ESPECIALISTAS DIZEM QUE FINANÇAS DO BRASIL ESTÁ EM ESTADO CRÍTICO
A perda do selo de bom pagador, decretada pela agência de risco Standard & Poor's (S&P), atiçou um senso de urgência na área econômica. Não importa a corrente de pensamento, não há mais dúvida entre os economistas que acompanham as contas públicas de que a situação das finanças do Estado brasileiro chegou a um ponto crítico. Mais do que tomar medidas para reverter o rebaixamento já feito pela S&P, a prioridade é evitar que Moody's e Fitch, as duas outras agências que são referência global, sigam o exemplo.
Existe um certo consenso de que agora é necessário agir o mais rápido possível para dirimir distorções que oneram as contas públicas. Atuar no curto prazo é a prioridade. "Foi inadmissível mandar para o Congresso o Orçamento do ano que vem com um rombo e agora o governo deve deixar claro que está comprometido com o cumprimento da meta de superávit primário do próximo ano, fixada em 0,7%. Vai doer, mas não tem jeito", diz o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. Para o mercado, é essencial que os ministros Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento, mostrem sintonia.
Numa outra frente, entende-se que é preciso iniciar um ajuste fiscal estrutural, de longo prazo. "O governo precisa reorganizar a base política e votar uma série de reformas que influenciariam o cenário das contas públicas no longo prazo", diz o economista Mansueto Almeida, especialista em contas públicas.
Na avaliação dele, a lista incluiria promover uma nova rodada da reforma da Previdência, para rever a idade de aposentadoria, discutir e redefinir o piso de programas de assistência. "Não é justo que o piso da Previdência, de quem sempre contribuiu com o sistema, seja igual ao piso da assistência social", diz Almeida. Ele também defende o fim das chamadas vinculações (verbas carimbadas) para áreas como saúde e educação, ou ao menos a revisão das regras. "A vinculação é feita em relação ao ano anterior: em anos que há um grande crescimento da receita, seguida de queda, isso cria problemas."
Economistas alinhados com o governo estão entre os mais serenos com a perda do grau de investimento. "A definição de uma agência de risco não é o fim do mundo", diz Márcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, que ajuda a produzir programas do governo. Mas até Pochmann concorda que o quadro exige atenção, ainda que seja por outras razões. Ele faz parte do grupo que defende um ajuste fiscal mais brando e longo, e que prioriza medidas de incentivo ao crescimento. "Não se faz ajuste com recessão e preso a medidas de curto prazo. Precisamos de um programa de ajuste com um horizonte de quatro anos que não penalize os investimentos."
Vertentes
- Uma preocupação das agências é o crescimento da dívida bruta - e aí chama a atenção a projeção da S&P. A agência estima que ela chegará a 72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2017. "É muito acima da média do mercado, que prevê, pela nossa análise, 68,5% do PIB em 2017. Assim, para segurar o grau de investimento, a meta do governo é não deixar que a dívida se aproxime de 70% do PIB", diz Bráulio Borges, economista da consultoria LCA.
Por causa dessa perspectiva, um grupo retomou uma discussão polêmica: a adoção de um ajuste mais amplo, que recaia sobre o chamado resultado nominal das contas públicas. O resultado primário (o foco das discussões no momento) é a diferença entre receitas e despesas do governo, sem itens financeiros. O resultado nominal, por outro lado, é mais amplo: inclui receitas totais (inclusive com aplicações financeiras) e as despesas totais (incluindo juros).
Em julho, no dado mais recente disponível, o governo acumulava, em 12 meses, um déficit primário de R$ 51 bilhões, ou 0,89% do Produto Interno Bruto (PIB). O resultado nominal, por sua vez, também acumulado em 12 meses, é um déficit de R$ 502 bilhões, o equivalente 8,8% do PIB. "Quando a gente discute metas de superávit primário, falamos de 10% do problema", diz Amir Khair,especialista em contas públicas e ex-secretário de Finanças na gestão da então petista Luiza Erundina, na Prefeitura de São Paulo.
Felipe Salto, assessor econômico do senador José Serra, do PSDB, concorda com o enfoque. "O governo pode, com um enorme esforço, reduzir o déficit primário ou alcançar um pequeno superávit, mas o déficit nominal continua alto." Para muitos, porém, não dá para discutir temas ligados a juros justo agora, quando a inflação beira os dois dígitos - e o juro alto é o remédio amargo para detê-la.
Seja qual for a proposta adotada, os economistas lembram que não se pode bobear com as agências. Elas até erram, mas são o farol para investidores. Outro rebaixamento teria consequências nefastas para a recessão em curso. Encareceria ainda mais o crédito, no exterior, para empresas e bancos, elevando o custo do dinheiro para todos os brasileiros. Pressionaria o dólar e, por tabela, a inflação. Também faria do País terra proibida para bilionários fundos de investimento de primeira linha, que pelas próprias regras, não podem alocar recursos em países especulativos, o que escassearia o investimento estrangeiro.(AE)
13 de setembro de 2015
diário do poder
ESPECIALISTAS DIZEM QUE FINANÇAS DO BRASIL ESTÁ EM ESTADO CRÍTICO |
A perda do selo de bom pagador, decretada pela agência de risco Standard & Poor's (S&P), atiçou um senso de urgência na área econômica. Não importa a corrente de pensamento, não há mais dúvida entre os economistas que acompanham as contas públicas de que a situação das finanças do Estado brasileiro chegou a um ponto crítico. Mais do que tomar medidas para reverter o rebaixamento já feito pela S&P, a prioridade é evitar que Moody's e Fitch, as duas outras agências que são referência global, sigam o exemplo.
Existe um certo consenso de que agora é necessário agir o mais rápido possível para dirimir distorções que oneram as contas públicas. Atuar no curto prazo é a prioridade. "Foi inadmissível mandar para o Congresso o Orçamento do ano que vem com um rombo e agora o governo deve deixar claro que está comprometido com o cumprimento da meta de superávit primário do próximo ano, fixada em 0,7%. Vai doer, mas não tem jeito", diz o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. Para o mercado, é essencial que os ministros Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento, mostrem sintonia.
Numa outra frente, entende-se que é preciso iniciar um ajuste fiscal estrutural, de longo prazo. "O governo precisa reorganizar a base política e votar uma série de reformas que influenciariam o cenário das contas públicas no longo prazo", diz o economista Mansueto Almeida, especialista em contas públicas.
Na avaliação dele, a lista incluiria promover uma nova rodada da reforma da Previdência, para rever a idade de aposentadoria, discutir e redefinir o piso de programas de assistência. "Não é justo que o piso da Previdência, de quem sempre contribuiu com o sistema, seja igual ao piso da assistência social", diz Almeida. Ele também defende o fim das chamadas vinculações (verbas carimbadas) para áreas como saúde e educação, ou ao menos a revisão das regras. "A vinculação é feita em relação ao ano anterior: em anos que há um grande crescimento da receita, seguida de queda, isso cria problemas."
Economistas alinhados com o governo estão entre os mais serenos com a perda do grau de investimento. "A definição de uma agência de risco não é o fim do mundo", diz Márcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, que ajuda a produzir programas do governo. Mas até Pochmann concorda que o quadro exige atenção, ainda que seja por outras razões. Ele faz parte do grupo que defende um ajuste fiscal mais brando e longo, e que prioriza medidas de incentivo ao crescimento. "Não se faz ajuste com recessão e preso a medidas de curto prazo. Precisamos de um programa de ajuste com um horizonte de quatro anos que não penalize os investimentos."
Vertentes
- Uma preocupação das agências é o crescimento da dívida bruta - e aí chama a atenção a projeção da S&P. A agência estima que ela chegará a 72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2017. "É muito acima da média do mercado, que prevê, pela nossa análise, 68,5% do PIB em 2017. Assim, para segurar o grau de investimento, a meta do governo é não deixar que a dívida se aproxime de 70% do PIB", diz Bráulio Borges, economista da consultoria LCA.
Por causa dessa perspectiva, um grupo retomou uma discussão polêmica: a adoção de um ajuste mais amplo, que recaia sobre o chamado resultado nominal das contas públicas. O resultado primário (o foco das discussões no momento) é a diferença entre receitas e despesas do governo, sem itens financeiros. O resultado nominal, por outro lado, é mais amplo: inclui receitas totais (inclusive com aplicações financeiras) e as despesas totais (incluindo juros).
Em julho, no dado mais recente disponível, o governo acumulava, em 12 meses, um déficit primário de R$ 51 bilhões, ou 0,89% do Produto Interno Bruto (PIB). O resultado nominal, por sua vez, também acumulado em 12 meses, é um déficit de R$ 502 bilhões, o equivalente 8,8% do PIB. "Quando a gente discute metas de superávit primário, falamos de 10% do problema", diz Amir Khair,especialista em contas públicas e ex-secretário de Finanças na gestão da então petista Luiza Erundina, na Prefeitura de São Paulo.
Felipe Salto, assessor econômico do senador José Serra, do PSDB, concorda com o enfoque. "O governo pode, com um enorme esforço, reduzir o déficit primário ou alcançar um pequeno superávit, mas o déficit nominal continua alto." Para muitos, porém, não dá para discutir temas ligados a juros justo agora, quando a inflação beira os dois dígitos - e o juro alto é o remédio amargo para detê-la.
Seja qual for a proposta adotada, os economistas lembram que não se pode bobear com as agências. Elas até erram, mas são o farol para investidores. Outro rebaixamento teria consequências nefastas para a recessão em curso. Encareceria ainda mais o crédito, no exterior, para empresas e bancos, elevando o custo do dinheiro para todos os brasileiros. Pressionaria o dólar e, por tabela, a inflação. Também faria do País terra proibida para bilionários fundos de investimento de primeira linha, que pelas próprias regras, não podem alocar recursos em países especulativos, o que escassearia o investimento estrangeiro.(AE)
13 de setembro de 2015
diário do poder
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