A eleição deste ano transcorrerá num clima antipolítico como há muito não víamos
Um fato que chama a atenção na presente conjuntura eleitoral é o grande número de eleitores indecisos ou que falam em anular o voto ou se abster, simplesmente. Estamos em meados de agosto e a proporção dos que se encontram em tal situação é de cerca de 60%, segundo as pesquisas.
É razoável admitir que pelo menos 30% manterão tal opção, com o que o porcentual de votos válidos não irá além de 70%. E mais: em todas as camadas sociais, esse amplo contingente de eleitores está permeado por uma atitude de hostilidade às instituições e aos políticos de uma maneira geral. Ou seja, a eleição deste ano transcorrerá num clima antipolítico como há muito não víamos.
As causas principais desse clima são facilmente identificáveis. De um lado, o País vive ainda as sequelas da pior recessão de nossa história; 13 milhões de trabalhadores amargam o desemprego e no mínimo outro tanto já desistiu de procurar trabalho ou se acomodou a ocupações de baixa qualidade e baixa remuneração.
As causas principais desse clima são facilmente identificáveis. De um lado, o País vive ainda as sequelas da pior recessão de nossa história; 13 milhões de trabalhadores amargam o desemprego e no mínimo outro tanto já desistiu de procurar trabalho ou se acomodou a ocupações de baixa qualidade e baixa remuneração.
Ou seja, o legado do governo Dilma continua forte, projetando sua sombra na esfera político-eleitoral. Do outro lado, a trama finalmente desvendada da corrupção arquitetada por Lula e pelos partidos que a ele se associaram mais estreitamente atingiu uma amplitude inédita, um conluio que nem os mais pessimistas com o Brasil poderiam ter imaginado, envolvendo entre setores do empresariado e a maior parte do espectro partidário.
A esses dois fatores é necessário acrescentar o patético comportamento dos dirigentes institucionais do País, que não chegaria a surpreender se estivesse ocorrendo só no Legislativo, mas que se manifesta com a mesma intensidade entre os integrantes dos tribunais superiores.
No próprio Supremo Tribunal Federal (STF), os ministros se desentendem com frequência e violam pontos cristalinamente definidos na Constituição e na jurisprudência, deixando a sociedade na iminência de uma grave insegurança jurídica. Mais ainda, enquanto a área econômica do governo faz das tripas coração para manter um mínimo de ordem nas contas públicas, o próprio tribunal, ápice da pirâmide judiciária, dá as costas ao País e aumenta seus vencimentos em 16%, decisão temerária, fadada a provocar um efeito-cascata noutras instituições.
Não há como avaliar o processo eleitoral sem levar em conta o pano de fundo acima esboçado.
A questão central é se a atitude antipolítica a que me referi desembocará num pleito radicalizado, raivoso, irracional, ou, ao contrário, se em algum momento os cidadãos sentirão raiva da própria raiva, encaminhando suas opções individuais para um desfecho mais convergente que divergente.
Não há como avaliar o processo eleitoral sem levar em conta o pano de fundo acima esboçado.
A questão central é se a atitude antipolítica a que me referi desembocará num pleito radicalizado, raivoso, irracional, ou, ao contrário, se em algum momento os cidadãos sentirão raiva da própria raiva, encaminhando suas opções individuais para um desfecho mais convergente que divergente.
Pelo menos por enquanto, parece inútil tentar responder tal indagação com base no discurso dos candidatos, dados a qualidade apenas mediana dos postulantes e o escasso conteúdo programático dos debates realizados.
A hipótese da convergência requer, portanto, algum otimismo sobre o desenrolar da própria campanha eleitoral. Em condições razoavelmente normais, é plausível supor que mesmo uma situação de tensão, depressão e indiferença possa ser em parte atenuada pelo ciclo eleitoral.
A hipótese da convergência requer, portanto, algum otimismo sobre o desenrolar da própria campanha eleitoral. Em condições razoavelmente normais, é plausível supor que mesmo uma situação de tensão, depressão e indiferença possa ser em parte atenuada pelo ciclo eleitoral.
Esse é o milagre que o processo democrático às vezes produz. A expectativa de um novo governo e uma nova composição no Legislativo pode, em tese, instilar um novo ânimo na sociedade. Até o momento, não há indícios de que isso esteja acontecendo. É certo que a campanha ainda não começou de verdade e que nenhum dos candidatos possui o que se poderia chamar de carisma (seja qual for o real significado desse termo) positivo, quero dizer, uma capacidade de empolgar os eleitores na justa medida em que lhes aponte um futuro melhor.
Jair Bolsonaro, tido como o mais carismático deles, é mais um reflexo das condições de insegurança e raiva disseminadas na sociedade que um líder capaz de as reverter. Lula, na remota hipótese de se tornar elegível, provavelmente produziria o efeito oposto, acirrando ainda mais os ânimos. Se o candidato petista for, como parece, o ex-prefeito Fernando Haddad, sim, teríamos um personagem de perfil moderado - moderado até demais, para o gosto do petismo. Não me arrisco a tentar prever o montante de votos que Lula será capaz de lhe transferir, mas por ora não creio que seja o suficiente para levá-lo ao segundo turno.
Ficará, provavelmente, num patamar próximo ao de Marina Silva, com ela compartilhando uma condição minoritária no Congresso, talvez tendo sobre ela melhores condições de conviver com o chamado “presidencialismo de coalizão”. Os demais - Ciro Gomes, Álvaro Dias, João Amoêdo e Guilherme Boulos - por certo terão uma função importante como partícipes do debate democrático, mas nada sugere que atinjam índices eleitorais robustos. Se as conjecturas acima estiverem certas, o mais provável, então, é que o segundo turno contraporá Alckmin a Bolsonaro.
Resumindo, fato é que o Brasil, quando mais precisa de candidatos à altura dos desafios já postos sobre a mesa, vive uma entressafra de líderes. A geração que conduziu a luta pela redemocratização em sua maioria já se foi, e uma nova ainda não se delineou, prestes a entrar em cena.
Do que acima se expôs, o que podemos extrair é, portanto, o imperativo de uma metódica sobriedade. Com os dados de que ora dispomos, a única previsão possível é a de que o próximo governo enfrentará difíceis problemas de governabilidade.
Resumindo, fato é que o Brasil, quando mais precisa de candidatos à altura dos desafios já postos sobre a mesa, vive uma entressafra de líderes. A geração que conduziu a luta pela redemocratização em sua maioria já se foi, e uma nova ainda não se delineou, prestes a entrar em cena.
Do que acima se expôs, o que podemos extrair é, portanto, o imperativo de uma metódica sobriedade. Com os dados de que ora dispomos, a única previsão possível é a de que o próximo governo enfrentará difíceis problemas de governabilidade.
Com a possível exceção do ex-governador Alckmin, os demais candidatos terão de se virar com uma base congressual exígua, insuficiente até em termos nominais; ou seja, serão governos de minoria. E nada, rigorosamente nada - salvo um súbito estalo de altruísmo -, nos autoriza a imaginar que um Congresso escassamente renovado possa oferecer ao Executivo o nível de colaboração de que ele necessitará para levar avante uma agenda de reformas modernizadoras.
21 de agosto de 2018
BOLÍVAR LAMOUNIER É SÓCIO-DIRETOR DA AUGURIUM CONSULTORIA, MEMBRO DAS ACADEMIAS PAULISTA DE LETRAS E BRASILEIRA DE CIÊNCIAS E AUTOR DO LIVRO ‘LIBERAIS E ANTILIBERAIS’ (COMPANHIA DAS LETRAS, 2016)
in O Estado de S.Paulo
21 de agosto de 2018
BOLÍVAR LAMOUNIER É SÓCIO-DIRETOR DA AUGURIUM CONSULTORIA, MEMBRO DAS ACADEMIAS PAULISTA DE LETRAS E BRASILEIRA DE CIÊNCIAS E AUTOR DO LIVRO ‘LIBERAIS E ANTILIBERAIS’ (COMPANHIA DAS LETRAS, 2016)
in O Estado de S.Paulo
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