A desgraça do Rio de Janeiro vem de longe. Muito longe. Seus mais de 100 policiais mortos em combate nesse ano de 2017 exibem um retrato, trágico e incompreensível, de uma das faces da realidade cruel da outrora Cidade Maravilhosa. Vivemos hoje numa cidade e num Estado que quase nada funciona direito. A Polícia é a instância mais recorrida pelos moradores. Aqui se chama a polícia para tudo. Um soldado da PM é sobretudo um especialista em gente.
O carioca se socorre da PM para fazer parto, separar briga de vizinhos, coibir abusos de comportamento, de falta de educação, para retirar casa de abelhas, de maribondos e até socorro a velhos, inválidos e animais. Trocar tiros com bandidos é apenas uma de suas missões diárias. Quer saber mais? Busque uma pesquisa de um dia no número 190, o telefone de socorro policial posto a serviço da população.
RIO CAUDALOSO – Essa dura realidade é a foz de um caudaloso Rio de problemas. Foi uma cidade maravilhosa até os anos setenta do século passado. A desgraça começa no governo Juscelino Kubistchek. Ele construiu Brasília e levou a sede do governo federal. O Rio de Janeiro era uma cidade Estado. Como Singapura. Fácil de governar, compreendia apenas o Estado da Guanabara.
Cercada de praias e montanhas foi o cenário perfeito para políticos, poetas, intelectuais, artistas, pintores, escritores, vagabundos e putas. Toda essa malta constituía a mais fina flor da cultura nacional. A Guanabara era o centro irradiador de uma fulgurante constelação de inteligência e assim permaneceu após a saída do governo federal. O Governo se foi sem um planejamento de longo prazo para a cidade. Não houve prazos para tirar o estamento burocrático federal do Rio de Janeiro. Aqui ele permaneceu e ainda hoje se encontram fragmentos dessa casta. Mas o orçamento gordo da República foi embora.
LACERDA SURPREENDEU – Ainda daria sorte o Estado da Guanabara. Em sua primeira eleição venceu a figura excêntrica do jornalista Carlos Lacerda. De repórter, comentarista e jornalista político, acabou se transformando no maior administrador urbano que o país já viu. Em poucos anos rasgou a cidade com obras monumentais que não só trouxeram conforto e progresso para a população, como também beleza, estética e elegância para um cenário deslumbrante.
Removeu favelas inteiras e criou parques fascinantes. Dotou a cidade de um sistema de abastecimento de água que ainda hoje socorre sua população. A cidade se bastava. Jorrava alegria e cultura. Lacerda saiu do governo endeusado. Sonhava ser candidato a Presidente da República. Deixou no cargo o seu vice o brilhante advogado Raphael de Almeida Magalhães, esse outro vulcão em inteligência e amor à cidade. Coube a ele arrematar o que Lacerda empreendeu.
PÓS-1964 – Aí veio 1964, Lacerda foi cassado, Juscelino também e a Guanabara passou a ser governada pelo diplomata Negrão de Lima. Vai entender essa gente… Negrão foi eleito contra o candidato de Carlos Lacerda, o professor Flexa Ribeiro. Aquele que tudo fez para tornar o Rio moderno não conseguiu fazer o seu sucessor. Negrão de Lima fez um governo elegante e burocrático tal qual sua figura. Mas era apoiado pela esquerda.
Daí fortaleceu o mito e a corrente de pensamento ideológico que iria dominar o pensamento e a cultura da cidade após 1964. Até o final do governo Médici, a Guanabara brilhava no cenário nacional. Não por questões ideológicas, mas os militares, através do Presidente Ernesto Geisel, é que iriam plantar a semente e pavimentar o caminho para o caos no Rio de Janeiro. Isso fica para depois, em outro artigo.
24 de setembro de 2017
Hildeberto AleluiaBlog Aleluiaecia
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