União gasta com seis hospitais e três institutos no Rio tanto quanto o estado com 60 unidades. Há espera de até dez anos por uma cirurgia. Alguns morrem na portaria
Há mais de dois anos a população do Rio está praticamente sem acesso aos 2.700 leitos hospitalares — entre eles, 198 de Unidade de Terapia Intensiva — dos seis hospitais e três institutos mantidos pelo Ministério da Saúde.
Na origem da crise está uma estrutura ineficiente. Combina inépcia com obras atrasadas, e conflitos trabalhistas que se arrastam há pelo menos 29 meses.
Outra greve de médicos começou há duas semanas. Ontem, um homem agonizou durante uma hora na portaria do Instituto de Cardiologia, em Laranjeiras. Morreu sem socorro.
No Hospital do Andaraí, na Zona Norte, a Justiça Federal acaba de comprovar uma rotina de doentes espalhados pelos corredores, no chão ou em cadeiras — ladeados por latas de lixo.
Em visita recente, inspetores da Vigilância Sanitária interditaram a sala de preparo de quimioterapia. Encontraram a geladeira de medicamentos ao lado de um recipiente aberto, com veneno, à espera de roedores.
Os nove hospitais e institutos federais do Rio possuem 22% dos leitos existentes na cidade. Deveriam desempenhar um papel-chave no serviço de saúde aos 12 milhões de habitantes da região metropolitana. Mas, no conjunto, compõem uma síntese da anarquia gerencial que domina o Sistema Único de Saúde.
A percepção pública desse desgoverno tem turbinado protestos nas ruas e vem sendo reafirmada a cada nova pesquisa de opinião.
A crise do sistema de saúde pública já é entendida como problema mais grave do que representou a escassez de empregos duas décadas atrás. Os registros são do Ibope: no fim do ciclo da superinflação, em agosto de 1994, a maioria (53%) dos brasileiros indicava o desemprego como maior problema nacional. Numa consulta em dezembro passado, ampla maioria (58%) não hesitou em responder “saúde”.
É paradoxal, mas até agora nenhum dos principais candidatos à Presidência da República apresentou sequer um esboço de ideias para essa situação que afeta a vida das pessoas.
O que está aí não comporta terapia retórica ou soluções simplistas. Não é só pelo dinheiro. Há o suficiente para os seis hospitais (Andaraí, Bonsucesso, Cardoso Fontes, Ipanema, Lagoa e Servidores) mais os três institutos especializados (Câncer, Cardiologia e Traumatologia).
Juntos, eles receberam R$ 3,4 bilhões no ano passado. Dessa dinheirama, R$ 2,1 bilhões foram para pagamento de pessoal e encargos, R$ 1,2 bilhão para custeio e R$ 81 milhões destinados a investimentos.
Significa que, no ano passado, o Ministério da Saúde concentrou em apenas seis hospitais da capital um volume de recursos equivalente ao dinheiro gasto com toda a estrutura de saúde mantida pelo Estado do Rio.
Com 60 unidades hospitalares (1.050 leitos de UTI) e serviços adicionais, como a vigilância epidemiológica, o conjunto estadual de saúde consumiu R$ 3,7 bilhões — somente R$ 300 milhões a mais que os seis hospitais e três institutos federais na cidade do Rio.
Aparentemente, o governo federal perdeu o controle. Gasta com seis hospitais e três institutos na capital tanto quanto o governo estadual em 60 unidades. Ainda assim, mantém milhares de pessoas à espera de vaga para cirurgia. Alguns já completaram uma década na fila, informam a Justiça Federal e a Defensoria Pública da União.
Há mais de dois anos a população do Rio está praticamente sem acesso aos 2.700 leitos hospitalares — entre eles, 198 de Unidade de Terapia Intensiva — dos seis hospitais e três institutos mantidos pelo Ministério da Saúde.
Na origem da crise está uma estrutura ineficiente. Combina inépcia com obras atrasadas, e conflitos trabalhistas que se arrastam há pelo menos 29 meses.
Outra greve de médicos começou há duas semanas. Ontem, um homem agonizou durante uma hora na portaria do Instituto de Cardiologia, em Laranjeiras. Morreu sem socorro.
No Hospital do Andaraí, na Zona Norte, a Justiça Federal acaba de comprovar uma rotina de doentes espalhados pelos corredores, no chão ou em cadeiras — ladeados por latas de lixo.
Em visita recente, inspetores da Vigilância Sanitária interditaram a sala de preparo de quimioterapia. Encontraram a geladeira de medicamentos ao lado de um recipiente aberto, com veneno, à espera de roedores.
Os nove hospitais e institutos federais do Rio possuem 22% dos leitos existentes na cidade. Deveriam desempenhar um papel-chave no serviço de saúde aos 12 milhões de habitantes da região metropolitana. Mas, no conjunto, compõem uma síntese da anarquia gerencial que domina o Sistema Único de Saúde.
A percepção pública desse desgoverno tem turbinado protestos nas ruas e vem sendo reafirmada a cada nova pesquisa de opinião.
A crise do sistema de saúde pública já é entendida como problema mais grave do que representou a escassez de empregos duas décadas atrás. Os registros são do Ibope: no fim do ciclo da superinflação, em agosto de 1994, a maioria (53%) dos brasileiros indicava o desemprego como maior problema nacional. Numa consulta em dezembro passado, ampla maioria (58%) não hesitou em responder “saúde”.
É paradoxal, mas até agora nenhum dos principais candidatos à Presidência da República apresentou sequer um esboço de ideias para essa situação que afeta a vida das pessoas.
O que está aí não comporta terapia retórica ou soluções simplistas. Não é só pelo dinheiro. Há o suficiente para os seis hospitais (Andaraí, Bonsucesso, Cardoso Fontes, Ipanema, Lagoa e Servidores) mais os três institutos especializados (Câncer, Cardiologia e Traumatologia).
Juntos, eles receberam R$ 3,4 bilhões no ano passado. Dessa dinheirama, R$ 2,1 bilhões foram para pagamento de pessoal e encargos, R$ 1,2 bilhão para custeio e R$ 81 milhões destinados a investimentos.
Significa que, no ano passado, o Ministério da Saúde concentrou em apenas seis hospitais da capital um volume de recursos equivalente ao dinheiro gasto com toda a estrutura de saúde mantida pelo Estado do Rio.
Com 60 unidades hospitalares (1.050 leitos de UTI) e serviços adicionais, como a vigilância epidemiológica, o conjunto estadual de saúde consumiu R$ 3,7 bilhões — somente R$ 300 milhões a mais que os seis hospitais e três institutos federais na cidade do Rio.
Aparentemente, o governo federal perdeu o controle. Gasta com seis hospitais e três institutos na capital tanto quanto o governo estadual em 60 unidades. Ainda assim, mantém milhares de pessoas à espera de vaga para cirurgia. Alguns já completaram uma década na fila, informam a Justiça Federal e a Defensoria Pública da União.
06 de junho de 2014
José Casado, O Globo
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