Os jornalistas erram quando insistem em dizer que os melhores amigos do presidente Michel Temer são o ex-assessor José Yunes e o ainda ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil. Já houve tempo em que essa assertiva era verdadeira. Desde setembro, porém, quando entraram em rota de colisão, Padilha e Temer apenas se toleram, mas só nas aparências, em meio ao festival de cinismo e hipocrisia que caracteriza os bastidores do poder. Agora, pode-se dizer que os melhores amigos do presidente são o ex-assessor José Yunes e o neoministro Moreira Franco (e rigorosamente nessa ordem).
É preciso ser muito ingênuo para acreditar que Yunes resolveu prestar depoimento voluntário e dar declarações altamente comprometedores contra Padilha (de quem já foi amigo pessoal), sem antes ter combinado tudo minuciosamente com o presidente Temer.
QUAL A RAZÃO – Em tradução simultânea, alegar-se-ia (olha a mesóclise aí, gente!) que Yunes tomou a desesperada providência com medo de ser preso pela Lava Jato, a exemplo do que ocorreu com Eike Batista, que se ofereceu para depor voluntariamente e acabou em Bangu. Esta é a única razão que poderia justificar o inesperado gesto de Yunes, ao denunciar que Padilha o transformara em “mula involuntário”.
Acontece que Yunes, por ser um advogado de grande sucesso, sabe perfeitamente que não esteve, está ou estará sob ameaça de ser preso pela Lava Jato, até porque o crime supostamente por ele cometido (se ficar provado em inquérito e processo) está enquadrado assim no Código Penal:
“Art. 180 – Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte”. E a pena é reclusão, de um a quatro anos, e multa.
ATENUANTES E SURSIS – Yunes não desconhece, também, que o Código Penal prevê que circunstâncias atenuantes têm de ser aplicadas às condenações de réus com 70 anos ou mais, e uma delas é a redução da pena. Existe, ainda,o sursis etário, que liberta o réu idoso condenado a penas menores de 4 anos e que não seja reincidente de crime doloso.
Como se vê, judicialmente o ex-assessor e amigo de Temer não sofre a menor ameaça de prisão. Portanto, a motivação de seu gesto foi mesmo o objetivo de incriminar Eliseu Padilha, para enfraquecê-lo de forma definitiva e evitar que continue interferindo no governo e usando a Secretaria de Comunicação Social em proveito próprio, conforme todo mundo que frequenta o Planalto está cansado de saber.
Aliás, é justamente o que o jornalista Jorge Bastos Moreno, amigo íntimo e confidente de Temer, acaba de deixar bem claro. Nesta quarta-feira de cinzas, Moreno publicou no site de O Globo que “Yunes desfila com a cabeça de Padilha pela Esplanada”, confirmado as notícias sobre as brigas entre Temer e Padilha que a Tribuna da Internet vem publicando com exclusividade absoluta desde setembro.
A DOENÇA DE PADILHA – Quanto à situação de Padilha (supostamente, ele iria ter alta nesta quarta-feira, mas nenhum jornal tocou no assunto, nem mesmo a Zero Hora), a gravidade de sua doença vai evitar que seja demitido. Como dizia Nelson Rodrigues, “o mineiro só é solidário no câncer”. E Temer, que é o mais mineiro dos políticos paulistas, se enquadra bem nessa definição.
A operação de Padilha foi muito traumática, com incisões de aproximadamente 20 cm na horizontal e na vertical, e ainda não se sabe se terá de fazer quimioterapia. A recuperação é lenta, ele não tem a mínima condição de tão cedo reassumir o cargo, pois não pode viajar enquanto não ocorrer a cicatrização completa. As notícias de que Padilha voltaria a trabalhar na segunda-feira, insistentemente “vazadas” pela assessoria da Casa Civil, chegam a ser patéticas, mas ainda há jornalistas que acreditam.
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PS – Já se comenta que Temer prolongará a licença do chefe da Casa Civil indefinidamente, porque ele não pode perder o foro privilegiado. Ou seja, Padilha continuará ministro, porém não mandará mais nada. Ficará exilado em sua sala, enquanto o neoministro Moreira Franco, conforme já estava programado, assume à frente dos negócios, digamos assim. (C.N.)
02 de março de 2017
Carlos Newton
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