Como psicóloga e educadora, acredito que qualquer situação trágica obrigatoriamente leva a uma condição ambivalente: causa intenso sofrimento e possibilita crescimento, melhoria na consciência individual e coletiva. O caso José Mayer é exemplo disso. Não posso, como mulher e mãe (de um homem e uma mulher adolescentes) concordar com apologias à punição quando o problema do machismo vai além do universo masculino. A sociedade é responsável pelo machismo. A sociedade inclui homens e mulheres. O feminismo historicamente tem um papel primordial na autonomia da mulher. Isso não está em questão. O problema é quando há extremismo na contraposição ao machismo que se converte em oposição ao masculino (se inverte dominação masculina em dominação feminina).
É fato que a exploração da mulher ultrapassa o tempo, ressignifica-se na violência, na exploração e na impotência feminina frente à força do modelo do patriarcado ocidental (na Grécia antiga a mulher sequer possuía alma), além disso, nunca é demais ressaltar o alto índice de feminicídio no país. Que jamais ignoremos essa realidade bárbara.
O que tudo isso tem a ver com o assédio de José Mayer a uma mulher “branca e bonita” (palavras da própria)? Significa que, independente dos argumentos, a denunciante Su Tonani tomou a decisão correta de denunciar o abuso. Mas isso não pode se transformar em motivo para se fazer apologia à penas de morte simbólica do denunciado.
NATUREZA SOCIAL – Explico, essa experiência traumática e bárbara só poderá ser revertida se possibilitar uma profunda reflexão sobre a natureza social do gênero humano feminino e masculino. José Mayer errou e pelo visto não foi o primeiro caso, mas agiu corretamente em argumentos ao se manifestar por carta pedindo desculpa. Foi também uma atitude corajosa de um homem que viveu uma geração em que a mulher era muito mais desvalorizada do que o é hoje.
Uma leitura atenta da carta de Mayer levará a uma percepção do significado da denúncia como elemento de formação e aprendizagem. Depois da denúncia de Su Tonani, ele não poderia ter atitude mais correta. Nós mulheres, não podemos perder de vista que criamos os homens culturalmente e organicamente. Nossa responsabilidade nessa formação se duplica no que diz respeito à formação de valores.
MACHISMO – O machismo reflete a cultura de um tempo (ou tempos) da força sobre a sensibilidade. A mulher é uma figura enigmática ao mundo masculino, representa o sagrado e profano, a origem mater da vida. Isso por si, se não trabalhado, causa sentimentos ambivalentes ao universo masculino. A muitos homens a figura feminina ameaça como sendo de um poder indefinível. É compreensível que muitos homens, em uma mentalidade retrógrada e primitiva, manifestem seus medos em relação à mulher agredindo-a e diminuindo-a. Mas não é aceitável. Ainda assim, prefiro pensar como a filósofa Hanah Arendt, para quem em qualquer circunstância a que se submete o julgamento pela punição ou condenação é preferível a reflexão profunda sobre o problema, no sentido de superá-lo como exemplo de aprendizagem e crescimento.
Parabéns à Su Tonani pela coragem de denunciar e abrir o debate. Parabéns a José Mayer por ter reconhecido seu erro primitivo e fazer de sua tragédia pessoal exemplo para muitos jovens de como não se deve tratar uma mulher.
10 de abril de 2017
Silvia Zanolla
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