Por mais que a eficácia da propaganda gratuita em TV seja relativa, a disparidade entre os tempos dos candidatos é uma aberração antidemocrática. Nem ao menos decorre das proporções da representação partidária, pretendidas pela legislação. Em casos como o de Geraldo Alckmin, a desproporção é produto de transações espúrias que associam partidos, seus tempos e ainda as quantidades de inserções. Mas desde logo custam muito ao eventual governo futuro e ao país.
Quarto colocado no mais recente Datafolha, mascando insossos 6%, Alckmin dispõe, no entanto, de mais tempo de TV do que a soma de todos os outros exceto João Amoedo e João Goulart Filho. Seu tempo é feito pelo novo centrão, do PSDB com DEM, PP, PPS, PTB, PR, PSD, SD e PRB. São 5min32s de Alckmin contra 2min23 de Lula (ou de Haddad), 40s de Alvaro Dias, 38s de Ciro Gomes, 21s de Marina Silva e 8s de Bolsonaro —hoje os de melhor posição nas pesquisas.
DESIGUALDADE – Os tempos já dizem muito, mas não dizem tudo sobre a desigualdade das condições na disputa eleitoral. Os números de inserções, nos 35 dias de propaganda gratuita na TV, trazem outra disparidade. Para aqueles mesmos candidatos, serão 434 de Alckmin, 189 de Lula, 53 de Alvaro Dias, 51 de Ciro Gomes, 29 de Marina Silva, que chega a ficar de fora no equivalente a uma semana de propaganda, e 11 de Bolsonaro, com presença que não alcança um terço dos dias de transmissão. A diferença é brutal.
Alckmin não inova nesse sistema eleitoral repleto de deformações, repetidas a cada eleição. Joga como sempre foi o jogo dos que se aliam a qualquer um, sem se apegar a exigências contrárias à ambição. Se dava para fazer o negócio, fez. A disparidade excessiva daí resultante, porém, tornou mais obscuras as possíveis propensões dessa disputa eleitoral. Ao menos até uma ou duas semanas de propaganda na televisão.
UMA MEXIDA – Com o tempo de que dispõe contra o tempo de que os outros mal dispõem, e partindo de tão baixo, Alckmin deve provocar uma mexida nos percentuais de vários candidatos. Nada, quase com certeza, apenas entre os graníticos apoiadores de Jair Bolsonaro. Do qual, a arriscar agora um palpite, digo que não merece maior preocupação.
É o que sugere o Datafolha sobre a preferência partidária no eleitorado: o PT é o único dos grandes a crescer. Dos 19% que tinha em junho, subiu para 24%, o que significa um quarto dos eleitores. Aí está o potencial para Fernando Haddad, se Lula ficar impedido, fazer frente a Bolsonaro. Era o que faltava, estando indicado pelo Datafolha que nenhum dos outros principais concorrentes seria vencido, no caso de segundo turno, pelo representante do extremismo direitista. Já é alguma coisa para um sistema eleitoral antidemocrático.
27 de agosto de 2018
Janio de Freitas
Folha
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