ato mesmo de cobri-lo de ódio.
O mesmo mecanismo está em ação, é óbvio, quando alguém ateia fogo numa igreja, urina no altar, bolina uma criatura do seu mesmo sexo durante a missa ou enfia um crucifixo no ânus para provar, com lógica insuperável, que o cristianismo é uma “religião de ódio”. 
 
Como o raciocínio histérico se disseminou na nossa sociedade ao ponto de servir de modus argumentandi exemplar e obrigatório em teses universitárias, debates parlamentares e opiniões eruditíssimas expressas em artigos de jornal, é previsível que em breve o sentido insultuoso da expressão “Feliz Natal” será consagrado em lei e essas duas palavras só poderão ser ditas em recinto fechado, entre pessoas que tenham previamente assinado um disclaimer isentando de qualquer responsabilidade penal o desalmado que ouse pronunciá-las.
 
Por enquanto isso é só uma tendência, uma possibilidade que talvez possa ser afastada. Mas certamente não o será se os cristãos, antecipando-se servilmente aos planos do opressor, consentirem em limitar-se ao genérico e vazio “Boas Festas” para não ferir suscetibilidades fingidas.
Portanto, aqui vão os meus votos: Feliz Natal para todos, aí incluídos os que não o desejam.

olavo
 
25 de dezembro de 2013Olavo de CarvalhoPublicado no Diário do Comércio. 

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