"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

O SUPREMO E A CHACINA DE SÃO PAULO




Chacina de São Paulo é um desafio à nação
O Supremo Tribunal Federal deu início ao julgamento da descriminalização do porte de drogas para uso próprio. Organizações contra e a favor da descriminalização – e sobre essa questão não há unanimidade sequer entre os próprios policiais – devem se manifestar.
Será debatido o princípio de que o porte de drogas, tipificado no Artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), não deveria ser configurado crime, por não gerar conduta lesiva a terceiros, e o de que a tipificação ofende princípios constitucionais, como o da intimidade e o da liberdade individual.
Uma Nação – e um Judiciário – conivente com os grandes fabricantes de bebidas alcóolicas, que permite a veiculação de sua publicidade na televisão,  com apelos claramente voltados  para a juventude, não tem o direito moral de reprimir, hipócrita e intransigentemente, usuários de drogas que frequentemente começam a se viciar  com a  primeira latinha  de cerveja, em festas de adolescentes.
TEMPOS MODERNOS
O que está em discussão é se queremos nos transformar em uma sociedade democrática e moderna, ou continuar avançando no processo de transformação do país em um estado policial,  institucionalizando, em pleno século XXI, o retorno aos tempos do poder direto, absoluto, dos Capitães do Mato, que vigia sobre as camadas mais pobres da sociedade brasileira até o final do século XIX.
É preciso, sim, definir a quantidade de droga que caracteriza o tráfico, e tornar obrigatório o exame químico das substâncias apreendidas – já que muita gente hoje vai para a cadeia, ocupando uma vaga que poderia estar destinada  a presos de alta periculosidade – por estar vendendo ou portando pó de mármore misturado com anfetamina com prazo vencido desviada de farmácias.
Ao regulamentar e normatizar o porte de drogas, abrindo caminho para sua comercialização sob supervisão do Estado, o STF pode, se quiser, evitar milhares de prisões e de mortes desnecessárias (mais de 40% dos presos estão detidos sem julgamento e a nossa polícia é das que mais matam no mundo, mas os crimes continuam aumentando ano a ano), diminuindo o poder do tráfico, a corrupção e a violência policial, que levam a assassinatos como o da juíza Patricia Acioli, no Rio de Janeiro, ou a prisões como a dos soldados da Rota suspeitos de execução neste mês em Osasco, e, por extensão, a chacinas animalescas como a que se viu há poucos dias no estado de São Paulo.
FAZER JUSTIÇA
Mas, acima de tudo, pode – lembrando que uma Suprema Corte julga para a posteridade – fazer justiça, evitando que uma “lei”, do jeito que está, totalmente “flexível” e “camaleônica”,  seja aplicada a qualquer cidadão sem nenhuma regra comum de definição do “crime”, ou de isonomia, tendo como único e exclusivo critério o humor circunstancial, o estado de espírito, o que estiver passando pela cabeça, o único arbítrio, e, eventualmente, os interesses pessoais, subjetivos e difusos, de quem a estiver aplicando – detendo, punindo, “julgando”, levando, quase que em última instância, à condenação, para efeito prático, do usuário – no momento do “flagrante”.

01 de setembro de 2015
Mauro Santayana
Jornal do Brasil

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